Christian Pruks
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Equipamentos Vintage que fazem parte da história do Áudio
O termo Vintage tem a ver com ‘qualidade’, mais do que ‘ser antigo’. Vem do francês ‘vendange’, safra, sobre uma safra de um vinho que resultou excepcional. ‘Vintage’ quer dizer algo de qualidade excepcional – apesar de ser muito usado para designar apenas algo antigo.
Nesta série de artigos abordamos equipamentos vintage importantes, e que influenciam audiófilos até hoje!
MADE IN HOLLAND
Nas décadas de 70 e 80, o áudio japonês deitava e rolava no mundo, mas várias empresas europeias faziam contra os japoneses uma pequena competição – e mesmo no Brasil vimos vários equipamentos da gigante holandesa Philips que fizeram um certo sucesso. Eu tive alguns!
O alcance da Philip na Europa era muito grande na área de áudio, com seus próprios aparelhos e licenciando tecnologia e todo tipo de componentes para muitas marcas no mesmo cenário.
Esse amplificador aqui do artigo é um que chegou também ao Brasil na década de 70, e por um bom tempo fez parte inclusive da mesma linha do até hoje célebre toca-discos de vinil GA-312 Electronic (chamado de GA-212 na Europa, e apelidado de ‘Geléia’ no Brasil, devido à sua suspensão).
Ambos são bem quistos por colecionadores e fãs de vinil até hoje.
O AMPLIFICADOR INTEGRADO RH 521
A Philips investiu bastante em equipamentos de áudio no final da década de 60 e até a década de 80, quando começou a popularizar mais, e ser mais de plástico.
De 1972 até 1975, aproximadamente, a empresa pôs no mercado um de seus melhores amplificadores integrados, na sua linha chamada de Hi-Fi International, que é o 22RH251, também conhecido como RH 251, ou simplesmente 251.
Ele provê 30W em 4 ohms por canal de ‘potência contínua’ (40W em 4 ohms no que poderíamos chamar de ‘potência de pico’). A verdade é que como esses dados foram medidos, e exatamente o que eles querem dizer, e qual é a potência em 8 ohms, são todas perguntas sem resposta. Mas, se a sala for pequena, e a caixa tiver boa sensibilidade – e você não quiser rearranjar o baço do vizinho com o volume da sua música – essa potência me parece bem decente.
O 521, além de ter um design característico, bem diferente de todo o resto que havia disponível na época, sendo moderninho e retrô ao mesmo tempo, com mistura de metal escovado, madeira e plástico, chamava bastante atenção por suas janelas olho-de-peixe contendo os VUs de potência – que poderiam muito bem conter
válvulas de pré-amplificação, pelo tipo de visual. Tanto que o amplificador foi capa da célebre revista japonesa Stereo Sound, em meados de 1973 – e não deve ter sido só pela beleza.
O 521, entretanto, é totalmente transistorizado classe AB. São 32 transistores, e um belo dissipador que toma dois terços do painel traseiro – já que ele esquenta bastante. Inclusive é normal o aparelho estar desregulado e esquentar demais, principalmente em países ou regiões muito quentes. Os aparelhos que vieram ao Brasil, assim como para várias regiões do mundo, vinham escrito “Made in Holland” e “Tropicalized”. Aliás, não consegui descobrir exatamente o que foi ‘tropicalizado’ no aparelho, mas eu acredito ser a adequação às variações de voltagem locais (têm lugares do mundo que são 110V e no Brasil é mais comum o 127V, por exemplo, além de haver diferenças entre 50Hz e 60Hz), assim como regulagem específica da corrente de bias – para não esquentar demais em países muito quentes. Tanto que existem aparelhos desses escrito “Tropicalized” em vários lugares do mundo, não só no Brasil.
Claro que a Internet, onde tem de ‘tudo’, diz em fóruns que a Tropicalização incluía tratar o aparelho para umidade e até para insetos. Eu nasci e moro em um país tropical, e nunca vi insetos comerem nem aparelho bom e nem aparelho ruim. Assim como, se as pessoas acham que só os trópicos são úmidos, vão ver como é a condensação dentro das residências nos países europeus frios durante o inverno, e aí vão saber o que é umidade.
Voltando o 521, vale salientar que as saídas e entradas atrás dele (e as conexões de fones de ouvido e de microfone do painel frontal) são todos no padrão DIN alemão – e a Philips, e outras empresas europeias, demorariam anos ainda para mudar para o padrão internacional RCA que perdura até hoje.
O 521, além de beleza e uma potência decente para a época, tinha bons recursos, com uma entrada/saída para tape-deck, uma entrada para phono MM, uma para sintonizador e uma AUX. As saídas são para dois sistemas de caixas (incluindo o “Ambio 4” ou “Stereo 4”).
O controle tonal, que não pode ser desligado, traz Graves, ‘Presence’ (Médios), e Agudos. Além desses, tem um controle de Loudness chamado de ‘Contour’, com três níveis em vez do usual que só tem um – e um controle chamado de ‘Rumble-Scratch’, também com três posições, que nada mais é que filtros de altas e de baixas.
Quanto ao Ambio 4 ou Stereo 4, na década de 70 várias empresas começaram a brincar com a ideia de Quadrafônico – e até houveram muitos discos prensados para serem tocados nesse modo de 4 canais, sendo o mais célebre deles o The Dark Side of the Moon do Pink Floyd, de 1973, trazendo ambiência da gravação nos canais traseiros (hoje conhecido como Surround). Essas tecnologias não pegaram, porque acho que muitos não queriam comprar mais um par de caixas, um amplificador de quatro canais ou um que decodificasse e, ou um tape-deck apropriado ou uma cápsula especial (e cara) para a decodificação da informação pertinente aos canais traseiros.
A tecnologia específica Ambio 4, Ambiophonics, da Philips – que também foi usada pela Bang & Olufsen – foi um ‘furo n’água’. Tivemos que esperar mais um década e meia para, com a possibilidade de assistirmos em casa filmes e shows com boa qualidade de vídeo e ‘som de cinema’, o ‘Surround’ reaparecer, e ficar.
MODELOS SEMELHANTES
Como não consegui saber o preço do 521 à época do seu lançamento, também não consegui descobrir quais seriam seus concorrentes na mesma faixa. Porém, vários amplificadores integrados e receivers dos quais já falei nesta coluna, têm especificações e recursos semelhantes, e são da mesma época.
O mais semelhante (diria quase igual) é o Philips AH 561 de 1976, que substituiu o RH 521 na linha, e tinha uma sonoridade com mais agudo, menos quente que o 521, menos ‘valvular’ – talvez uma resposta ao monte de aparelhos japoneses que seguiam essa linha com sonoridade mais ‘solid state’. Com as especificações praticamente iguais, visualmente a diferença entre o 521 e o 561 é que este último tem a parte de baixo do painel frontal em preto – e não só a faixa preta no meio, como o antecessor (veja foto).
COMO TOCA O PHILIPS RH 521
Ouvi alguns amplificadores Philips dessa época – ou semelhantes na sua sonoridade europeia – que sempre soaram cheios, bem musicais e com bom timbre. E sempre me falaram muito bem do 521 por sua sonoridade quente, quase valvular, com boa potência e capacidade de empurrar várias caixas (da época, ou mais recentes que tenham uma sensibilidade mais alta).
O som destes amplificadores é de fortes graves, e os agudos não somem quando se usa os controles tonais em flat – o que já diz muito sobre sua qualidade.
Acredito que sua sonoridade mais musical serve bem aos fãs de clássico e de jazz, indo para o lado oposto da abertura de agudos e som analítico que muitos japoneses proviam, e bem semelhante aos Telefunken, Grundig, ITT e outros europeus da época.
SOBRE A PHILIPS
O nome Philips é tão tradicional que quase dispensa apresentações. O conglomerado holandês chegou a ser uma das maiores empresas de tecnologia do mundo – desde semicondutores, até barbeadores, eletrônicos para a cozinha e o lar, equipamentos de som e vídeo, televisores de tubo, televisores de tela plana, monitores para computador, selo de gravação de discos, a invenção da fita cassete, lâmpadas incandescentes, as primeiras lâmpadas LED, tecnologia para a área médica, a invenção do CD em associação com a Sony, a invenção do DVD em associação com a Toshiba e a mesma Sony, etc e tal. Em quase tudo a Philips já esteve envolvida.
Mas, com a atual reestruturação, estratégias equivocadas e a alta concorrência, a Philips tem passado a focar apenas em produtos para o bem-estar pessoal e afins, e tecnologia para área médica – tendo vendido sua operação de fabricação de TVs e monitores, de produtos de áudio e vídeo, de pilhas, multimídia e de iluminação. Seus produtos em várias áreas deixarão saudades!
Boas Festas a todos nós!