Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br
Na edição passada, nesta seção, prometi que neste mês apresentaria gravações com dois instrumentos para a avaliação de equilíbrio tonal e ampliação da memória de longo prazo (que fica armazenada no hipocampo).
Mas descumprirei o prometido, pois dois fatos – que ocorreram simultaneamente – sinalizaram que seria conveniente abrir uma exceção e falar um pouco do quesito Textura de nossa Metodologia.
Textura, junto com corpo harmônico, sempre foram os quesitos nos Cursos de Percepção Auditiva dos quais mais os participantes têm dúvidas. À medida que os cursos foram sendo realizados, consegui achar ‘o tom’ correto e os exemplos mais eficazes para explicar esses dois quesitos aos participantes.
Mas, falar desses quesitos em nossos testes mensalmente para uma legião de novos leitores que jamais fizeram os cursos, deve parecer que estamos falando mongol! Para todos estes novos leitores, sugiro a leitura em nosso site da página História da Metodologia (localizado no menu principal), de nosso editor técnico e colaborador Victor Mirol. Neste artigo, você terá uma descrição em detalhes de toda a nossa Metodologia.
Mas o que me levou a mudar a cronologia dos textos que publicarei nesta seção, foi que nas últimas quatro semanas dois fatos ocorreram: recebi uma dúzia de mensagens de leitores solicitando ajuda para a escolha de CDs para a avaliação de texturas dos seus sistemas, e ter recebido o CD do selo Sesc do multi-instrumentista, arranjador e compositor André Mehmari – Música para Cordas. Aí, meu amigo, foi ligar ‘lé com cré’ e descobrir que tinha o disco certo, na hora exata, para ajudar todos vocês que buscam avaliar a qualidade deste quesito em seus sistemas.
Mas antes de falarmos deste disco, vamos a explicação do quesito Textura feita brilhantemente pelo querido amigo Victor Mirol em seus artigos: “Este termo tem a ver com a sensação táctil do toque da superfície de um objeto ou material e também, evoca a trama de um tecido. Todo instrumento tem, além de um timbre e uma dinâmica particular e únicos a ele, uma qualidade que pode ser definida com alguns destes termos: aveludado, liso, rugoso, áspero, cremoso, etc. Esta qualidade referente ao instrumento é um tanto difícil de definir como também é o timbre. Porém, utilizado no sentido de trama instrumental, a situação é mais cômoda. No decorrer do discurso musical, o compositor ou arranjador combina os diversos elementos do magma sonoro orquestral de maneira que cada um deles mantenha sua identidade dentro do todo”.
O leitor mais atento aos exemplos citados de cada quesito em nossos testes, perceberá que, para texturas, eu pessoalmente utilizo, para fechar a nota deste quesito, quartetos de cordas. E a razão é bastante simples e objetiva: é muito mais fácil ouvir a trama musical de apenas 4 instrumentos do que de uma orquestra inteira. Então raramente utilizo uma gravação mais complexa que quartetos de cordas para a nota final de textura.
Bem, não usava, pois agora este novo CD Música para Cordas veio para ampliar este leque de gravações tecnicamente perfeitas para avaliação de Textura e com a possibilidade de ampliarmos o leque de instrumentos para: acordeon, clarinete e fagote.
O leitor Rodrigo Dantas, no seu e-mail, perguntou o que ele deve perceber no quarteto de cordas que possa ajudá-lo na avaliação das texturas.
Vamos por partes Rodrigo. Antes de tudo é preciso estar bem claro para todos que textura e equilíbrio tonal são como irmãos siameses. Jamais se separam!
Sem o equilíbrio tonal correto, esqueça avaliar textura.
Então a primeira lição de casa é o ajuste correto do equilíbrio tonal. Alguém lá do fundo da sala gritou: “Mas o equilíbrio tonal junto com elétrica e acústica representam 75% do acerto!”. Exatamente. Então antes de sair tentando descobrir a qualidade do seu sistema na reprodução de texturas, faça todo o dever de casa.
Sem equilíbrio tonal, você pode avaliar corpo harmônico, transientes e micro e macrodinâmica. Mas textura, organicidade e musicalidade, não!
Se vocês não entenderem como os oito quesitos se intercalam, formando um ‘tecido único’, o número de tentativas e erros pode ser infinito. Mas se seguirem as regras e começarem com o acerto inicial dos 75% (elétrica, acústica e equilíbrio tonal), o número de tentativas e erros cai para menos de 50%.
Mas, vamos lá. Suponhamos que o Rodrigo fez a lição de casa e atingiu os 75%. Ele realmente pode começar a avaliar todos os outros 7 itens da Metodologia. E pode perfeitamente iniciar pelo quesito Textura. Pois quando ele tiver ajustado a textura de seu sistema, a musicalidade e organicidade também já estarão ‘pré-ajustadas’ ou, para ser mais preciso, parcialmente ajustadas.
Então, Rodrigo, respondendo a sua dúvida, eu buscaria dois ou três CDs de quarteto de cordas muito bem gravados e sem nenhum desequilíbrio tonal, e não abriria mão do CD do André Mehmari, CD 1 com as seguintes obras: Ballo Suíte Para Cordas e Shostakovitchiana. Estes dois exemplos, mais a gravação do Hagen Quartett tocando Beethoven, com Streichquartett op 130 e Fugue op 133 do selo Deutsche Grammophon, serão suas gravações de referência para ajuste do quesito texturas do seu sistema e de qualquer amigo (desde que aceite opiniões, é claro).
E, para aquele leitor que ainda se perde tentando ouvir quatro instrumentos tocando simultaneamente, existe algum CD com um instrumento solista que possa ser útil? Sim, o CD Timbres, nas faixas com violino, cello e contrabaixo, pode ajudar muito. Desde, é claro, que o sistema consiga mostrar as ‘enormes’ diferenças entre os três microfones. E para mostrar a diferença, novamente alerto: é preciso ter feito a lição de casa dos 75%.
Para entender como a Textura funciona, é preciso que você dê nome a cada instrumento que você escuta, classificando-o como: áspero, rugoso, macio, aveludado, anasalado, etc. Sua mente se sentirá muito mais à vontade ao fazer isto, para reconhecer e memorizar a timbragem de cada instrumento.
Um quarteto de cordas é perfeito para este exercício de ‘memorização’, pois mesmo que um quarteto seja composto de dois violinos, uma viola e um cello, o primeiro e segundo violinos jamais soam idênticos. Outra dica importante é o espaço que cada um ocupa. Em algumas gravações o palco sonoro apresenta o quarteto em arco (isto é, devido ao posicionamento dos microfones em relação ao quarteto). Em outras o primeiro violino se encontra na caixa esquerda, o segundo violino mais para o centro e atrás do primeiro violino (em bons sistemas, com bom tratamento acústico), assim como a viola do centro para a caixa direita, mas atrás do cello. E este geralmente soa dentro da caixa direita. Como o cérebro também é bom em espacialidade, esta dica do posicionamento pode ajudar na memorização.
Em um sistema em que o equilíbrio tonal é excelente, a textura também será excelente. Neste caso, acompanhar cada instrumento dentro da trama musical é como comer mamão com açúcar. Nenhum esforço adicional será preciso para ouvir as quatro vozes juntas e separadamente. E a textura, neste caso, além de mostrar as características de cada instrumento (se soa mais aveludado, ou mais rugoso), chega ao requinte de mostrar a qualidade do instrumento, a virtuose do músico e o grau de ‘intencionalidade’ do compositor e do arranjador. E, claro, a qualidade do engenheiro de gravação na escolha dos microfones, posicionamento destes, qualidade da sala de gravação, mixagem e masterização.
Os três exemplos aqui citados passam com mérito em todas as etapas: da escolha dos músicos, seus instrumentos, qualidade dos microfones, sala de gravação, mixagem e masterização. Então, além de exemplos seguros, poderão lhe dar um ‘raio x’ preciso do seu setup tanto em textura como também em equilíbrio tonal. Ou seja, matar dois coelhos com uma única cajadada!
Para te ajudar a entender essas gravações, vamos passar algumas dicas importantes. Primeiro, no CD Timbres os exemplos do violino, cello e contrabaixo acústico – é essencial que o setup, ao reproduzir essas faixas, mostre as diferenças audíveis dos três microfones. Se você, em seu setup, não reconhecer essas diferenças, ou forem sutis demais, o sistema não está correto no quesito Equilíbrio Tonal. Você terá que rever onde se encontra o elo fraco do sistema (ou se está na elétrica ou na acústica), para tentar seguir em frente.
Uma dica: em termos de textura, esses três instrumentos com o microfone AKG soam rugosos (para alguns leitores) e ásperos ou anasalados (para outros leitores que fizeram a última turma do Curso de Percepção Auditiva). Já o microfone Neumann e o B&K soam mais sedosos ou aveludados (para a unanimidade dos participantes). Claro que cada um criará seus adjetivos para dizer como lhe soam os violinos, cello e contrabaixo nos três microfones.
O adjetivo é o que menos importa, o que queremos é que os nossos sistemas mostrem as diferenças entre a timbragem e textura desses quatro instrumentos de cordas, com absoluta fidelidade ao que ouvimos desses instrumentos em uma apresentação ao vivo. E a todos os nossos leitores já aptos a ouvir quartetos e orquestras de cordas, usar estes dois exemplos aqui indicados, será matador! Pois soam magnificamente lindos em sistemas Diamante e Estado da Arte bem ajustados.
Se o seu sistema passar pelo teste, parabéns! Em termos de sinergia do sistema, tratamento elétrico, acústico, equilíbrio tonal e textura, o senhor chegou lá!
Mas se ainda não foi desta vez, não desanime. Pois agora você tem as ‘ferramentas’ certas para fazer o dever de casa. E só depende de você chegar lá, sem recorrer a teorias malucas ou ao ouvido alheio!
Boa sorte é o que desejo a todos vocês. E se precisarem de alguma dica ou ajuda, contem conosco!
Mês que vem volto a cronologia inicial, com a apresentação de gravações com dois instrumentos para Equilíbrio Tonal e Organicidade.