Discos do Mês: JAZZ, TRILHA SONORA & JAZZ

AUDIOFONE – Editorial: A DESCOBERTA QUE IRÁ REVOLUCIONAR OS FONES DE OUVIDO
fevereiro 9, 2022
PLAYLIST DE FEVEREIRO
fevereiro 9, 2022

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Esta é a última edição do Discos do Mês… Calma! Calma! Não arranquemos nossos poucos cabelos (no meu caso, pelo menos…). Chegou um momento em que começam a rarear os discos que valem a pena serem indicados, todos os meses.

Continuaremos a falar sobre música – porque a partir da próxima edição, de março de 2022, estaremos com duas colunas mensais sobre música. A primeira será Um Vinil Todo Mês, que trará sugestões de grandes discos de vinil, que tanto são boas gravações como são bons em qualidade musical (e o detalhe: traremos tanto nacionais quanto importados, tanto caros como baratos). E a segunda coluna será Música de Graça, onde indicaremos shows de boa música com qualidade sonora decente, que podem ser encontrados e ouvidos na internet de graça – conteúdo que, hoje em dia, quase todo mundo têm a possibilidade de reproduzir, seja celulares ou computadores, com bons fones de ouvido ou ligando os mesmos em seus sistemas – no meu caso, a smart TV reproduz qualquer conteúdo do YouTube, soltando em digital pela saída ótica, com a mesma ligada à entrada do DAC do sistema.

Outra coluna que inaugurarei em março, é a Influência Vintage, que a cada mês falará de grandes equipamentos e caixas vintage que fazem parte, e sempre farão, da memória e da influência do nosso mundo de apreciação à nobre arte da reprodução eletrônica de música.

Com o Discos do Mês trazendo, em sua última edição, dois bons – mas pouco conhecidos – discos de jazz, e uma grande coletânea de trilhas sonoras consagradas, mais uma vez ficou a pertinente pergunta de um leitor: “por que você não indica discos como Kind of Blue do Miles Davis, e Time Out do Dave Brubeck Quartet?”. Bom, existe uma longa explicação, mas me ocorreu, ao pensar sobre o assunto, o fato de que um articulista de áudio, que faz vídeos para o YouTube com reviews, opiniões e novidades, testa seus equipamentos com discos de vão desde o heavy metal do Metallica, passando pelo rock alternativo e pesado do Tool, até chegar em faixas do Kind of Blue. Ou seja, não há maneira de audiófilos hoje em dia não serem bombardeados há anos pela existência desses dois discos de jazz acima citados – e muitos de nós audiófilos melômanos efetivamente começamos a nos aprofundar mais em jazz por causa desses dois sensacionais discos.

Indicar aquilo que há de mais conhecido e sabido, não engrandece a discoteca de ninguém… Então, seguindo o estilo de sempre, minhas sugestões de música de qualidade para este mês são as seguintes:

Primeiro, temos um disco de jazz moderno de uma cantora ítalo-belga, muito bem gravado e com enorme ambiência. Em segundo, temos uma coletânea de trechos famosos de trilhas sonoras de um dos nomes mais conhecidos do ramo, com uma roupagem de altíssimo nível. E, para finalizar, trazemos um disco de jazz étnico de um tunisiano especializado no oud – a versão do oriente médio para o que conhecemos como alaúde.

Vamos à eles:

Melanie De Biasio – No Deal (Play It Again Sam / Le Label, 2013)

Quando você tem, ao mesmo tempo, indicações de artistas e discos chegando até você por: YouTube, Facebook, sites e blogs de audiófilos e melômanos, amigos, leitores, músicos, diletantes, etc, fica difícil ficar lembrando como algum certo disco ou artista chegou até os seus ouvidos.

E a bela voz da belga Melanie De Biasio pode até ter chegado por sonhos – mas como eu não lembro dos meus sonhos quase nunca, vou ficar devendo essa informação para vocês. Deve ter sido tipo ‘um passarinho me contou’, rs! Tem bom gosto esse passarinho…

A captação e produção foram o que mais me impressionou ao ouvir esse disco pela primeira vez – tanto que facilmente uma das faixas virou uma ‘faixa de teste e demo’ para mim. E, acreditem, isso tocado direito, impressiona mesmo. E é legal, às vezes, quando nosso sistema impressiona, nem que seja somente a nós mesmos. Mas eu adorei também os arranjos, a concepção musical do disco.

Para quem é esse disco? Para os fãs de jazz contemporâneo com voz feminina, com grande ambiências, uso criterioso do clavinet e de sintetizadores analógicos, criando uma sonoridade atmosférica e interessante, cheia de personalidade e um pouco melancólica.

Apesar de ter, na carreira artística, suprimido o acento no primeiro nome, Mélanie De Biasio nasceu em 1978, na província de Hainaut, na Bélgica, de uma mãe belga com um pai italiano. Mostrando aptidão artística, começou a aprender balé aos três anos de idade, e flauta transversal aos oito. Como jovem e fã de rock, desde Pink Floyd e Jethro Tull até Nirvana, aos 15 anos Melanie já participava de uma banda de rock. Depois, ao estudar canto por três anos no Conservatório Real de Bruxelas, passou a dedicar-se à música.

Em 2004, após uma infecção pulmonar que a impediu de cantar por um ano, Melanie desenvolveu o timbre ligeiramente sussurrado que tem até hoje. Após tocar com o saxofonista de jazz Steve Houben, lançou seu primeiro disco em 2007, bastante elogiado pela crítica. O disco aqui sugerido, No Deal, é o segundo de quatro discos.

Em No Deal, De Biasio aparece como compositora, cantora e flautista, com Pascal Mohy ao piano, Dré Pallemaerts na bateria (que também é engenheiro de gravação do disco), e Pascal Paulus nos sintetizadores analógicos e clavinet – perfazendo uma sonoridade de jazz contemporâneo com grande personalidade!

Melanie De Biasio

O baterista do grupo de rock inglês Radiohead, Phil Selway, fã do trabalho de Melanie, declarou que a voz da cantora soa como “… se Billie Holiday tivesse entrado na sessão de gravação do disco solo de Mark Hollis…” (Hollis foi o vocalista da banda inglesa Talk Talk, famosa pela canção It’s My Life, na década de 80 – ele tinha uma voz característica e inconfundível). De Biasio foi a segunda artista belga a aparecer no célebre programa do Jools Holland na TV inglesa, assim como foi uma das principais atrações do Montreux Jazz Tokyo Festival, além de vários outros prêmios e destaques no cenário musical – principalmente europeu.

Destaques do disco ficam por conta de With All My Love, e a instrumental With My Love. Excelentes!

Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de Streaming selecionados / Download. O streaming está realmente muito bom, e foi ele que eu ouvi e avaliei. Claro que eu gostaria de ouvir o vinil, que foi editado em 2013, ao mesmo tempo que o disco foi lançado – e não consegui informações sobre edições mais recentes em analógico. Essa edição em vinil é considerada bastante silenciosa e muito bem gravada! O download do álbum pode ser comprado na página da artista no site Bandcamp, em lossless.

Ouça um trecho da faixa “With All My Loves” no YouTube.
Anne-Sophie Mutter – John WIlliams – Across the Stars (Deutsche Grammophon, 2019)

Acho que não existe ninguém neste lado da Via Láctea que não conheça os vários temas dos filmes de Star Wars, o tema de Indiana Jones, a música de Harry Potter, etc etc e tal. Se não reconhecer pelo menos um, deve ter vivido escondido embaixo de uma pedra nos últimos 40 anos! E todo mundo sabe que quem vive embaixo de pedras é só pessoal do outro lado da Via Láctea, rs…

Bom, esse compositor é o americano John Williams – que adquiriu um certo status de ‘lenda’, chegando ao ponto de reger sua própria música com orquestras como a Filarmônica de Berlim e a Sinfônica de Viena, duas das maiores e mais conceituadas orquestras, verdadeira instituições do repertório clássico, desde o Barroco até o do século 20.

Outra das grandes instituições monolíticas da música clássica é a bela violinista alemã Anne-Sophie Mutter, de 58 anos, considerada uma virtuose em seu instrumento, já tendo tocado e gravado com alguns dos maiores regentes e orquestras dos últimos 40 e tantos anos.

O terceiro ingrediente desse disco é a gravadora, a Deutsche Grammophon, um dos maiores selos de gravação de música clássica, que foi fundado em 1898 no começo das gravações para gramofones – e foi celeiro de algumas das melhores orquestras e regentes do mundo, durante o século 20.

Os catalisadores deste projeto foram, primeiramente, o regente germano-americano André Previn, que com sua grande amizade com o compositor John Williams, apresentou-o à sua esposa Anne-Sophie Mutter. E o segundo catalisador é a vontade atual da
gravadora Deutsche Grammophon, hoje pertencente ao grupo Universal Music, de diversificar seu catálogo de música clássica, fugindo um pouco do repertório clássico usual, e lançando discos de artistas modernos e contemporâneos, como Max Richter, Philip Glass e… John Williams!

A gravação de Across the Stars é excelente, o repertório é bem arranjado, tocado e tratado pela Recording Arts Orchestra of Los
Angeles (um grupo dedicado à gravação de trilhas sonoras para filmes), com a regência e arranjos do próprio compositor, e tudo muito abrilhantado pela violinista virtuose Anne-Sophie Mutter.

Para quem é esse disco? Para todos os fãs de trilhas sonoras, para todos os fãs do trabalho de John Williams, para todos os fãs de Anne-Sophie Mutter, para os que gostam desse tipo de música especialmente bem gravada e tocada. O disco traz temas especiais
bem populares da carreira de Williams, sendo vários de filmes de Star Wars, Harry Potter e Aventuras de Tintim, por exemplo. Mas também traz temas de trilhas menos populares e famosas de Williams, como dos filmes Munique e Lista de Schindler – e a música maravilhosa do filme Memórias de uma Gueixa!

Anne-Sophie Mutter nasceu às margens do Rio Reno, na cidade de Rheinfelden, na Alemanha, em 1963. Seu interesse musical começou com o piano, aos cinco anos de idade e, logo depois, encontrou-se com o instrumento ao qual se dedicaria toda a vida: o violino. Após estudar com Erna Honigberger e, depois, com Aida Stucki no Conservatório de Winterthur, na Suíça, Mutter passou a se dedicar completamente à música. Logo, chamou a atenção do regente austríaco Herbert von Karajan, que chamou-a para se apresentar com ele com um dos grupos mais importantes da música clássica do século 20: a Orquestra Filarmônica de Berlim, ainda na adolescência.

Anne-Sophie Mutter & John Williams

Prodígio em tenra idade, Mutter tocou com Daniel Barenboim regendo a English Chamber Orchestra, e com a Filarmônica de Nova York sob a batuta de Zubin Mehta, entre vários outros. Aos 22 ela já era membra honorária da Royal Academy of Music, de Londres. Com um longo repertório, tanto do tradicional quanto de obras modernas compostas especialmente para ela, Mutter tem uma discografia de mais de 70 discos gravados, além de coletâneas e participações.

Como curiosidade, Anne-Sophie Mutter tem não apenas um, como dois violinos Stradivarius – cujos nomes são: Emiliani (de 1703), e Lord Dunn-Raven (de 1710) – entre outros violinos. Todos os violinos feitos pelo mestre de Cremona, Antonio Stradivari, têm nomes próprios, de tão especiais que são.

John Towner Williams, com uma carreira de músico, e depois compositor, que começou nos anos 50, nasceu em 1932 na cidade de Nova York, filho de um baterista de jazz. Após estudar música na Universidade da Califórnia em Los Angeles, Williams estudou composição diretamente com o pianista e compositor italiano Mario Castelnuovo-Tedesco e, em 1955, de volta à Nova York, ingressou nos estudos de piano com a pedagoga Rosina Lhévinne na prestigiosa Juilliard School of Music. Um de seus primeiros empregos foi ser músico de sessão para o compositor de trilhas Henri Mancini, tendo participado de trilhas como a da série de TV Peter Gunn – e acabou permanecendo no negócio, e sendo extremamente bem sucedido no mercado de trilhas sonoras.

Destaque para as faixas Rey’s Theme (de Star Wars: O Despertar da Força), e Sayuri’s Theme (de Memórias de uma Gueixa) – em um disco excelente!

Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de streaming selecionados. Eu só ouvi o que está no streaming e já gostei muito! O CD, claro, deve ser excelente, e o vinil recém saído (o disco é de 2019) existe em 45RPM e 180 gramas – de deixar os olhos arregalados em cima!

Ouça um trecho da faixa “Rey’s Theme” no YouTube.
Anouar Brahem – The Astounding Eyes of Rita (ECM Records, 2009)

O selo ECM Records, de jazz, clássico e worldmusic, é um daqueles selos que está por aí faz tanto tempo (mais de 50 anos), que mesmo não sendo possível todo seu repertório ser de primeira linha, ainda assim a gente sempre fica com um olho fixo em seus lançamentos – porque vai ter sempre alguma coisa interessante a ser ouvida. E eu tenho um gosto especial pelo que eu chamo de evolução musical – ou seja, acho mais interessante aquilo que inova, como o jazz que traz linguagem de outros gêneros, principalmente a worldmusic e o folk do oriente, África e partes da Europa.

Gravado na Itália em 2008, Astounding Eyes of Rita é um dos discos mais ‘étnicos’ e vibrantes da discografia de Brahem, misturando jazz contemporâneo e folk, trazendo como acompanhantes: Klaus Gesing no clarone, Björn Meyer no contrabaixo e, no outro extremo, Khaled Yassine tocando os instrumentos de percussão darbouka (usado principalmente no Egito) e bendir, do norte e sudoeste da África. A percussão dá muito tempero da África, mas o diálogo do clarone com o oud é o que brilha neste excelente disco.

Para quem é esse disco? Para todos os fãs do repertório da ECM, para os que gostam do jazz moderno que traz a worldmusic e sonoridades étnicas, e para todos que gostam de boas gravações de música acústica de qualidade.

Anouar Brahem

Nascido em 1957, na Tunísia, Anouar Brahem é considerado um inovador em sua linguagem musical de jazz com influências folk e árabes, despontando para a fama em seu país nos anos 1980, e começando a gravar a partir da década seguinte. Brahem começou os estudos do oud (a versão do Oriente Médio do que conhecemos como alaúde), no Conservatório Nacional de Música da Tunísia. Nos anos 80, partiu para Paris, onde teve contato com vários gêneros e formas musicais, colaborando com a música de balés de trilhas sonoras, e compondo para o cinema e teatro tunisiano. De volta ao lar, foi diretor musical do Ensemble Musical de la Ville de Tunis.
Após uma turnê na América do Norte, Brahem assinou contrato com a gravadora alemã ECM Records, com a qual fez mais de
10 discos, além de colaborações, trabalhando com nomes como o saxofonista John Surman, o baterista Dave Holland, e o baterista Jack DeJohnette – grandes músicos do time da ECM.

O destaque especial deste disco vai para as faixas Astounding Eyes of Rita, e Waking State.

Pode ser encontrado em: CD / Streamings selecionados / Download. Mais um disco com o qual eu travei conhecimento apenas pelo streaming. Como acontece com os ECM, o CD é muito bom, certamente. E do mesmo disco pode ser comprado o download no site da gravadora.

Ouça um trecho de “Astounding Eyes of Rita” no YouTube.

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