Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br
A vida nunca segue os planos por nós traçados. Às vezes nos prega grandes surpresas, hora boas e as vezes nem tanto.
No dia 27 de novembro de 2021, acordei às duas e meia como se um urso tivesse feito do meu peito seu banquinho de picadeiro de circo, e com uma queimação que era infinitamente mais quente que a maior queimação que já havia sentido na vida. Foram duas horas com esse mal estar, palpitações, suor frio e dor.
Até que o dia amanheceu, e consegui uma consulta de emergência no cardiologista. Eu mal sabia que os dias seguintes seriam muito mais difíceis e tensos.
O cardiologista pediu os exames de rotina (eletro, eco, esteira, sangue e imagem), e me indicou alguns remédios caso eu viesse a sentir o mesmo mal estar novamente.
Na quinta-feira, ao fazer o exame de esteira, junto com todo o mal estar veio uma forte arritmia o que levou meu médico a trocar o exame de imagem por um de cateterismo, que fiz na segunda (uma semana após o primeiro mal estar).
Como um incorrigível otimista que sempre fui (e continuo sendo), pensei comigo o final de semana inteiro: não vai dar nada, foi apenas o somatório do stress dos últimos dois anos, como para milhares de habitantes do planeta. E caso apareça algo no exame, já faz a angioplastia e volto para casa novo e com as artérias desentupidas.
No cateterismo, a arritmia se agravou, o que me fez sair do exame direto para o hospital Dante Pazzanese, primeiro para o Pronto Socorro e de lá direto para a UTI, pois nem com a medicação intravenosa a arritmia estabilizou.
Deste momento em diante, pela avaliação médica, a angioplastia já estava descartada e se iniciaram os procedimentos preparatórios para a colocação de duas ou três pontes de safena e mamária.
É difícil no atropelo dos acontecimentos colocar a cabeça no lugar e processar tantas alterações em questões de horas. Fui proibido sequer de levantar da cama, acompanhando toda a rotina de uma UTI com 17 pacientes internados, por 10 dias.
No terceiro dia, consegui convencer a equipe médica que cuidava de mim que, para uma melhora do meu bem estar, precisava de um fone de ouvido para ao menos ouvir música e colocar as emoções em ordem, e graças à minha filha consegui o fone do seu celular emprestado. Um péssimo fone por sinal (risos, e que eu morda minha língua mil vezes!), mas nunca foi tão providencial aquele fone, naquele momento.
Quando, finalmente, me disseram a data que iria operar (já haviam se passado seis dias na UTI), passei para a minha filha a data e comecei a me preparar psicologicamente para abrirem meu peito e corrigirem as artérias entupidas, para tirar aquele urso sentado no meu peito.
Aqui faço um enorme parêntese, para agradecer a todos os amigos que se preocuparam, oraram, torceram e estiveram o tempo todo querendo saber notícias e confortar a mim e minha família. Amigos de infância, amigos que fiz na revista e amigos recentes que não tem sequer dois anos que conheci.
Sem essa empatia e carinho, eu acho que teriam sido dias muito mais difíceis! Espero viver mais 20 anos para retribuir a todos esse enorme afeto!
Pois bem, a notícia da cirurgia chegou às 11 da manhã, e às 17 horas lá vem a equipe médica, informar que o cirurgião desaconselhou totalmente a cirurgia, pois o risco era muito maior do que não fazer. Foi nesse momento que vi o limite de um otimista. Se não estivesse deitado, acho que certamente cairia.
Minhas artérias, por uma questão genética, são muito finas (bem acima da média) e as obstruções em duas são bastante severas (uma 100% e outra 90%). E que para esses casos, a única opção é a medicamentosa.
Fiquei ainda mais quatro dias na UTI, depois fui transferido para a enfermaria e depois recebi alta com um coquetel de 8 remédios para tomar diariamente, que de tão intensos seus efeitos colaterais pela dosagem, me fizeram sentir tão mal quanto quando entrei na UTI.
Viver dessa maneira, sem ter energia para sentar e ouvir música por uma hora, ou ler um livro, ou caminhar com a minha filha no jardim de casa, não seria viável. Não para mim, de maneira alguma.
Foi aí que mais uma vez dois queridos amigos entraram no circuito, e me indicaram uma cardiologista com 45 anos de prática, professor e médico do Incor, que reviu todo o meu quadro, exames e me deu uma aula do que eu tive e como será minha vida daqui para frente.
Estou vivo, graças a uma terceira artéria que, ao contrário das duas menores, tem boas dimensões, não está obstruída e continua a trabalhar firme e forte. É dela que tenho que cuidar com todo zelo e mantê-la em excelente estado por muitos e muitos anos.
Com isso farei exames de sangue de três em três meses, exercícios moderados diariamente (como caminhar por meia hora e pilates), dieta balanceada e o melhor de tudo: das oito medicações iniciais, só restaram três para o resto dessa existência.
E, acima de tudo, evitar qualquer tipo de stress (adorei essa parte, pois já avisei que estou fora de qualquer discussão política, religiosa e esportiva pelo resto dos meus dias).
E terei que mudar completamente meu ritmo de vida profissional (que convenhamos era insano, trabalhando de domingo a domingo) e carregando peso de equipamentos para cima e para baixo, descomunais.
Isso acabou e, por isso que resolvi compartilhar com todos vocês leitores, a gravidade do meu problema de saúde, pois por prescrição médica, o plano de reiniciar os Cursos de Percepção Auditiva, não ocorrerá mais. E não poderia simplesmente não comunicar aos 231 inscritos essa nova realidade.
A notícia boa é que (o otimista que carrego em mim, voltou), terei mais tempo com a família, os amigos, os livros, meus cachorros, e desfrutarei mais tempo deste lugar maravilhoso em que moro.
Não poderia terminar este longo texto sem uma palavra de agradecimento ao Christian Pruks, ao Juan Lourenço, à Daianne de Campos, e ao Wilson Caruso Junior, que foram inestimáveis em ajudar a colocar dentro do prazo a Edição de Dezembro/Janeiro – sem eles não seria possível, pois eu estava sem a menor condição de fazê-la.
E ainda que tarde, desejo a todos um excelente ano, com paz, empatia, harmonia e o essencial: saúde!
1 Comments
Saude e força, pois espero ler as proximas 250 edições desta revista !!!!
Comprei todas as edições em banca desde que li um artigo nesta revista do Holblein Menezes, “quinqualago da reprodução….”‘
Nunca mais deixei de ler esta publicação, antes das bancas e depois on line.
Um abraço e muita saude.
Diógenes
Florianopolis