Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br
No playlist desse mês vou lançar um desafio a todos os nossos leitores que curtem essa seção. Para o desafio eu revirei as três últimas semanas ouvindo quase uma centena de gravações no Tidal, buscando quatro que, além de qualidade artística, tivessem também uma boa qualidade técnica, para vocês poderem testar seus sistemas e ouvir suas virtudes e limitações.
Pois são quatro gravações que irão avaliar praticamente todos os quesitos da Metodologia (até o soundstage, a pedra no sapato de qualquer streamer ainda).
Topam o desafio?
Para uma avaliação ‘honesta’, sugiro que dosem os volumes, pois são gravações atuais e como estão com bom Equilíbrio Tonal, não precisa sentar a pua. Pelo contrário, para uma avaliação correta deste primeiro quesito da Metodologia, volumes moderados em setups bem ajustados irão soar muito bem, sem esforço adicional algum para se escutar todas as frequências.
Desejo a todos boa sorte, e que a esmagadora maioria saia vitoriosa do desafio. Esse seria o melhor presente que poderíamos receber de vocês nos nossos 26 anos de vida. Pois como sempre disse, não viemos para dar o peixe pronto, e sim para ajudar a cada um pescar o que desejar!
Você conhece essa cantora Inglesa, que deseja ganhar cidadania Portuguesa, por não concordar com a saída da Inglaterra da União Europeia? Ela é uma cantora, compositora, arranjadora e multi-instrumentista. Com certeza ouviu em toda sua infância muito Tori Amos, Kate Bush, folk, música celta, jazz e música barroca, vozes à capella.
Pois todos esses estilos estão muito presentes nos seus três trabalhos lançados até agora.
Oracles de 2018, na minha humilde opinião, é o mais consistente, lindo e criativo. Mas se você leitor gostar, escute os outros dois, e certamente terá uma ideia mais consistente do talento de Ana Silvera.
Em um mundo tão conturbado e desumano, poder sentar e escutar um trabalho como Oracles é reconfortante, e nos proporciona alguns momentos de paz. A gravação é primorosa, assim como os arranjos minimalistas, recheados de belos corais, cordas e seu piano.
Seu sistema terá que dar conta, sem soar brilhante, nas notas mais altas da mão direita do piano, não perder a inteligibilidade de cada uma das vozes dos corais (horas só feminino, outras com vozes femininas e masculinas). E as cordas não poderão soar duras ou brilhantes!
Se seu sistema der conta, e ainda lhe transmitir a beleza poética e intencionalidade dos arranjos, parabéns meu amigo, o sr. chegou lá!
Aqui as águas serão mais profundas, e não tão suaves para nenhum sistema! Então, se seu setup não estiver preparado para maiores desafios, peça uma licença e continue a navegar na sonoridade de Ana Silvera.
Ferlet nasceu em 1971, começou a tocar piano aos 7 anos de idade, e estudou música clássica na Escola de Música de Paris. No final dos anos 80, mudou-se para Boston, para estudar composição com Herb Pomeroy, Hal Crook, Ed Tomassi e Ed Bedner e, em 1992, formou-se em Composição de Jazz no Colégio de Música de Berklee, e já no ano seguinte ganhou o prêmio de melhor performance de jazz de Berklee.
De volta à França, gravou na sequência dois trabalhos (Escale e Zazimut) e logo foi trabalhar em parceria com o baixista Jean-
Philippe Viret, com quem gravou três discos em seis anos. Étant Donnés é seu mais recente trabalho com esse trio, e a volta da parceria com o amigo baixista Viret.
As composições são todas do grupo, o que torna o trabalho muito mais aberto à experiência musical de todos os integrantes. É um disco para se ‘degustar’ aos poucos, pois a quantidade de informação e qualidade dos arranjos e execuções é impressionante.
Quer um exemplo? Comece pela faixa 3, Par Tous Les Tempes, para ter ideia da virtuosidade e bom gosto do grupo. Eu sempre digo que os melhores arranjos são os que parecem simples de serem apresentados aos leigos.
Ainda que para qualquer sistema, nenhuma faixa desse trabalho será ‘pêra doce’! Então, não se frustre se o setup tiver dificuldade de passar toda a inteligibilidade que os intrincados arranjos exigem, ou a virtuosidade presente nos solos dos músicos.
O Equilíbrio Tonal precisa ser excelente, para as notas não passarem para o brilhante. A transparência e a microdinâmica precisam estar em dia, para não perdermos detalhes intencionais importantes, e o corpo harmônico para apresentar a exuberância do piano e do contrabaixo corretos.
Se seu sistema responder à altura a esses requisitos, parabéns meu amigo, seu sistema é digno de ser ouvido com grande prazer!
Eis Alex Riel, um baterista de jazz e rock dinamarquês que acaba de completar 81 anos, e que transita com total desenvoltura nesses dois universos, ganhando Grammys em ambos os estilos, e que gosta de dizer em suas entrevistas que, para ele, a música não tem fronteiras, e quem as coloca em compartimentos desconhece a universalidade musical.
Como baterista de Jazz, Riel tocou com todos os grandes, como: Bill Evans, Ray Brown, Don Cherry, Art Farmer, Stéphane Grappelli, Ben Webster, Kenny Drew, e uma dezena de grandes talentos.
Em 1968, ele fundou um grupo de rock The Savage Rose, e gravou com a banda sete álbuns, Our Songs, com seu trio (o pianista Bo Stief e o baixista Carsten Dahl), quiseram fazer uma homenagem ao pianista Keith Jarrett, e gravaram esse belo disco com obras que ficaram imortalizadas com ele e que, provavelmente, outros músicos pensariam mil vezes antes de topar esse desafio.
Mas Riel nunca se esquivou de desafios, mergulhou de corpo e alma e o resultado foi uma belíssima homenagem, que tenho certeza que se o Keith Jarrett ouviu, aprovou plenamente!
Se aceita um conselho, não comece pela faixa 1 (My Song), e sim pela faixa 3 (Moon River), pois ela lhe dará o ‘clima’ da homenagem, ao mesmo tempo que prepara seu coração e espírito para uma viagem musical de um bom gosto singular!
Aqui, novamente, seu sistema irá precisar que, em termos de Equilíbrio Tonal, ele esteja ‘azeitado’ e pronto para os desafios de ter a extensão correta nos agudos no trabalho magistral de Alex nos pratos e na condução, e no bom gosto do uso da vassoura na caixa.
E com tão exuberantes texturas, é possível que você que é mais jovem e está ainda sob o ápice do domínio da testosterona, consiga ter um vislumbre do quanto é belo, ‘o menos é mais’!
Todos os arranjos e solos são absolutamente minimalistas, com tempo para o silêncio permear cada nota e ideia que se apresenta.
Em sistemas ultra transparentes, toda essa magia se dissipa como vapor, então se queres ver o equilíbrio entre transparência e musicalidade de seu setup, essa gravação é perfeita!
Eu já indiquei outros discos, aqui mesmo nessa seção, deste genial baixista francês, também conhecido em seu país como “o Paganini do contrabaixo”.
Sua impressionante técnica de tocar com o arco, ele aprendeu com seu professor aos 16 anos, François Rabbath, que permite que ele explore seu instrumento de maneira livre e, diria, até audaciosa!
Tanto que em seus solos algumas notas ‘excedem’ o limite de resposta do instrumento, nos fazendo duvidar que seja mesmo um contrabaixo não ‘turbinado’.
Fons, assim como o cellista Yo-yo Ma, nunca se enquadrou em um único estilo, e abraçou muito cedo a world music, principalmente a música oriental, graças à amizade e parceria de longos anos com o mestre do alaúde iraniano, Ostad Elahi.
Renauld também compõe para quartetos de cordas, e faz inúmeros workshops pelo mundo quando lhe sobra tempo, divulgando e ensinando a técnica de arco que ele aprendeu com seu mestre Rabbath.
Suas composições possuem inúmeros elementos da música oriental, e com um enorme interesse em fazer uma releitura do flamenco para seu instrumento e quartetos de cordas.
O resultado é primoroso.
Se você quer entrar no universo musical de Renaud Garcia-Fons, não existe melhor exemplo do que esse belo disco gravado ano passado, em que ele escreveu as 12 faixas para instrumentos de cordas, como quarteto, alaúde, violão flamenco e seu contrabaixo.
A música é tão vigorosa e intensa, que o tempo simplesmente cessa a sua volta.
Só tem um pequeno problema, um alerta que necessita ser dado (rs!). Seu sistema será exigido integralmente. Aqui não tem conversa, ou aquele ‘jeitinho brasileiro’ – ou passa ou sucumbe!
Pois o sistema como um todo será exigido ao limite em termos de Equilíbrio Tonal, transientes, corpo harmônico e textura.
Então comece pegando leve no volume, principalmente para ver como suas caixas se comportam nos graves, e se a sala acusticamente suporta tamanha pressão sem embolar as notas, ou as paredes saírem vibrando por horas (rs!).
Espero que seu sistema supere os desafios, pois se o fizer, garanto que você irá gostar e mostrar com o maior orgulho para os amigos, enchendo o peito de felicidade, com tamanho feito!
Quero notícias de todos que aceitaram o desafio, OK?