Christian Pruks
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Equipamentos Vintage que fazem parte da história do Áudio
O termo Vintage tem a ver com ‘qualidade’, mais do que ‘ser antigo’. Vem do francês ‘vendange’, safra, sobre uma safra de um vinho que resultou excepcional. ‘Vintage’ quer dizer algo de qualidade excepcional – apesar de ser muito usado para designar algo antigo.
Nesta série de artigos abordamos equipamentos vintage importantes, e que influenciam audiófilos até hoje!
MADE IN EUROPE & GREAT BRITAIN
Continuando, este mês, com mais um equipamento fruto da dedicação britânica pela alta-fidelidade, mas desta vez da década de 80, e de algo mais diverso do que o usual analógico de amplificação, caixas acústicas e toca-discos de vinil.
Sim, o áudio digital – especificamente o CD – já é ‘Vintage’, com seus mais de 40 anos de idade! E é mais ou menos o mesmo tempo que eu tenho de contato com a audiofilia, com a ideia de ouvir música com seriedade em equipamentos dedicados à qualidade sonora. (Me sentindo velho, mais uma vez…).
O CD é uma invenção conjunta entre a holandesa Philips e a japonesa Sony, e cada qual lançou seu primeiro modelo de aparelho leitor. Mas, até onde eu sei, o primeiro CD-Player ‘Audiófilo’ do mundo foi feito pela britânica Meridian.
O CD-PLAYER MERIDIAN MCD
Em outubro de 1982, o primeiro disco de CD foi prensado, e no mês seguinte já veio o primeiro aparelho de CD – o primeiro CD-Player da Philips, o primeiro comercialmente disponível ao mercado europeu – chamado de CD100, que teve curta duração no mercado, e um preço muito alto.
Dois anos depois veio o CD101, um terço mais barato, com a cara parecida e gabinete praticamente igual ao do CD-100 – mas com DAC 16-bit, contra o DAC 14-bit de seu irmão mais velho, e com o conjunto mecânico/ótico CDM1, em vez do CDM0, que era feito à mão, mais frágil, menos preciso, soava pior e encarecia o player um bocado.
E é nesse CD101 que se baseia – de maneira visualmente óbvia – o CD-Player Meridian MCD, primeiro CD-Player audiófilo do mercado, desenvolvido pela empresa Boothroyd-Stuart Meridian. Seu preço era aproximadamente 35% mais caro que o Philips CD101 de fábrica: a única referência de preço que encontrei, dava conta dele custar aproximadamente 400 libras em 1985, o que daria, em valores atuais, aproximadamente 1200 libras, ou 1500 dólares americanos. Ou seja, uma valor bem decente para um player cujo intuito era trazer sonoridade superior à todos os outros no mercado.
Apesar da lerdeza de leitura, e da ausência de um display, a Meridian escolheu o CD101 como base para seu aparelho, por ser considerado, na época, o Player com melhor qualidade sonora – e o que tinha o gabinete mais sólido e mais bem construído, trazendo melhor imunidade à vibrações.
Diferente de um toca-discos ou amplificador, que podem ser totalmente desenvolvidos por qualquer empresa de áudio, no começo da década de 80 desenvolver desde o zero a parte de leitura, conversão digital e correção de erro de um CD-Player era uma impossibilidade para empresas menores, e era considerado um pináculo da engenharia eletrônica mesmo para gigantes como a Philips e a Sony. A verdade é que, durante o período todo da presença do CD como líder de mercado, pouquíssimas empresas audiófilas se aventuraram a fazer sua própria unidade mecânica/ótica, sendo que a maioria sempre usou as fornecidas por Philips, Sony, Teac e afins – as gigantes tecnológicas japonesas. Mas claro que, com o tempo, numerosas empresas passaram a dominar a arte do desenvolvimento da placa de DAC inteira, desde a conversão até os filtros.
Por isso, a britânica Meridian – que já estava no mercado audiófilo fazia algum tempo com caixas – pegou um CD101 original e melhorou as fontes de alimentação de cada parte do circuito, mudando os capacitores de filtragem, alterando extensamente a filtragem analógica pós conversor, e quase que totalmente o estágio de saída, além de ajustar a velocidade do servo de foco do laser, melhorando sua leitura. E, claro, pintar o aparelho de uma cor cinza que, para mim, é muito mais bonita que o prateado original da Philips.
MODELOS SEMELHANTES
O primeiro CD-Player comercialmente disponível na Europa é o CD100, que trazia limitações técnicas, que foram resolvidas com o modelo CD101, considerado o melhor CD em matéria de qualidade sonora – constituindo a preferência audiófila sobre os modelos que emergiram do Japão.
Pouco tempo depois do MCD, a Meridian fez mais uma atualização, que aumentava o tamanho do gabinete original do MCD para baixo, e passava a se chamar MCD Pro, trazendo modificações ainda mais profundas no projeto.
COMO TOCA O MERIDIAN MCD
Notoriamente os digitais da Philips seguiam um som mais ‘europeu’, contra os digitais Sony (e outros) com seu som japonês e americano. Lembro da sonoridade não-ideal do meu primeiro CD-Player na década de 80, um Yamaha. E lembro de que vários CD-Players audiófilos muito mais agradáveis aos ouvidos, nas décadas 80 e 90 – eram baseados em originais da Philips, como os da California Audio Labs.
Segundo várias fontes, o Meridian MCD trazia melhorias na extensão dos agudos, e no ataque dos médios e agudos – e que chegou a ser acusado de trazer agudos que mais evocavam a sonoridade japonesa do que a europeia, com mais ‘mordida’. Difícil querer comparar e entender isso hoje em dia, já que os sistemas de quase 40 anos atrás soam de maneira extremamente diferente dos de hoje, mas outros críticos elogiaram bastante outras características do som do MCD, como ser menos seco e menos granulado que os CD-Players consumer da época, além de várias melhorias na apresentação do palco.
SOBRE A BOOTHROYD-STUART MERIDIAN
A empresa foi fundada em 1977, em Huntingdon, na Inglaterra, pelo designer industrial Allen Boothroyd e o engenheiro eletrônico Bob Stuart. Boothroyd, inclusive, teve envolvimento com outros projetos célebres no Reino Unido, como o BBC Microcomputer.
A Meridian, além do desenvolvimento e fabricação de CD-Players de DACs de alta qualidade para o mercado audiófilo, e de amplificadores e pré-amplificadores, ficou bastante conhecida por ter sido uma das primeiras empresas a fazer caixas acústicas ativas para o mercado de som residencial.
Ao longo do tempo, outros negócios da empresa – que ainda hoje fabrica caixas ativas – incluíram o desenvolvimento e patente do Meridian Lossless Packing para o frustrado formato de mídia DVD-Audio (que perdeu a batalha para o SACD), a aquisição da empresa de media server Sooloos, a criação do frustrado e confuso formato de mídia de áudio MQA (Master Quality Authenticated), e associação para fornecimento de tecnologia de áudio para os carros da Jaguar Land Rover e para soundbars e caixas Bluetooth da sul-coreana LG, entre outras.