Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br
Uma espécie de diversão aqui na edição da revista, é ver as fotos – orgulhosamente compartilhadas pelos audiófilos na Internet – de suas salas e sistemas. E que sempre suscitam exclamações de admiração pelos internautas. E que, em sua maioria, são salas completamente erradas…
Um pouco de contexto: imagine que a pessoa é fã de comida, de restaurantes, de receitas elaboradas, de programas de culinária, e monta uma cozinha cinematográfica em sua casa, em uma varanda gourmet, com equipamentos caros – e aí o suprimento de gás é pouco e o fogo é baixo demais, o acesso às bocas do fogão não dá para pôr as panelas necessárias, o forno não abre a porta o suficiente para se enfiar uma travessa grande dentro, tudo ocupa espaço demais e não tem onde sentar para comer, etc. É o que se chama de Comédia de Erros. E aí a pessoa faz isso porque não quer ler, estudar, aprender, saber como implementar e utilizar sua cozinha gourmet, simplesmente por ignorância. E uma ignorância voluntária, ainda.
E, alguns, no fundo, também nem sabem que não estão nem perto de utilizar o melhor que sua (caríssima) cozinha gourmet pode oferecer. Não utilizam nem metade. E ficam com raiva quando você aponta que estão errando de uma maneira que parece até piada – e sendo aplaudidos por uma legião de pessoas que parece não querem fazer boa comida, não gostam de boa comida, não querem gostar, têm raiva de quem gosta, e só querem a cozinha gourmet por status – ou pra ficar olhando para os botões e luzinhas, talvez se imaginando em uma nave espacial, não sei.
Por que raio de motivo alguém não quer tirar a melhor qualidade de som possível do seu sistema de som? Dos equipamentos que comprou e combinou? E ainda desdenha de quem quer ajudar, e desdenha de conhecimentos que têm resultados claros? E nem os tenta implementar! Fala que é placebo!
Do mesmo jeito que fala um sujeito de um canal sobre áudio do YouTube, que disse que “audiofilia é psicológico” – pra ele comida de alta qualidade também deve ser, pois ele deve ser o ‘gourmet do miojo com salsicha’… rs…
Se você sabe a resposta para essas dúvidas cruéis, me diga – porque eu mesmo não sei. Só sei que já ouvi muito desdém e pouca resolução. Chega a parecer ridículo.
A foto que ilustra esta matéria, aí no topo da página, é uma sala linda! E que é incrivelmente errada! Caramba!
Vamos apontar os erros:
1) Os discos das últimas prateleiras de cima devem ser só decoração, porque o trabalho para acessá-los e selecionar algum para ouvir, é miserável.
2) Tem dois pares de caixas, ambos enfiados na parede do fundo. Para começar, não se pode usar os dois pares ao mesmo tempo.
3) As caixas enfiadas na parede do fundo ajudam a concentrar os graves de maneira que é quase certo de que sua vibração vai interferir com o funcionamento correto dos toca-discos de vinil que estão no rack.
4) A falta de recuo das caixas da parede ao fundo vai embolar os graves ao ponto de não só eles ficarem excessivos, como eles embolarem, sobreporem os médios e agudos, e perderem definição e recorte dos instrumentos sendo reproduzidos nas frequências graves, como percussão e contrabaixo, não sendo possível discernir um instrumento de um barulho.
5) Esse mesmo encosto das caixas, impede respiro da reflexão dos médios e agudos para trás das caixas (sim, eles fazem isso), tirando ambiência e achatando a ilusão de palco, anulando qualquer profundidade que ele possa ter (e o povo que acha que a ilusão de palco não existe).
6) As caixas sem nenhum toe-in (sem a angulação regulada das caixas em direção ao ouvinte) – e isso coopera com o fato desse sistema aí não ter absolutamente palco algum.
7) E, por fim, a posição das cadeiras pode ficar bonitinha em revista de decoração, mas não permite um equilíbrio entre o conteúdo musical de cada um dos canais – ouve-se muito mais uma caixa do que a outra. Imagina então o fato de que, se não se sentar equidistante das caixas, de frente para elas, a possibilidade de percepção do palco (se tivesse) iria totalmente para o vinagre.
Todas essas considerações e regras se aplicam a qualquer sistema de som que tenha um par de caixas separadas (ou destacáveis) – seja ele vintage (como na foto) ou até mesmo um micro-system.
E não, um equalizador não resolve nada disso citado acima…
A pessoa quer ouvir a melhor qualidade sonora que seu sistema pode prover? A melhor fidelidade à música original gravada, fidelidade ao som dos instrumentos musicais usados?
Ou ela quer ter o aparelho por status e ficar admirando as luzinhas?