Christian Pruks
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Equipamentos Vintage que fazem parte da história do Áudio
O termo Vintage tem a ver com ‘qualidade’, mais do que ‘ser antigo’. Vem do francês ‘vendange’, safra, sobre uma safra de um vinho que resultou excepcional. ‘Vintage’ quer dizer algo de qualidade excepcional – apesar de ser muito usado para designar apenas algo antigo.
Nesta série de artigos abordamos equipamentos vintage importantes, e que influenciam audiófilos até hoje!
MADE IN JAPAN
O Japão, como todo mundo se lembra, dominou o áudio mundial do começo da década de 70 até a virada para a década de 90, pelo menos.
Foi uma época onde o aparelho de som era um dos eletrodomésticos mais importantes – certamente mais importante que a televisão – e a escuta e apreciação de música eram muito maiores, mais dedicadas e mais difundidas do que é hoje em dia. Como hobby e entretenimento, batia o uso da TV – incluindo o menos difundido e nem tão barato de se manter (mídia inclusa) videocassete. Aliás, quando o videocassete se tornou profundamente usado e difundido, adivinhe que país dominava a produção de equipamentos e de mídia para esse crescente interesse em assistir filmes em casa ‘on demand’? O Japão, claro – além de games, relógios de pulso, os primeiros fornos de microondas que vi, e por aí vai.
Nesse cenário, vale sempre lembrar que alguns equipamentos e marcas japonesas faziam parte dos racks audiófilos – talvez só não dos mais hiper-puristas. Até porque eles produziram vários equipamentos de altíssimo nível, em várias categorias.
Eu fico imaginando a grana que as maiores corporações do país estavam fazendo, para vira e mexe se dedicarem a produtos com detalhes obviamente bem mais caros que a linha ‘consumer’ da mesma empresa.
Uma das corporações é a Matsushita, que tinha marcas mais simples como a National e a Panasonic, e marcas que sempre prezaram maior sofisticação, como a Technics – que todo mundo associa mais com toca-discos de vinil, mas que fizeram também amplificadores, receivers, excelentes tape-decks, gravadores de rolo e, como o exemplo abaixo, caixas acústicas.
CAIXAS ACÚSTICAS LINEAR PHASE SB-F3 DA TECHNICS
De 1978 até 1984, a Technics no Japão produziu uma linha de caixas acústicas cujo gabinete era feito totalmente de alumínio, em duas peças: a frente parafusada por longos parafusos na parte de trás do gabinete.
O modelo SB-F3, com 32cm de altura e ostentando um woofer de 6 polegadas em suspensão acústica, foi o modelo topo dessa linha. O gabinete era revestido por dentro de borracha, tinha um travamento com uma haste cilíndrica de polímero que ia de lado a lado, e ainda era recheado de lã acústica.
Ambos falantes foram desenvolvidos pela empresa, e exclusivamente para esse modelo. O dito woofer trazia cone de polpa de celulose (papel) reforçado, de alta rigidez, e bobina de alumínio (algo bastante incomum para a época), além da borda de poliuretano. O tweeter, montado bem mais para trás que o woofer, era um domo de metal de 19mm inserido no fundo de uma corneta – a qual tinha uma segunda parte que era a própria frente da caixa. Esse alinhamento melhor entre o woofer e o tweeter é o que dá o nome de Linear Phase (Fase Linear) à caixa. Por fim, o divisor de frequência é simplificado porque os drivers foram desenvolvidos direto para essa caixa, e traziam todos componentes fabricados pelo Grupo Matsushita.
São belíssimas caixas, bem acabadas e bem construídas – e provavelmente muito colecionáveis – que conquistaram bastante os fãs da marca Technics e seu nível de especialização. Porém, custavam caro para a empresa. Ainda assim, ficaram em linha por seis anos, sendo que os dois modelos menores, a F1 e a F2, ainda foram por mais 7 anos, até 1991.
As F3 tinham 89dB de sensibilidade, potência contínua de 60W e impedância de 8 ohms. Algumas especificações dizem que sua resposta era de 45Hz a 20kHz – porém medições de laboratório dão que os agudos podem chegar até a 22kHz fora de eixo.
A pior questão é, nas medições, os graves: abaixo de 100Hz, até chegar a 50Hz, é uma ‘rampa de descida’ de 10dB!
O preço do par de SB-F3 em 1978 era de aproximadamente 260 dólares – o que, em valores atualizados, chega próximo a US$1.300.
MODELOS SEMELHANTES
Dizem que, nos primeiros anos de produção, as especificações das F3 produzidas para o mercado nacional japonês, diferiam das de exportação – e que o resultado sonoro disso espelhava as predileções sonoras do mercado ocidental. Isso é muito interessante, pois as japonesas, para os padrões sonoros atuais, podem soar bastante mais suaves e agradáveis – mas duvido que conseguiremos descobrir a verdade.
Junto com as SB-F3, a Technics produziu seus dois modelos menores: SB-F1 e SB-F2, onde o desenvolvimento dos drivers, gabinete e etc, é bem semelhante. Além da versão prateada, as três caixas foram comercializadas em preto (na verdade algo que parece um cinza bem escuro), que são bem mais raras de serem encontradas no mercado.
A Technics lançou outras caixas que eram Linear Phase, com tweeters montados atrás de cornetas que eram a própria frente da caixa – mas em outras linhas, e geralmente em gabinetes normais, não de alumínio. Dentre os modelos estão a SB-X50 e a SB-F01.
COMO TOCAM AS SB-F3
Bom, em resumo, o som delas é um pouco fatigante nos agudos, que são abertos demais e demandam muitos ajustes e casamentos com amplificadores para ficarem palatáveis. E graves que perdem todo o peso necessário para tocarem bem – ou seja, a faixa que iria de 50Hz a 100Hz – e acabam tendo, por isso, uma extensão que nem o reforço de sala salva.
Foram caixas que vinham casadas com um micro-system modular que, por vezes, era um amplificador integrado, e em outras um pré e power, acompanhados de um tape-deck e um sintonizador de FM. O som da amplificação desse micro-system é chocho e sem vida – o que deveria provavelmente amansar os agudos das caixas.
Uma das ‘vantagens’ observadas no uso dos graves de suspensão acústica, na época, era sua facilidade de posicionamento. Ou seja, você quer ‘um pouco’ de graves, enfie na parede ou em um canto ou prateleira apertada, e estrague todo o resto do som…rs…Não é à toa que todo amplificador da época tinha Loudness e controles tonais!
Ao ouvir essas caixas, e observar suas especificações e construção por vídeos e numerosas matérias sobre elas na Internet, chego à conclusão de que foram cometidos alguns erros. São eles: a vontade de fazer com que o tweeter dê agudos demais, que poderia ser facilmente melhorada, e muito, durante o projeto do crossover e do próprio tweeter. E, não terem feito elas como bass-reflex, onde também o reforço do ambiente melhoraria tais graves, em peso e em extensão, imensamente.
SOBRE A TECHNICS
A Technics é o braço de produtos de áudio de alta qualidade do amplo grupo Panasonic Corporation – que foi fundado como Matsushita Electric Industrial, em 1918, e mudou de nome em 2008, e cujas áreas de atividade incluem, além de áudio e vídeo, automação, equipamentos industriais, Inteligência Artificial, eletrodomésticos, iluminação, robótica, baterias, e muitos outros.
A Panasonic Corporation já incluiu marcas como National, Panasonic, Sanyo, a marca Quasar americana (que já foi da Motorola), e a Rasonic.
A divisão Technics foi fundada em 1965, e ganhou fama mundial mesmo por seus toca-discos de vinil com motor direct-drive – por tração direta – já na virada da década de 70. Sua extensa linha de amplificadores, receivers, tape-decks e caixas acústicas, foi comercializada em todo o mundo, durante as décadas seguintes.
A divisão foi descontinuada em 2010, tirando de linha a versão anterior do célebre toca-discos SL-1200. Mas, com o retorno do vinil ao mainstream, a Technics foi ressuscitada em 2014, com versões atualizadas de seus toca-discos, além de uma linha completa de amplificadores, players de CD, streamers e caixas acústicas.
Bom março – e não deixem a música parar!