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junho 5, 2023
Opinião: É PRECISO SABER O BÁSICO PARA NÃO COMETER ERROS TOLOS – PARTE 4
junho 5, 2023

Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br

“Nunca subestime a capacidade do leitor querer aprender”

Esse foi o único pedido feito por meu pai, quando eu resolvi produzir o Clube do Áudio.

Sua preocupação era pertinente, pois ele, junto comigo, lia as publicações existentes nos anos 80, principalmente as de língua inglesa, e sentia que a linha editorial da maioria dessas publicações deixava nítido que não queriam se comprometer, criando categorias de estrelas ou letras para ‘acomodar’ os produtos testados.

De março de 1996 à Edição de Aniversário de 1999, optamos por seguir os moldes de classificação por estrelas, enquanto preparávamos nossa Metodologia.

Para mim, não fazia sentido criar uma Metodologia se algumas premissas não fossem colocadas em conjunto com o que iríamos propor aos leitores e ao mercado.

A primeira: termos gravações que pudessem servir de ‘norte’ para a avaliação de equipamentos.

A segunda: que nossos revisores críticos de áudio, tivessem sistemas coerentes e no nível dos produtos que eles iriam testar.

E a terceira premissa: que todos os produtos enviados para teste, se fossem abortados, o único a saber seria o próprio fabricante ou o importador.

A Metodologia, depois de totalmente alinhavada, foi exaustivamente discutida entre todos os colaboradores (mesmo os que não eram revisores críticos de áudio), e apresentada finalmente em maio de 1999 aos nossos leitores e ao mercado.

Paralelamente ao lançamento da Metodologia, iniciamos os Cursos de Percepção Auditiva, para ajudar os leitores, fabricantes e revendedores a entender como ela era aplicada e o que observávamos em cada um dos seus oito quesitos.

Mais de 2 mil leitores fizeram algum nível dos Cursos, aproximadamente 55% fizeram a série completa, e alguns repetiram por anos sua participação.

Jamais perdemos de vista que, além de todo esse trabalho de campo, era essencial produzir mensalmente artigos que ajudassem nossos leitores a aprenderem a andar com os próprios ouvidos em sua jornada em busca do seu sistema ideal.

Em 27 anos, foram publicados centenas de artigos técnicos e inúmeros artigos de Opinião, fomentando o senso crítico de cada leitor a não perder de vista o que é essencial para manter esse maravilhoso hobby nos ‘trilhos’.

No Editorial da última edição, expus minha opinião sobre o futuro do audio hi-end e o motivo de não temer que a audiofilia esteja na UTI.

No entanto, por falta de espaço, deixei de comentar meu único temor em relação ao futuro do áudio hi-end: os futuros formadores de opinião, que começam a despontar nas novas mídias como Youtube, mídia online e fóruns.

Por obrigação do ofício, leio com interesse todos esses novos canais, e consigo separar o ímpeto juvenil e as besteiras que proliferam como ervas daninhas em um jardim abandonado.

E consigo até rir de determinados deslizes, pois também os cometi no meu início, mas algumas coisas me incomodam e me preocupam muito. Pois são verdadeiras falácias repetidas sistematicamente com o intuito de se tornarem verdades.

Li recentemente na BBC News um ótimo artigo sobre falácias, e concordo integralmente com o alerta feito no texto: “Na lógica, as falácias são raciocínios errados que têm aparências de verdade”. E um pouco adiante, o editor acrescenta: “São afirmações sem fundamento, frequentemente oferecidas com tanta convicção que parecem ter sido comprovadas. E podem adquirir vida própria quando se tornam populares e passam a ser parte de uma crença”. E conclui, brilhantemente, nos alertando que: “As falácias não são apenas incorretas. Se forem usadas conscientemente, são desonestas”.

E, meu amigo, tenho visto tantas falácias em tantas mídias que, não se manifestar, seria um ato de omissão grave de minha parte. Vivi tempo suficiente para ficar bem longe de confusão irracional ou impulsiva, mas existe um limite que não pode ser transposto, pois fere nossa consciência ética!

Começarei pela que batizei da ‘Falácia da Década’, que li em um fórum audiófilo de produtos ultra-hi-end, em que um participante escreveu: “Não se pode confiar nem no próprio ouvido, pois o produto que achamos perfeito hoje, daqui um mês não é mais”.

Junte essa falácia com os que defendem que não existe o certo ou errado, e que cada um escuta diferente do outro, e temos a tríade perfeita do discurso que deseja se tornar ‘popular’, e ser repetido infinitamente, até virar uma crença.
Observe amigo leitor, que a questão foi mal formulada pelo audiófilo, por isso sua conclusão é tão absurda. Se não conseguimos formular corretamente o problema, como achar a resposta?

O resultado narrado por esse audiófilo é correto. Se não soubermos o que precisamos buscar para escolher corretamente o sistema desejado, fatalmente daqui um mês (ou até menos tempo, se for um audiófilo hiper ansioso), estaremos arrependidos de nossa escolha.

Então onde está o erro?

Acharmos que por termos uma Audição, estamos prontos para decidir o que é ou não o melhor para nós.

Simples, meu amigo, e óbvio!

Nossos cinco sentidos precisam ser aprimorados por um longo período de nossa existência. E apenas ‘usá-los’ não irá ‘refiná-los’!

E pasmem, a audição necessita de muito mais tempo para ser aprimorada que a visão, ou o paladar, e o olfato!
Agora, o cidadão concluir que não pode sequer confiar em sua audição, por isso ele salta de equipamento em equipamento por toda uma vida, realmente merece o prêmio de Falácia da Década!

E, como todos os nossos cinco sentidos, a única maneira de lapidar nossa audição é criando Referências seguras que possam nos ajudar na escolha de cada setup que tivermos ao longo de nossas vidas.

E não existe outra maneira de lapidar nossa audição sem ouvir muita música não-amplificada, por longos anos.
Só assim você poderá falar em alta fidelidade.

Sem conhecer como soa um naipe de sopros, de cordas, percussão ao vivo, jamais será capaz de saber se aquele sistema que está ouvindo mantém alguma relação com a realidade ou não.

E ainda que você abomine instrumentos acústicos, ou os gêneros musicais que fazem uso desses instrumentos, saiba de uma vez por todas: o sistema que mantém uma fidelidade com instrumentos reais, também irá ser mais correto na reprodução de suas gravações feitas com samples e instrumentos elétricos e eletrônicos.

Aí entramos na segunda falácia, que voga em vários canais de ‘informação’: “que não existe certo ou errado na audiofilia”.

Como?????

Sugiro aos que defendem essa falácia que então criem outro nome para seu hobby, pois se não existe o certo e o errado, o termo alta-fidelidade não pode mais ser utilizado. Pois o termo expressa (sem chance de outra interpretação), que equipamentos hi-end têm como objetivo reproduzir o mais fidedignamente possível o que está gravado na mídia. E, portanto, se o equipamento não é fidedigno à gravação, ele não pode estar certo, ok?

E se ele for o mais fidedigno possível, ele está correto!

E os que alimentam essa falácia, não me venham com a desculpa que “não podemos saber como foi feita a gravação, pois não estávamos lá”! Pois, se tivermos gravações corretas como Referência, essa dúvida cai por terra em minutos. E gravações bem feitas, sem compressão, sem equalização e bem mixadas e masterizadas, temos de baciada!

Além de, no nosso caso, da revista, termos nossas próprias gravações e de inúmeros músicos que nos conhecem e que passaram a usar em seus trabalhos o mesmo cuidado na escolha dos microfones, cabos, prés, sem uso de compressão e equalização, e podem ser usadas com segurança por todos que queiram ajustar seus sistemas.

Então, meu amigo, quando disserem essa falácia de que não existe o certo e errado, balance os ombros e saia de banda!

Essa segunda falácia nos leva aos revisores críticos de áudio de diversas mídias que não possuem Referência e nem tão pouco nenhuma Metodologia, e atiram para todos os lados escrevendo conclusões como: “ainda que a caixa tenha várias limitações em sua resposta, gostei imensamente da caixa pela ‘conexão’ que ela me proporcionou com a música”.

UAU!!

Vocês sabiam que as áreas do nosso cérebro que ascendem e se conectam com outras partes são distintas quando ouvimos uma música que conhecemos, e isso nos remete a memórias positivas, e quando ouvimos músicas que nos agradam, mas não conhecemos?

Por isso que nos nossos Cursos de Percepção Auditiva eu sempre faço uma ressalva para que, no momento de uma avaliação de um produto, nunca usemos gravações que nos são muito ‘caras’ emocionalmente. Pois não vamos conseguir nos concentrar e focar no que precisamos realmente avaliar.

E que, no entanto, depois de feita a lição de casa, e se nossa escolha foi correta, ao ouvirmos nossos discos preferidos seremos surpreendidos com uma descarga emocional ainda mais intensa.

A minha pergunta a esse revisor que disse que, apesar das limitações, gostou da conexão com a música, é: o que isso realmente significa para quem está interessado no produto testado? Ele pode garantir que com qualquer gênero musical essa ‘conexão’ ocorrerá?

Perceba, amigo leitor, como é tudo tão vago e inconsistente, criando muito mais dúvidas do que esclarecimento.

No entanto, esse não foi o teste mais inconsistente que li nessa semana. Este outro é ainda mais ‘surreal’. O revisor leva uns oito parágrafos defendendo a escolha do fabricante por usar o material A no gabinete em vez de B, C ou D. Até aí, perfeito. Na sua defesa pela escolha ele enfatiza que o material escolhido é o único que realmente mata todo tipo de ressonância de gabinete, pois o grau de amortecimento dele impede que as reflexões, ao atingirem a parede atrás dos falantes, morram. E que com isso, ele teria conseguido o que todos os fabricantes de caixas hi-end objetivam, que é produzir sonofletores neutros.

Meu interesse ao ler toda essa argumentação só ampliou. Aí o revisor colocou as caixas para tocar em sua eletrônica de referência de estado sólido (um senhor setup em valor e performance), e o revisor não gostou do resultado. Achou que era falta de amaciamento, manteve as 200 horas pedidas pelo fabricante e, ainda assim, depois de toda a queima, não se deu por convencido. E o fabricante veio com a seguinte resposta: “Nossa caixas sempre trabalham melhor com valvulados”!

Parei de ler aí, caro leitor, pois toda a argumentação da escolha do gabinete e a tal da ‘neutralidade’ foi pelo ralo! Pois se um produto é neutro, ele não escolhe seus parceiros, ele cumpre sua função e ponto!

Passado o espanto, fui direto às conclusões e, pasmem, o revisor não questionou a ‘falsa neutralidade’, e ainda indicou a caixa para os que tenham eletrônica valvulada. O detalhe: não estamos falando de uma caixa de 2 mil dólares, e sim de uma bookshelf de 20 mil dólares!!

E a última falácia que vem ganhando espaço é a de que, como cada um escuta de uma maneira ‘única’, os testes são irrelevantes. E que a única maneira de se ter um sistema correto é ajustá-lo para sua curva de resposta pessoal. Essa eu já me debrucei em outros artigos, mas aos que não leram só acrescentarei que existem diferenças na forma de ouvir e elas podem ser maiores quando a audição ainda não foi lapidada.

Ainda assim, as diferenças são tão irrisórias que não se sustenta essa falácia da “curva de equalização pessoal”. Exceto, é óbvio, em casos de deficiência auditiva grave.

Então, não se preocupe se você escuta diferente do seu amigo audiófilo, ambos com a audição treinada irão reconhecer todos os instrumentos, perceber o equilíbrio tonal, as texturas, poder comentar a qualidade dos transientes, a qualidade do corpo harmônico, as sutilezas da microdinâmica e, até, se o sistema for de alto nível, as intencionalidades de cada gravação.

Se você nos lê por desejar ampliar seu conhecimento e andar com as próprias pernas, fique esperto, meu amigo, pois a proliferação de falácias e fake news está cada vez mais intensa.

E a única maneira de combater essa praga é questionando absolutamente tudo que você lê e escuta.

Meu pai me ensinou uma ‘máxima’, para sobreviver nesse tiroteio: “Quer saber o grau de conhecimento prático de um audiófilo e sua assertividade? Peça para ouvir o seu sistema!”

ATENÇÃO: MÚSICA UTILIZADA POR YOUTUBER, PARA AVALIAÇÃO DE CAIXAS. NO VÍDEO, A DISTORÇÃO NAO É NA CAIXA E SIM, NA PROPRIA MUSICA !!!!!!!

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