Espaço Analógico: TIPOS DE TRAÇÃO DO PRATO DO TOCA-DISCOS

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Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Uma nova seção mensal só sobre Toca-Discos de Vinil

O ‘tipo de tração’, ou ‘sistema de tração’ é, literalmente: o método eletromecânico que faz o prato do toca-discos girar.

E por que isso é importante? Porque esse sistema tem duas funções primordiais: 1) manter a velocidade o mais constante possível – para precisão tímbrica e rítmica, no mínimo. 2) ser o menos ruidoso possível, para que o barulho mecânico do equipamento não seja captado pela agulha que estiver tocando o disco, e que esse ruído do motor não seja vibração (a qual chegará de alguma maneira ao prato e ao disco). E que esse motor tenha um isolamento elétrico – e uma distância mínima do local onde a cápsula/agulha trafega – suficientes para não causar um ruído elétrico que seja audível na música por interferência captada pela cápsula.

Para tal, ao longo das décadas, três principais sistemas de tração foram (e muitos ainda são!) usados em toca-discos de qualidade. São eles:

TRAÇÃO POR CORREIA – BELT-DRIVE

A explicação deste é bem simples: um motor elétrico é ligado mecanicamente ao prato do toca-discos por uma correia (geralmente de borracha ou de silicone). O motor tem que ter sua velocidade perfeitamente (ou quase) controlada, para poder rodar o prato na velocidade correta e estável.

Um belt-drive mais comum tem o motor, via correia, acionando um sub-prato menor, sobre o qual o prato estará pousado ou encaixado – como acontece com muitos fabricantes conhecidos, como a Rega ou a Pro-ject, entre vários outros. Neste caso, o próprio motor fica escondido embaixo do prato, resultando em um design bastante limpo – porém são, em geral, toca-discos mais simples, porque o motor fica na mesma base que o prato e braço, o que pode gerar interferências.

Belt-drive com motor embaixo do prato

O segundo tipo mais frequente de belt-drive, tem a correia acionando a borda externa do prato, como os toca-discos MoFi, entre outros. Neste caso, o motor fica na área externa ao prato, e visível na base do toca-discos (no caso do MoFi, citado, a correia é cor laranja, o que dá para ver de longe em um toca-discos que é preto).

Especialistas, ao longo das décadas, puseram em discussão se o motor não passaria mais vibrações ao acionar o prato pela borda, em vez de acionar por uma área bem menor, no sub-prato.

Considero esse tipo de discussão infrutífera, pois existem belt-drives silenciosos e com velocidade estável com ambos sistemas.

Mas, uma ‘regra’ geral mais útil, diz que a velocidade é mais estável quando o prato é mais pesado, devido à inércia do mesmo ajudar a diminuir a oscilação da velocidade. Claro que existem excelentes toca-discos com pratos mais leves e velocidade bem estável – portanto, o projeto todo ajuda, e muito, como o material com o qual foi feito o prato, o material e tipo do rolamento do pino central do mesmo, assim como motores adequadamente projetados para acionaram esses específicos pratos, e para fazerem menos ruído ou vibração.

E, um terceiro tipo de design belt-drive, prefere que o motor fique em um gabinete separado, cuja posição no rack ou prateleira é acertada de acordo com o comprimento da correia. Este tipo, que evita vibrações ao máximo que pode, eu já vi acionando tanto o prato pela borda externa, quando um sub-prato – ambos com ótimos resultados.

Belt-drive com motor ao lado do prato

Os motores usados em belt-drive variam dos mais simples motores AC (alimentados direto pela rede elétrica 110/220v), até aqueles que são DC e usam um complexo circuito de controle e ajuste de velocidade – e às vezes essa caixa de controle é do tamanho de um amplificador! É preciso lembrar que, em áudio hi-end, ‘muito’ nunca é o suficiente…rs…

Praticamente todos os toca-discos baratos e simples são acionados por correia através de um motor AC – porque é mais barato e fácil de se implementar, mas quase sempre não têm a última palavra em matéria de precisão de rotação.

E, a maioria esmagadora do toca-discos hi-end são acionados por correia, corrigindo problemas de vibração do motor, acoplamento dele com a base, o prato e o braço do toca-discos, peso do prato e qualidade de seu rolamento, etc e tal.

Os bons belt-drive são: os muitos toca-discos no mercado há décadas.

TRAÇÃO DIRETA – DIRECT-DRIVE

A tração direta, como o nome já diz, é onde o motor é o próprio pino do prato. Ou, mais precisamente, o motor é – ou envolve – o rolamento do prato. Necessita, claro, de um excelente sistema de controle de velocidade, para poder funcionar direito – e um prato de grossura e peso decentes, assim como um bom rolamento, para que ruído mecânico e vibração não se transmitam pelo prato até a cápsula.

Motor direct-drive Technics

A pioneira no direct-drive foi a japonesa Technics, cuja maioria das implementações têm o motor separado em duas partes, com a bobina (que é a parte eletrificada do motor) estando fixa na base do toca-discos, e o magneto estando na parte móvel, ou seja, preso debaixo do prato. Desta forma, o motor só passa a ‘existir’ quando o prato está encaixado. Na maioria das outras implementações do direct-drive, por outras marcas, o motor inteiro está na base do aparelho, girando o pino central do prato, estando o prato ou não encaixado sobre ele.

A vantagem desse sistema é sua velocidade precisa e consistente. E, no som, isso se traduz em mais pegada e vivacidade, devido ao seu torque constante.

Durante uma época, a tração direta foi muito usada – inclusive e especialmente em toca-discos bastante simples e de plástico, nas décadas de 70 e 80. Era o japonês mostrando que era capaz de por tecnologia de ponta em economia de escala. Mas, aqui, o resultado não era dos melhores – assim como seus modelos semelhantes, em belt-drive, igualmente ocos e leves, também não davam os melhores resultados sonoros e de silêncio mecânico.

Claro que, durante toda essa época, existiram numerosos toca-discos direct-drive com bases decentemente sólidas, pratos mais pesados, grossos e amortecidos, de todas as grandes marcas japonesas – e todos esses estão entre os toca-discos mais silenciosos mecanicamente que eu já ouvi. E de performance excelente, também!

Um motor direct-drive

E isso me leva a crer que alguns dos direct-drive modernos sejam excelentes – pois, sim, existem várias marcas fazendo toca-discos desse tipo hoje, como a Technics e a Denon, entre outras. Assim como algumas marcas totalmente voltadas à audiofilia, como a americana VPI Industries, a alemã Brinkmann e própria Technics com seus modelos mais altos, verdadeiramente hi-end – que respeitam todos os princípios de isolamento, estrutura e ressonâncias de um toca-discos moderno.

Não existem tantos toca-discos hi-end com tração direta por causa da vilificação do sistema direct-drive (leia mais abaixo), que fez com essa forma ficasse décadas no ostracismo, sendo de desenvolvimento e implementação mais caros, entre outras questões.

TRAÇÃO POR POLIA – RIM-DRIVE / IDLER-DRIVE

O sistema de tração por polia é um dos mais antigos existentes – e que eu saiba não é mais usado faz tempo – exceto por uma solução híbrida com belt-drive, feita pela americana VPI, como um upgrade em alguns modelos.

Esse tipo de tração consiste de uma grande polia com borda de borracha, que é acionada por um motor: o motor encosta na polia, e a polia encosta em uma borda interna ou externa do prato, transferindo essa rotação.

Tem mais pegada que direct-drive, também por causa do alto torque que constantemente precisa impulsionar o prato. A força de uma boa tração por polia é tão forte, que se tem a impressão que é possível por um elefante sentado no prato, que a rotação será mantida.

Tração por polia na borda do prato

Porém, se não for muito bem implementado, com mecânica e base muito sólidas, e um prato bastante grosso e pesado com um bom rolamento, a tração por polia faz mais vibração e barulho que ladrão de panelas no meio da madrugada.

Vários toca-discos antigos usam esse sistema – alguns com bons resultados (modelos caros, duráveis, bem implementados e longevos), e muitos com ruído excessivo (modelos baratos, de baixa qualidade). Os bons: Garrard 301 e 401, e alguns modelos da Lenco.

Existe também um caso – que eu me lembre, único toca-discos originalmente projetado dessa maneira – que é o do Thorens TD124 (lançado em 1957 e que, até hoje, em bom estado e com um braço bom, é um excelente toca-discos), que usa uma tração híbrida: a polia, em vez de ser acionada pressionando-a contra o motor, sua rotação é obtida através de uma correia de borracha ligada ao motor. E, claro, para acionar o prato, essa polia, que é presa em uma suporte com uma mola, é pressionada contra a borda do prato (esta última parte como em qualquer tração por polia). Esse sistema um tanto ‘complicador’, parece ser de menor vibração e ruído que a polia sozinha.

O sistema híbrido da VPI (vide foto), é semelhante ao do TD124 acima em sua idealização. Mas a empresa criou-o, acho, para prover aos seus clientes a experiência da sonoridade da tração por polia, não para resolver problemas de vibração mecânica – os quais seus toca-discos não têm quando rodando no sistema belt-drive. Além disso, a implementação da VPI leva em conta todas as questões de localização e isolamento do motor, assim como da estrutura do toca-discos e da ressonância e isolamento de seu prato.

Tração híbrida no Thorens TD124

Sendo assim, é boa a ideia de se desenvolver hoje em dia um toca-discos com tração por polia? Tendo excelentes e silenciosos belt-drives e direct-drives, eu não acho nem um pouco necessário um idler/rim-drive.

BOBAGENS & INFORMAÇÕES ERRADAS

Como aparentemente tudo no áudio, os toca-discos de vinil também têm Mitos, Lendas e Bobagens sendo falados sobre eles – principalmente os direct-drive.

Alguém inventou que os direct-drive soariam ‘picotados’ aos ouvidos, devido à sua natureza de corrigir a rotação constantemente e muito rápido. A ideia é que a tração direta, ao usar pratos muito leves com seus motores de baixa rotação, a constante e muito rápida correção da rotação, acelerando ou desacelerando o prato se naquela fração de segundo ele estiver minimamente que seja fora da rotação, tornaria isso audível – apesar das mesmas pessoas dizerem que isso não é mensurável. O motor estaria constantemente brigando com o prato que quer desacelerar e, logo na sequência, brigando de novo porque acelerou. Bom, isso me soa como ‘procurar pêlo em ovo’, já que nunca notei isso nem em toca-discos direct-drive, nem nos bastante simples.

Aliás, um fabricante disse, em sua documentação, que isso seria extremamente simples de se resolver usando um prato de massa mais alta – que tem maior inércia, compensando essas supostas oscilações – auxiliado por um circuito de correção de velocidade mais suave e apropriado ao peso do prato.

Alguns dizem que essa história da carochinha foi inventada por ‘Teóricos Pouco Práticos’, décadas atrás, para denegrir o direct-drive – um produto plenamente japonês – à favor dos designs belt-drive plenos na audiofilia ocidental.

É interessante notar que não só os designs direct-drive bons atuais usam pratos pesados com circuitos de controle e correção de velocidade apropriados à eles, como também todos os grandes direct-drive japoneses da década de 70 e 80, aplicavam praticamente essa mesma ideia.

Uma bobagem semelhante – provavelmente vinda do mesmo tipo de fonte – diz que o direct-drive é mais barulhento porque não só o motor está logo abaixo do prato, como ele está diretamente acoplado ao mesmo. Acontece que o motor direct-drive roda em 331/3 RPM, contra um motor de belt-drive que roda a 300 RPM ou mais. Ou seja, a vibração mecânica, que se traduz em ruído, de um motor direct-drive é em uma frequência muito baixa – e muito abaixo do audível, e em um intensidade ínfima – se for minimamente bem implementado. Isso se aplica também a como esse motor é isolado eletricamente (haja visto que não me lembro de quase nenhuma cápsula nunca zumbir por proximidade ao motor de um toca-discos direct-drive).

Ao contrário, se você pegar toca-discos mais antigos – décadas de 70 e 80 – com bases e pratos leves, o ruído mecânico que passa para a cápsula, portanto audível, era notoriamente maior em um belt-drive do que em um direct-drive. Tanto que esses últimos eram procurados por seu silêncio de fundo.

Uma coisa que eu li em um site especializado em áudio: a Technics, poucos anos atrás, relançou sua linha de toca-discos direct-drive 1200 – aqueles utilizados por DJs no mundo inteiro, e também nos sistemas caseiros de muita gente, por ser quase indestrutível. As melhorias dos mesmos foram – acredite você – no amortecimento da base, em um prato melhor isolado e mais pesado, e em um sistema de controle de velocidade mais suave e bem bolado e que incluía um motor direct-drive mais avançado. Basicamente: o que precisava ser feito. Aí, ao anunciar esse relançamento, o tal site falou das mudanças dizendo “mesmo ainda sendo direct-drive, a Technics…”… Pressupõe-se que o articulista lava as mãos com creolina quando tem que mexer, apenas por obrigação, com desgosto, em um direct-drive. Lamentável bobagem!

E, a minha preferida de todas a Bobagens: que o direct-drive seria mais ‘bruto’ com os discos, tratando-os com mais força, fazendo-os com que se desgastassem e fossem mais danificados do que se usados em um belt-drive – o qual seria mais suave com os discos. Esse certamente consumiu substâncias controladas… Achar que, talvez, as correções mais frequentes em uma velocidade que já é perceptivelmente constante, criariam mais desgaste na superfície do disco, é assunto suficiente para essa pessoa perder o diploma – não importa em qual disciplina tenha se formado!

O QUE COMPRAR?

Falando apenas de toca-discos zero km, ou mesmo semi-novos (porque os antigos, os vintage, podem ser uma complicação de muitas maneiras, e é melhor não abordá-los agora) e seu orçamento for limitado, os belt-drive são claramente a melhor pedida: excelente resultado com preço decente.

Agora, se o intuito for adquirir um toca-discos mais avançado, hi-end, audiófilo – algo mais complexo e especializado – não se pode mais deixar de levar em conta os modelos direct-drive. Inclusive, meu toca-discos de sonho, hoje, é um direct-drive atual, que está em linha.

Dúvidas sobre vinil? Mande-nos um e-mail em: christian@clubedoaudio.com.br.

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