Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br
E cá estamos de volta, com os Discos do Mês, em mais um ano de nossas vidas. Outro dia alguém me falou que, por ficar tanto tempo em casa, nunca ouviu tanta música – e eu respondi que para mim não mudou nada nesse sentido. Tive que explicar, claro: enquanto clientes e conhecidos se orgulhavam de desfrutar de seus sistemas de áudio por 2 a 4 horas diárias, eu ouvia cerca de 6 horas diárias, às vezes até 8! Não tenham inveja! É só a questão do trabalhar com algo, como um funcionário de armarinhos que tem contato de 8 horas por dia com seus amados botões – ou dele e os do estabelecimento (rs…).
O mercado de música – assim como o comportamento dos ouvintes e compradores – é algo que está em constante mudança. Talvez gente de fora não veja isso, mas a gente aqui percebe, ao longo de poucos meses, o desfavorecimento de uma mídia, o favorecimento de outra, e até o crescimento de tecnologias até há pouco menos aceitas. Enquanto que em uma parte da Europa a pandemia mostrou aumento nas vendas de vinil, em outra parte do mundo, nos EUA, houve aumento na venda de música digital e no streaming. Considero este último o futuro de quem não tenha a aptidão ou o investimento necessário para o consumo de vinil – até porque o consumo continuado de CD é para poucos também, porque muitos discos novos e remasterizações interessantes só estão chegando a nós via sites de streaming de música. Esses estão se tornando essenciais, e a qualidade sonora do material disponibilizado neles, apesar de inconstante, já tem mais exemplos bons do que ruins (pelo menos para alguns gêneros musicais).
Falo que streaming é o futuro – e o presente da maioria dos audiófilos e melômanos – é porque ele se tornou a melhor e quase única opção. Comprar CD dos gêneros e artistas que nos interessam ficou caro e difícil de obter, sendo que tem quase tudo que se possa querer ouvir disponível nos serviços de streaming. O vinil vem em segundo lugar como um capricho – eu mesmo ouço 80% de streaming (incluo aí meus discos ripados no disco rígido) e 20% de vinil, que é comprado paulatinamente, escolhido à dedo por sua música e seu preço. Daí o porque eu sugiro, para os amantes e conhecedores do formato, comprarem vinil nacional (quando é bom) ou importado de boa estirpe – ambos usados. Um LP importado em estado decente pode ser encontrado por algo entre 50 e 100 reais (claro que existem oportunistas salgando o preço de discos usados de maneira pouco cristã). Um LP importado novo, da safra dos 180 gramas, custa qualquer coisa entre 200 e 400 reais, sendo que alguns vão até à 500 ou mesmo perto de 1.000 reais. Quem é o responsável? O dólar? A ‘extorsiva’ taxa de importação? Ganâncias e oportunismos? Resposta: de tudo um pouco, e de algumas coisas: um muito.
O que temos para hoje aqui no Discos do Mês? Primeiro, um disco autoral de world-music que é também uma trilha sonora, e um marco. Segundo, um disco de rock/folk de uma banda cheia de personalidade própria e musicalidade. Terceiro, uma linda trilha sonora, daquelas de ouvir repetidamente, provida por um trio de grandes músicos.
Vamos à eles:
Quem lê esta seção com frequência, sabe da admiração que eu tenho pelo cantor, compositor, arranjador e músico Peter Gabriel (daqui em diante denominado PG), e pela sua escolha dos músicos que o acompanham – facilmente entre os melhores do mundo – e pela sua filosofia de trabalho e criação.
Engraçado que, apesar da minha familiaridade com a primeira fase do grupo inglês Genesis, quando PG era o vocalista e Phil Collins apenas baterista, meu gosto pelo rock progressivo dessa época era mais pelo trabalho do Yes. Um dia, entretanto, quando eu já ouvia a famosa trilogia do King Crimson (Discipline, Beat e Three of a Perfect Pair), e era (e sou ainda) fã incondicional do trabalho do baixista Tony Levin nessa banda, descobri que ele era também o membro mais fixo de todos os tempos da banda do PG (acho que todos os discos, e todos os shows ao vivo, rs…). E lá fui eu entrar de cabeça na discografia de Peter Gabriel – coisa que eu não poderia deixar de fazer. Uncle Tony, como é chamado carinhosamente pelos amigos (eu, infelizmente, não sou um deles), é um daqueles músicos que segue o estilo que o nosso pundonoroso editor Fernando Andrette gosta de reafirmar: o do “menos é mais”, por seu estilo enxuto mas extremamente capaz e musical.
A propósito do “menos é mais”: Uncle Tony e PG são carecas há muitos e muitos anos, tanto que PG costuma dizer que “Tony e eu trabalhamos juntos desde que a Terra esfriou, e nós tínhamos cabelo”.
PG nasceu Peter Brian Gabriel, em 1950, na Inglaterra, de uma família de classe média-alta com uma certa tradição genealógica – já que um de seus antepassados, Sir Thomas Gabriel, foi prefeito de Londres em 1866. Ao frequentar a Escola Preparatória St. Andrews, chamou a atenção de seus professores pelo talento de voz, assim como começou a ter aulas de piano e, pelo interesse que teve a vida inteira por ritmos, começou a brincar com uma bateria aos 10 anos de idade.
PG tem uma das melhores vozes que eu já ouvi no rock – e é célebre por isso, principalmente. O lado de grande compositor e arranjador é menos conhecido, já que seus sucessos comerciais, como parte do Genesis e nas faixas de seus discos solo que tocaram nas rádios e na MTV, são todos enfatizados em seus talentos vocais. Como eu acho que você pode lapidar, mas não pode ensinar talento, eu digo que os grandes já nasceram grandes, e muitos grandes músicos têm pouco ou nenhum treinamento formal. O próprio PG, ao receber de uma tia o dinheiro para tomar aulas de canto profissional, gastou o dinheiro comprando o disco Please Please Me, dos Beatles. Dinheiro muito bem gasto! rs…
Em 1963, PG foi estudar na tradicionalíssima escola Charterhouse, para meninos de 13 anos em diante, onde tocou em vários grupos de estudantes, inclusive bateria e vocais em um grupo de jazz. Entre 65 e 67, travou contato com outros colegas de escola: o tecladista Tony Banks, o guitarrista Anthony Phillips, e o baixista Mike Rutherford – que juntos acabaram formando o Genesis e tomaram o mundo, com a eventual ajuda de Phil Collins na bateria, o único que não era da escola. E o resto é história… Claro que PG, querendo seguir seus próprios caminhos musicais e criativos, saiu do Genesis em 1975, e iniciou uma carreira solo que perdura até hoje.
Passion é o primeiro disco lançado no selo próprio do músico, o Real World Records, criado por PG para a gravação e divulgação de músicos de world music, assim como passou a ser o selo de todos seus subsequentes discos. O acesso a esses artistas se deu pela fundação por PG do festival WOMAD – World of Music, Arts & Dance – que ainda hoje está em atividade, trazendo música do Oriente Médio, África e Ásia.
Este disco é, ao mesmo tempo, a trilha sonora do filme A Última Tentação de Cristo, do cineasta americano Martin Scorsese, e é também um marco na popularização da world-music que chegou até a ganhar um Grammy de Melhor Disco de New Age em 1990 – acho que é porque não tinha melhor categoria para entrar… O disco poderia ter como título ‘trilha sonora do filme’, mas na verdade PG passou meses depois do filme trabalhando em cima do disco, resultando em um trabalho completo e complexo, um dos melhores de um mestre. Tanto que saiu em vinil duplo.
O filme em si gerou uma quantidade inominável de polêmicas, desviando da narrativa bíblica, sendo taxado de blasfemo, irritando a Igreja Católica e a comunidade cristã, e sendo proibido em vários países. Mas, passou… Todo mundo passou um pouco de merthiolate, assoprou, e todos sobreviveram. Eu mesmo não assisti o filme, e nem vou debater méritos, nem do diretor Martin Scorsese, nem da comunidade cristã. Meu negócio é a música!
Vale citar aqui também a beleza da arte de capa desse disco – realmente fora do comum. O crédito vai para o pintor Julian Grater, com a composição Drawing study for Self Image II.
O enorme time de músicos usados em Passion traz membros fixos de sua banda, e conhecidos músicos de primeiro time e de estúdio – como o guitarrista David Rhodes, o baterista Manu Katché (Joe Satriani, vários discos do catálogo da ECM), o percussionista e baterista Manny Elias (Tears For Fears), o vocalista David Sancious (Bruce Springsteen), o baixista Nathan East (Eric Clapton, Phil Collins, Chick Corea), o baterista Billy Cobham (Mahavishnu Orchestra), o trompetista Jon Hassell (Talking Heads, Ry Cooder), entre outros.
A gravação traz também – e ajudou a promover no ocidente – nomes da música étnica e world-music como o violinista L. Shankar, o guitarrista e cantor Baaba Maal, o cantor Youssou N’Dour, e o vocalista Nusrat Fateh Ali Khan. O disco também conta com a participação do percussionista brasileiro Djalma Correa, em uma faixa –
e o Wells Cathedral Boys Choir, em uma faixa coral, a única sem uma sonoridade ‘de deserto’, ‘de oriente médio’, mas totalmente apropriada à temática do filme. Essa faixa e seu coral evoca bem o tom religioso, sacro, o que contrasta com o tom blasfemo da cena e de boa parte da temática do filme – e isso levou o diretor Martin Scorsese a não usá-la no filme, para não gerar mais controvérsias, já que ele já havia até recebido ameaças de morte antes mesmo do filme sair. Mas está neste disco, e é o que importa!
O próprio PG, além de compositor, arranjador e arregimentador, não passa o disco sentado na cadeira, não. Praticamente todas as faixas tem sua participação ativa, tocando uma variedade de instrumentos, desde teclados, percussão, vozes, flauta e baixo. Aliás, o processo criativo de PG é longo, e caracterizado por interação profunda com seus músicos, e isso é claramente espelhado em como é seu estúdio. O Real World Studios foi construído ao lado da própria casa do músico, trazendo uma sala de controle enorme, onde 90% das gravações são feitas com os músicos, produtor e engenheiro de som, todos na mesma sala, sem vidros ou divisórias – PG considera essa interação essencial!
Atenção especial deve ser dada às faixas The Feeling Begins, e Zaar, entre outras.
Pode ser encontrado em: CD / SACD / Vinil / Download / Serviços de Streaming selecionados. Para os amantes do CD, a prensagem européia é muito boa! Assim como deve ser a prensagem em CD japonesa. Em algum momento, o disco também foi lançado em Super Audio CD, bom para os fãs de tecnologias obscuras (hahaha…). Este é um disco que foi lançado na ótima prensagem brasileira, em vinil duplo – e também saiu em tudo quanto é lugar do mundo, mas não consegui informações dele ter sido lançado no Japão em vinil, por incrível que pareça, só em CD. E, também, já foi relançado na era do vinil de 180 gramas – mas os preços devem ser proibitivos. Claro que diria que as melhores opções, havendo dinheiro e disponibilidade no mercado, são a prensagem em vinil inglesa ou a americana. E, claro, em terceiro lugar, o vinil nacional que é bem bom. A versão em streaming também está bem legal.
Na segunda metade da década de 1990, eu já travava contato com sistemas, caixas e aparelhos que tinham um ‘algo mais’, diferentes de muito do que hoje chamamos de equipamentos consumer, de marca comum – e, muitos, de resultado sonoro abaixo da linha do ‘comum’. Essa tal dessa audiofilia tinha me mordido, e tinha criado também um interesse em gravações de maior qualidade – e o crescente discernimento entre as banais e as boas. E já existiam alguns lugares onde se comprar CDs selecionados por essas características.
Nessa época eu, zapeando na TV à cabo, topei com um clipe cuja música me chamou muito a atenção: Ants Marching, a faixa de trabalho de uma nova banda americana, recém surgida, chamada Dave Matthews Band, com uma sonoridade de ‘rock/folk’, ‘alternativo’, ‘blues-folk’, mas com elaborações que evocavam o jazz. O som da banda é assim difícil de definir porque eles não soam como outras bandas, eles soam como Dave Matthews Band!
O clipe era bem feito, mas a música era sensacional. Estava clara a altíssima qualidade de seus músicos e do arranjo. Eu já saí salivando para conhecer o resto do trabalho da banda – afinal, na época existiam poucos discos de rock com qualidade de som boa, devido ao uso indiscriminado de compressão, e de processamento multipista durante a gravação, mixagem e masterização.
Em umas das lojas de discos ‘bons’ que eu frequentava, achei este CD: Under the Table and Dreaming, do Dave Matthews Band (daqui pra frente abreviado DMB). O resultado? A compra posterior de todos os discos da banda, assim como os discos independentes que eles haviam lançado antes de assinar com a RCA. E, em 1998, fui ver um dos melhores shows ao vivo que já vi: DMB no Free Jazz Festival, nas tendas do Jockey Club de São Paulo! E para uma tenda, o P.A. estava felizmente bastante bem feito, e eu pude assistir bem perto do palco.
O violonista, compositor e produtor David John Matthews nasceu em 1967 em Joanesburgo, na África do Sul, e passou a sua infância e adolescência entre esse país, o Reino Unido e os EUA. Em 1985, para evitar o serviço militar obrigatório da África do Sul, o pacifista convicto Matthews mudou-se para Nova York e, depois para Charlottesville, no estado da Virgínia, onde sua família já havia morado, e onde foi trabalhar como barman. Em 1991 ele foi encorajado pelo amigo Ross Hoffman a levar uma demo de suas canções à um baterista de jazz da cena local, chamado Carter Beauford (que depois foi eleito pela revista Rolling Stone como o décimo melhor baterista de todos os tempos) e também o saxofonista LeRoi Moore (do John D’earth Quintet). Depois, Matthews diria que não foi atrás de Beauford e Moore porque estava desesperado atrás de um baterista e um saxofonista, e sim porque ambos eram os melhores que ele já havia ouvido!
O passo seguinte, por recomendação do amigo John D’earth, regente da Orquestra da Universidade de Virgínia, veio o baixista Stefan Lessard. O último a se tornar membro permanente do DMB veio somente no ano seguinte, 1992: o violinista Boyd Tinsley, amigo de LeRoi Moore. Matthews precisava de um violinista para a faixa Tripping Billies, e Tinsley não só caiu como uma luva, como também casou perfeitamente com a sonoridade da banda – e ficou.
Eu diria que o DMB é uma banda ‘ao vivo’, e que eles soam brilhantes musicalmente em qualquer um de seus discos ao vivo – sendo que, de 2000 à 2010 foram a banda que mais vendeu ingressos e mais faturou nos Estados Unidos da América! Isso além de terem sete álbuns de estúdio consecutivos em primeiro lugar na parada da Billboard! E, como alguém que os viu ao vivo, e que já ouviu praticamente todos os seus discos e DVDs, eu posso falar: eles soam igualmente coerentes e entrosados no estúdio, o que me leva a crer que a maior parte da performance deles em discos de estúdio é gravada com todos os músicos tocando juntos. Mas, isso pode ser só impressão minha.
Os anos seguintes trouxeram o sucesso como banda ao vivo, e logo lançaram o disco Remember Two Things em 1993 e, no ano seguinte, Recently, ambos discos de produção independente.
Recently, aliás, tem um cover de All Along the Watchtower, de Bob Dylan, de tirar o fôlego até de quem faz mergulho livre.
Em 1994, já assinados com a RCA, veio Under the Table and Dreaming, e a DMB tomou o mundo de assalto, seja por disco, pela MTV, pelas rádios, ou pelos shows ao vivo. Inclusive esse sucesso fez com que eles viessem ao Brasil tocar no Free Jazz Festival. Abriram com uma versão de 23 minutos de uma de suas faixas, cheia de improvisos – acho que porque estavam vindo a um festival de jazz (pelo nome). Não sabiam que o público (e as atrações) do Free Jazz eram mais ecléticos do que imaginaram. Claro que os público delirou. Mas Matthews, no violão e vocais, hesitou mesmo quando o público começou a cantar junto faixas de discos que não tinham saído aqui, ou não tinham saído ainda! Isso ficou claro no rosto dele: bela e feliz surpresa! Esses são os brasileiros, meu amigo, quando são fãs de algo: um dos melhores públicos de shows ao vivo do mundo.
Destaque para as faixas Warehouse, e Dancing Nancies – muito boas, em um disco que vale a pena ser ouvido inteiro!
Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de streaming selecionados. Gosto bastante desse CD, que eu adquiri na época que saiu. O vinil eu nunca ouvi ou sequer peguei na mão – até porque ele só saiu em em 2014, já na era do 180 gramas e à preços de ouro puro (dever ser isso, então: o disco vende bem e vira “Disco de Ouro” e começa a ser vendido por ‘preço de ouro, então é melhor comprar antes de virar ‘Disco de Diamante’ rs…). Eu fico feliz com o CD, que está armazenado ripado no meu disco rígido, e com o que está disponível no streaming, que é razoavelmente decente.
Para uma geração que vê filmes e ouve trilhas sonoras desde que o primeiro filme de Star Wars saiu em 1977, o nome de John Williams é um dos mais conhecidos do universo. Vale dizer que, inclusive, Star Wars é conhecido por ter sido um dos primeiros (ou um dos mais famosos) filmes a fazer da trilha sonora um personagem do filme, dando um tom todo especial ao mesmo – e não dá pra pensar em Star Wars sem a trilha de John Williams.
Para refrescar um pouco a memória, temos numerosas trilhas fenomenais compostas por ele, como: Caçadores da Arca Perdida, Superman, Parque dos Dinossauros e Harry Potter. E algumas de suas trilhas funcionam muito bem musicalmente, ‘fora do filme’, como peças musicais.
Não sou o maior fã dele no planeta Terra, e tem algumas de suas trilhas que não me dizem nada – então acabei por travar contato com a trilha do filme Memórias de uma Gueixa (Memoirs of a Geisha), de 2005, apenas recentemente. E fiquei de queixo caído – é um de seus trabalhos mais inspirados e bonitos, e que frequentemente aparece nas listas de melhores discos audiófilos, tanto em CD como em vinil.
Veja, Williams recebe críticas ferrenhas, durante toda sua carreira, pelo quanto ele se inspira na sonoridade de compositores clássicos como Wagner, Korngold, Tchaikovsky e Stravinsky. Por ‘inspira’, quero dizer: em alguns trechos de suas trilhas, você fecha os olhos e diz que aquilo foi composto por algum desses quatro, portanto a ‘inspiração’ às vezes é um pouco ‘pesada’. Isso não me incomoda, na verdade, porque a maioria das trilhas dele que eu gosto são bastante originais em sua sonoridade. E para não levarmos ‘à ferro e fogo’, lembremos que os primeiros concertos para piano de um dos maiores compositores de todos os tempos, Beethoven, soam profundamente como se fossem obras de outro dos grandes compositores de todos os tempos: Mozart. Então, eu me recosto com o meu café na mão, e ouço com prazer a música que eu achar bonita, que me agradar, que mexer comigo, seja ela de Ludwig van Beethoven ou de John Towner Williams.
O filme Memórias de uma Gueixa, que é uma produção grandiosa, com aspirações ao Oscar (ganhou Melhor Fotografia, Direção de Arte, e Figurino), com o grande orçamento de US$ 85 milhões e a produção de Steven Spielberg, foi vítima de algumas controvérsias, como elencar atrizes chinesas para fazerem o papel de gueixas japonesas, e por focar mais no visual do que na verossimilhança e profundidade históricas. Mas é um belo filme!
Uma das menos faladas trilhas de Williams, esta obra traz a participação de dois solistas, o que já dá uma enriquecida na sonoridade. Só que a riqueza é ainda maior quando esses solistas são ninguém menos que o mundialmente conhecido cellista chino-franco-americano Yo-Yo Ma, e o violinista israelense, radicado nos EUA, Itzhak Perlman – ambos do primeiríssimo time da música clássica mundial. É quase impossível um desses fazer um disco ou uma apresentação ruim, pra não falar da tremenda musicalidade de ambos. Yo-Yo Ma é um dos mais ‘populares’ e conhecidos intérpretes de música clássica, e Perlman, hoje com 75 anos, já era brilhante e recebia aclamação pública em 1969, ao tocar o quinteto The Trout (A Truta) do compositor austríaco Franz Schubert, um dos pilares do repertório de música de câmara, com outros nomes que permaneceram gigantes até hoje: a cellista Jacqueline du Pré, o violinista Pinchas Zukerman, o pianista (e hoje maestro) Daniel Barenboim, e o contrabaixista (e hoje também maestro) Zubin Mehta. Uau…
John Towner Williams, com uma carreira de músico, e depois compositor, que começou nos anos 50, nasceu em 1932 na cidade de Nova York, filho de um baterista de jazz. Após estudar música na Universidade da Califórnia em Los Angeles, Williams estudou composição diretamente com o pianista e compositor italiano Mario Castelnuovo-Tedesco e, em 1955, de volta à Nova York, ingressou nos estudos de piano com a pedagoga Rosina Lhévinne na prestigiosa Juilliard School of Music. Um de seus primeiros empregos foi ser músico de sessão para o compositor de trilhas Henri Mancini, tendo participado de trilhas como a da série de TV Peter Gunn – e acabou permanecendo no negócio, e sendo extremamente bem sucedido no mercado de trilhas sonoras.
Com a composição e regência de John Williams, e a musicalidade de Yo-Yo Ma e Itzhak Perlman, o álbum Memoirs of a Geisha ganhou o Golden Globe de Melhor Trilha Sonora – o quarto prêmio Golden Globe da carreira de Williams.
O destaque especial vai para as faixas Becoming a Geisha, e A New Name…A New Life, e para quase todo o resto deste belíssimo disco.
Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de Streaming selecionados. O CD e o streaming são muito bons – discos de gravação moderna da Sony Music, com artistas top, têm sido muito bem feitos. Depois descobri que havia saído, em 2016, uma famigerada prensagem em vinil de 180 gramas, que virou um dos meus objetos de desejo.