Discos do Mês: NEW AGE, PROGRESSIVO ELETRÔNICO & TRILHA SONORA

AUDIOFONE – Editorial: OUÇO MÚSICA APENAS NO CELULAR, PRECISO INVESTIR EM UM BOM FONE?
abril 15, 2021
PLAYLIST DE ABRIL
abril 15, 2021

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Várias vezes, quando eu ainda tinha a paciência de escrever em fóruns de áudio e música na Internet, diálogos chegavam em um ponto onde ficava claro que alguns audiófilos não têm nenhum tipo de Metodologia ou de Referência. ‘Audiófilos’ são aqueles que gostam de ouvir a música com a maior qualidade sonora que for acessível à eles. Ou pelo menos, assim deveria ser (o termo ‘audiófilo’ não faz julgamento do gosto ou nível de interesse musical).

Isso virou uma espécie de chavão pra mim, onde fica claro que para ser audiófilo (de acordo com a definição acima) torna-se necessário ter esses dois itens: Metodologia & Referência – e acho que vou fazer uma camiseta com isso na frente.

Como alguém poderia julgar qual é o melhor hambúrguer, sem ter uma referência sobre o que é um bom hambúrguer? Como alguém pode avaliar um hambúrguer frente à sua referência de qualidade, sem usar alguma metodologia? Talvez ‘avaliando’ que os dois tenham o mesmo tamanho? Ou o prato em que foi servido é do mesmo tamanho? Ou seja, as pessoas com pouca informação ou estudo sobre algo, tendem a ver a coisa pelo ponto de vista quantitativo (no caso, o tamanho) e não pelo qualitativo (origem da carne, temperos, como foi cozido, etc). Os hobbies de ‘qualidade’ precisam de empenho, estudo e dedicação – e isso dá trabalho! E ninguém gosta de admitir que não sabe – o que me leva a pensar como é que as pessoas se iniciam em qualquer coisa que seja, se acham que já nascem sabendo…

Agora, vocês me perguntam: por que falar isso na abertura de um texto sobre Música? Bom, aqui é que eu ‘piso em ovos’ um pouco, simplesmente por não tentar entrar no julgamento da especificidade do que os audiófilos ouvem. Eu mesmo ouço, como já disse antes, várias coisas que estão longe de serem as mais ‘eruditas’ (por motivos sentimentais), mas me guio e procuro guiar os outros a sempre procurar entender música, aprender e lapidar. Afinal, se seu hobby é ouvir sua música favorita com qualidade sonora, então não é melhor ouvir cada vez mais Música de Qualidade, não?

Falo isso porque sempre acompanho alguns fóruns, avaliações, reviews, blogs, etc. E sempre que vejo algum disco ou artista com que não tenho familiaridade, procuro ouví-lo. E fico bestificado como tem porcaria sendo ouvida por aí – desde banalidades mal compostas e mal tocadas, até barulho puro e óbvio sob qualquer classificação possível, até gravações com qualidade sofrível, que alguns reviewers insistem em usar para suas avaliações, incorrendo em erro, ‘apoiados’ pela ideia de deve-se avaliar o equipamento com aquilo que se gosta de ouvir… Mas, amigo leitor (o Fernando Andrette me paga uma coxinha toda vez que eu uso essa frase), ninguém no mundo jamais conseguiu fazer um bom hambúrguer com carne sebenta de terceira, conseguiu? Então qual é o sentido de avaliar sistemas e componentes, ou até mesmo de usufruir do melhor equipamento, ouvindo discos ruins e mal gravados?

Tudo que é disco sugerido por gente da audiófilia têm que ser produto de dois critérios, na minha reles opinião: 1. Decente qualidade sonora, porque ninguém quer ouvir gravações ruins (ou, pelo menos, não deveriam querer…), e 2. Que tenha decente qualidade musical. E, ainda, meu esforço aqui nesta coluna é e sempre será de sugerir discos que seguem esses dois critérios. Nada de discos com 60 minutos de rádio fora de sintonia – outros músicos mais ‘gabaritados’ já tentaram isso antes, e não foram bem sucedidos. Não quando o critério é qualidade ‘Musical’…

E o que temos, então, no cardápio de hoje? Primeiro, um disco de “new age” quase jazz, acústico, gravado ao vivo no Festival de Montreux. Segundo um disco de rock progressivo eletrônico com um grande mestre aliado à uma das mais conhecidas vozes do progressivo. E, para finalizar, uma trilha sonora obrigatória para os amantes do gênero.

Vamos à eles:

Darol Anger & Barbara Higbie Quintet – Live At Montreux (Windham Hill, 1985)

Meu primeiro contato com a gravadora Windham Hill se travou, acredite, no som ambiente de um restaurante e empório, em uma cidade turística, na segunda metade da década de 80. Era uma coletânea chamada Windham Hill Records Brasil 1987, com a magnífica faixa On The Threshold of Liberty, do trompetista e compositor Mark Isham. Me chamou a atenção que, no restaurante, em um microsystem tocando a versão cassete do disco, a qualidade de som era muito interessante, além da música, claro. Tive depois essa coletânea em vinil, e em CD, e daí pra frente vários discos desse excelente selo – os quais fui garimpando ao longo dos anos em sebos de vinil. Tá vendo como as coletâneas funcionam? E o gerente do restaurante é meu amigo até hoje.

Windham Hill é da época que aquilo que foi chamado de ‘New Age’ ainda não era o estigma de ‘eletrônico sonífero’, de etéreo, de ‘inofensivo’ – pelo contrário! A maioria esmagadora do repertório da gravadora nada tem de eletrônico. Às vezes eu acho que alguém dentro das grandes gravadoras e distribuidoras ouvia cinco minutos dos discos, em um três-em-um, não sabia definir qual a categorização, qual a origem daquela música, achava ela diferente ou estranha, e jogava em uma dentre duas caixas de papelão: se fosse barulhento, ia pra caixa escrito ‘Alternativo’. Se não fosse barulhento, ia pra caixa com a etiqueta ‘New Age’. O problema é que, junto com as coisas boas de New Age, naquela caixa também foram parar discos bizarros, tipo triângulo solo tocado em cima de um monociclo no pico das pirâmides, no solstício (permitia lançar quatro discos quase iguais por ano, um para cada solstício – todos ouvidos à exaustão em salas de espera de fábrica de incenso). E isso vendia pacas durante uma época!

O selo Windham Hill foi fundado em 1976, como um hobby, pelo músico e produtor Will Ackerman e sua namorada Anne Robinson, trazendo o que foi chamado por muitos de ‘música para uma vida calma’. O próprio Ackerman afirma que o caminho musical que o selo tomou não foi proposital, mas que os artistas acabaram trazendo um tipo de música folk e instrumental mais suave – a começar do primeiro disco do selo, o álbum de violão acústico In Search of the Turtle’s Navel, do próprio Will, que inaugurou o selo. Ackerman depois declarou que “Não estávamos tentando vender alguma filosofia ou vender óleo de patchouli, estávamos apenas tentando vender música”. A explosão de sucesso veio nos anos 80, sendo que a célebre loja de discos americana Tower Records chegou a ter uma seção exclusiva para os discos da gravadora. Querendo se dedicar mais à música, Ackerman vendeu a Windham Hill para o grupo BMG em 1992, e a distribuição do selo passou depois da asa da BMG para a Sony Music – e, que eu saiba, hoje o selo é só ‘catálogo’, não lança mais nada há mais de uma década.

Anos atrás, encontrado em um sebo, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, comprei o vinil nacional lacrado do disco, selo Windham Hill, Live in Montreux com o quinteto composto pela pianista americana Barbara Higbie (que já tocou com o Kronos Quartet), o violinista americano Darol Anger (que tocou com Stephane Grappelli, Béla Fleck e faz parte do Turtle Island String Quartet), com Mike Marshall no bandolim, Todd Phillips no contrabaixo acústico, e Andy Narell no steeldrum (tambor de aço). Formado no início da década de 80, depois de tocar no Festival de Montreux de 84, o grupo acabou durando até 1990.

Darol Anger & Barbara Higbie Quintet

Definir o estilo da música desse quinteto é mais ou menos como pedir uma ‘vitamina’ batida na hora, no balcão de alguma padaria: vai leite, mas as frutas que vão dentro dependerão do humor do departamento de compras da padaria. É tudo fruta, mas é variado (no caso da vitamina). Chamado por aí de jazz, world, folk, country e até fusion, o disco foi, portanto, classificado como New Age – ação fácil, já que o selo Windham Hill estava em alta, e se eles lançassem um disco de heavy metal, o mesmo iria para as prateleiras de New Age. É um disco bonito, bem tocado, suave, ‘sonhador’ e introspectivo – e muito bem gravado!

Nos primeiros discos da Windham Hill, a gravadora tinha um certo orgulho da qualidade de suas gravações, ao ponto de escrever no encarte de alguns que eles eram gravados com, normalmente, dois microfones de alta qualidade – a conotação era claramente audiófila. Aqui no disco Live in Montreux, eles não fazem a mesma propaganda. Mas, não se preocupem, o disco é muito bem gravado, no mesmo alto padrão de sempre do selo.

Atenção especial deve ser dada às faixas The Lights in the Sky Are Stars, e Brann St. Sonata, entre outras.

Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de Streaming selecionados. Como tudo da Windham Hill é bem gravado, o CD é muito bom e o streaming está bem decente pra ouvir. A grande sacada aqui é achar o disco em vinil, o LP. Bom, por ser um disco de 1985, a muito boa prensagem nacional está disponível em boas quantidades – e pode facilmente ser encontrada em perfeito estado no Mercado Livre por preço de almoço em lanchonete. Tem uma dúzia de exemplares baratos para vender lá por preços próximos de 30 e poucos reais – e tem um vendedor que pede 158 reais (e não dá pra saber nem se é importado ou não) e outro que declarou o vinil nacional como “raro”, tirando da cartola dele em um domingo no parque, e está pedindo 755 reais (lembrem-se que, do tal disco ‘raro’ tem uma dúzia pra vender, e barato, no mesmo mercado). Claro que os mais dedicados poderão garimpar em sebos, ou ter a sorte de alguém trazer de fora, e porem suas mãos em uma prensagem americana, europeia ou, queiram os deuses: japonesa! Não achei informações sobre prensagens atuais, em 180 gramas.

Ouça um trecho da faixa “The Lights in the Sky are Stars”.

Jon And Vangelis – Short Stories (Polydor, 1980)

Lá para a época do final da década de 70 e começo de 80, um comercial de TV extremamente bem feito, para a marca de cigarro ‘baixos teores’ Advance, trazia a música Pulstar, do mestre da música eletrônica Vangelis (do disco Albedo 0.39, de 1976). Na mesma época, a TV brasileira passou, aos domingos, os episódios da maravilhosa série documental Cosmos, do cientista, físico e astrônomo americano Carl Sagan – esta série usava na abertura uma das melhores faixas do tecladista grego: Heaven and Hell, 3rd Movement (do disco de mesmo nome, de 1975).

Até hoje eu não me lembro qual dessas eu ouvi primeiro. Mas lembro que a música de Vangelis se tornou uma das que mais interessava meu pai – que a vida inteira foi um aficionado e um entendido de música clássica. Vangelis era um dos poucos extras que ele gostava de ouvir. E eu também!

Nessa época que eu comecei a ouvir muito a banda inglesa de rock progressivo Yes, cortesia de um vizinho mais ou menos da minha idade, cujo irmão mais velho nos educou com rock progressivo, como Yes, Triumvirat e, também, o tecladista francês Jean-Michel Jarre. Até hoje, junto com a base que tive em casa de música clássica, prevalece como favorito o gosto pelo rock progressivo de todos esses e vários outros artistas – e vários seguidores, herdeiros e vertentes do mesmo.

O contato com o Yes trouxe a admiração pela bela voz de seu vocalista, Jon Anderson, nascido John Roy Anderson, em 1944 na região de Lancashire, na Inglaterra, descendente de escoceses e irlandeses. Com um nome que foi uma homenagem dos pais a um cantor inglês chamado “John Roy the Melody Boy”, Anderson chegou a trabalhar em uma fazenda, como motorista de caminhão, entregador de leite, e até tentou ser jogador de futebol – uma paixão desde a tenra idade. Seu talento para o canto o levou a participar de várias bandas de sua região, chegando a viajar pela Europa com algumas delas, chamando a atenção da mídia especializada. Em 1968 fez uma amizade com Jack Barrie, dono do clube La Chasse, em Londres, e que depois o apresentou ao baixista Chris Squire. Logo começaram a compor juntos, e a agregar os outros membros do que se tornou uma das mais famosas bandas de rock progressivo da história, o Yes.

Em 1974, o célebre tecladista Rick Wakeman anunciou sua saída do Yes, para cuidar da carreira solo. Anderson, que já era fã do trabalho do tecladista grego Vangelis, o convidou a vir até a Inglaterra, para fazer uma audição com a banda, para substituir Wakeman. Aconteceu que Vangelis teve dificuldades de obter visto para trabalhar na Inglaterra, e também sempre foi reticente em sair em turnês ao vivo, ainda mais com uma grande e famosa banda. A vaga acabou sendo preenchida pelo tecladista suíço Patrick Moraz.

Evángelos Odysséas Papathanassíou nasceu em Agria, na Grécia, em 1943, e começou a se interessar claramente por música aos 4 anos de idade, quando começou a brincar com o piano da família, e a usar a panelas da cozinha como percussão. Sua família então o pôs para ter aulas de música aos seis anos, mas Vangelis não se adaptou, preferindo fazer as coisas do seu jeito – o que o fez desenvolver uma técnica própria e ser um músico autodidata, desenvolvendo excelente memória musical. Até hoje ele agradece não ter tido lições de música, porque considera que isso teria travado sua criatividade. Dividindo sua afinidade entre a percussão e o piano, ele descobriu na adolescência o jazz e o rock, adquiriu um órgão Hammond B3 e começou a formar bandas no colégio, sendo a mais célebre chamada The Forminx.

Com o fim do Forminx, Vangelis trabalhou em estúdios, compondo e produzindo artistas gregos, até 1968, quando a situação na Grécia estava muito complicada política e socialmente, graças ao golpe de 1967. Vangelis tentou ir para Londres, mas não conseguiu visto, e acabou passando até 1974 em Paris, onde formou a banda de rock progressivo Aphrodite’s Child, com expatriados gregos, como Demis Roussos, Loukas Sideras e Anargyros Koulouris – e tiveram vários discos e vários sucessos, como Rain and Tears, It’s Five O’Clock, e o disco 666. Vale dizer de a sensacional voz de Demis Roussos era um dos grandes chamativos do Aphrodite’s Child, o que me leva a pensar de ele depois sofreu de ‘Síndrome de Roberto Carlos’, partindo para gêneros musicais bem menos eruditos que o rock progressivo, indo assolar rádios de sala de espera de consultórios médicos, juntamente com Ray Conniff e o citado ex-expoente da Jovem Guarda brasileira, rs…

Desentendimentos levaram ao fim do Aphrodite’s Child, e Vangelis entrou de cabeça em sua carreira solo, com trilhas de filmes e trabalhos instrumentais e experimentais. Uma carreira que dura até hoje! Com destaques internacionais, como o Oscar pela trilha sonora de Chariots of Fire, a magnífica trilha de Blade Runner, e a obra sinfônica coral Mythodea, que a NASA usou como música oficial para sua missão Mars Odyssey, em 2001, e resultou em um concerto ao vivo na Grécia, com orquestra, coral, percussão, as sopranos Kathleen Battle e Jessye Norman e, claro, Vangelis nos teclados, com cara e jeitão de Papai Noel. Esse concerto existe em DVD.

Apesar da negação de Vangelis em assumir o cargo no Yes, a amizade entre ele e Jon Anderson manteve-se. Tanto que, em 1975, quando Vangelis mudou-se da França para Londres, onde montou seu estúdio, o Nemo Studios (que ele chamava de “Laboratório”), Anderson contribuiu com os vocais na faixa So Long Ago So Clear, do disco Heaven and Hell, e tocou harpa no disco Opera Sauvage, de 1979. E, finalmente, ainda em 1979, fizeram o primeiro de quatro discos juntos, sob o nome Jon And Vangelis: o álbum Short Stories, com música de Vangelis e letras e vocais de Anderson.

Jon Anderson & Vangelis

Todo o processo, desde a composição, arranjo, mixagem e masterização do disco Short Stories, demorou apenas pouco mais de duas semanas – “não consecutivas”, segundo Vangelis. Ambos queriam gravar algo apenas pela diversão, pelo prazer de criar música juntos, então o disco praticamente não usa overdubs, e todas as faixas foram gravadas em um take só, trazendo elementos de composição e arranjo que misturam clássico, rock e folk. Jon Anderson canta, Raphael Preston é creditado por violão acústico em algumas faixas, e Vangelis toca teclados, sintetizadores e piano. Só que eu acho que o Vangelis também toca as percussões, usadas amplamente no disco (lembrem-se que ele é também percussionista, e que muitos de seus discos da década de 70 trazem ele, notoriamente, tocando as percussões de seus discos).

Eu faço um esforço de vida em não ser ‘crítico’ de música – porque a maioria deles me parece que vive em Marte, falando venusiano, para leitores lunáticos (não são esses os habitantes da Lua?). Um crítico disse que esse disco era “inteiramente inaudível”, e eu realmente não quero saber o que ele considera ‘audível’… Outro disse que as letras eram complexas demais para o ouvinte médio (sério, me digam onde esse cara estava durante TODO o rock progressivo?!?). Short Stories é, para mim, uma das obras primas do progressivo, e um dos meus discos favoritos há mais de três décadas. E não é um álbum difícil de ouvir, muito pelo contrário!
Eu chamo esse disco de rock progressivo eletrônico, porque é principalmente eletrônico, porque o trabalho de Vangelis foi muito presente na cena e no mundo do progressivo, porque Jon Anderson é um artista de rock progressivo – como é sua banda Yes. Porém, este disco (e o Vangelis) já foi taxado – por malucos desinformados – de ‘new age’, ‘ambient’, ‘synth pop’ e ‘electronic’.

Destaque para as faixas Curious Electric, e Play Within a Play – muito boas, em um disco que vale a pena ser ouvido inteiro!

Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de streaming selecionados. O CD usual, tirado a partir da masterização para CD da década de 80, não é tudo isso. Outras masterizações, principalmente de CDs europeus ou japoneses, são muito mais legais e, acho, são o objetivo para o fã dessa mídia. Como é um disco de 1980, e que fez um bocado de sucesso, prensagens em vinil são abundantes – só no Mercado Livre há mais de 60 à venda, acho que todas nacionais que, por falta de outra, tem boa serventia. De novo, como sempre, a melhor opção são as prensagens americanas e européias, e o ‘Santo Graal’ é a prensagem japonesa. Não achei informações sobre prensagem recente em 180 gramas. Neste caso, o conteúdo em serviços de streaming é digno de nota, porque uma boa parte dos discos das primeiras duas décadas do Vangelis foram remasterizados e lançados em uma caixa chamada Delectus – e este disco, Short Stories é um deles, e a caixa está disponível em quase todos os serviços de streaming.

Ouça um trecho da faixa “Curious Electric”.

Hans Zimmer & Lisa Gerrard – Trilha Sonora de Gladiador (Decca, 2000)

Um dos últimos filmes do estilo ‘cinemão’, foi Gladiador, do diretor inglês Ridley Scott – depois virou um tal de cinema de ação e pancadaria, em ritmo rápido, e com atuação do mesmo nível de uma novela mexicana, e o roteiro com a mesma profundidade de uma poça d’água de dois dias.

Confesso que, com raras exceções, se Ridley Scott estiver envolvido, vou ver até teatro de fantoche de escola – afinal ele é um de meus diretores favoritos, responsável pelo que é um dos melhores filmes de todos os tempos, Blade Runner (cuja trilha é o mais famoso trabalho do tecladista grego Vangelis), além de se especializar em belíssimos filmes, como Os Duelistas (a fotografia mais bonita que já vi em um filme), Chuva Negra, 1492: A Conquista do Paraíso, Cruzada, entre outros.

A trilha de Gladiador complementa bem o filme, e traz pérolas dadas pela contribuição da cantora e compositora australiana Lisa Gerrard, de voz incrivelmente única. Gerrard é conhecida por ser metade da banda australiana-britânica Dead Can Dance (já recomendada aqui nesta seção). A parte orquestral da trilha de Gladiador é do célebre Hans Zimmer – figurinha carimbada do meio das trilhas sonoras, e já muito premiado, inclusive pela própria trilha de Gladiador, prêmios divididos com Lisa Gerrard, claro – entre eles o Globo de Ouro de Melhor Trilha Sonora. O filme Gladiador, em si, ganhou Oscar de melhor filme, figurino, efeitos, som, e melhor ator, para Russell Crowe. Baita filmão – se não assistiram, assistam. Duvido que tenha alguma pessoa que, ao sair do cinema, não ficou com vontade de ir comprar a trilha sonora, nem que seja só por causa da faixa que fecha o filme: Now We Are Free, belamente cantada por Lisa Gerrard.

Nascida em 1961 em Melbourne, na Austrália, Lisa Germaine Gerrard é conhecida pelo seu extenso trabalho desde 1981 frente ao grupo Dead Can Dance – considerado o grupo de rock alternativo ou art-rock, que iniciou um movimento chamado de ‘neoclassical dark wave’ (vão gostar de rótulos assim lá longe!). Gerrard foi agraciada com uma voz – e talento – que lhe dá tanto o alcance de contralto dramático quanto o de mezzo-soprano, e com um timbre sempre muito interessante, e que canta tanto em inglês quanto em uma língua inventada por ela, e sempre usando temperos trazidos do Dead Can Dance, que mistura folk europeu com mantras, com música do oriente médio, entre outros estilos. Além de discos solo e colaborações, Lisa Gerrard tem uma extensa lista de participações em trilhas sonoras, incluindo O Informante (1999) e Missão Impossível 2 (2000).

Hans Zimmer & Lisa Gerrard

Com uma das mais extensas discografias dentre os compositores de trilhas para o cinema, está Hans Florian Zimmer, nascido em Frankfurt em 1957. Zimmer é outro autodidata musical, em sua maior parte, pois teve aulas de piano somente por duas semanas porque não gostava da disciplina formal delas. Teclados, sintetizadores e computadores para composição de música vieram naturalmente à ele, portanto. Com uma mãe musicista e um pai engenheiro, o resultado foi Zimmer tentando de tudo para modificar o piano da família – para o horror da mãe e a aprovação do pai. Antes de tomar o mundo das trilhas, quando morava na Inglaterra, ele participou de várias bandas, incluindo The Buggles (com Trevor Horn) e uma banda New Wave chamada Helden (com o baterista do Ultravox), além de produzir bandas como The Damned. Uma curiosidade sobre sua participação no The Buggles, é que o clipe da banda, Video Killed the Radio Star, foi usado historicamente para inaugurar a MTV.

Além dos vocais e letras, Lisa Gerrard participa da trilha tocando seu instrumento mais frequente no Dead Can Dance, o Yangqin – um dulcimer trapezoidal chinês, tocado com as cordas percutidas. Além dessa, tem também a participação do músico Djivan Gasparyan tocando duduk, que é uma espécie de oboé armênio, e do brasileiro Heitor Pereira tocando violão (que já trabalhou em várias trilhas, além de ter tocado com o Simply Red, Elton John e Jack Johnson).

Parte da trilha orquestral evoca obras clássicas como Os Planetas, do compositor inglês Gustav Holst, e Das Rheingold e
Götterdämmerung, do alemão Richard Wagner. Diz a lenda, também, que em 2003 o tenor italiano Luciano Pavarotti lançou uma gravação com ele cantando uma das músicas do filme, e dizendo-se arrependido de ter declinado o convite para participar da trilha de Gladiador.

O destaque especial vai para as faixas Now We Are Free, e The Might of Rome, e para quase todo o resto de um bom disco.

Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Serviços de Streaming selecionados. O disco já é pleno da era da gravação digital, então tanto o CD quanto o streaming são bons. O vinil só existe em prensagens modernas 180 gramas recentes, e caras, e foi muito, mas muito malhado nos fóruns de discussão da Internet, por ser um daqueles discos cujo conteúdo foi muito processado ou comprimido em sua masterização para a mídia vinil – ou seja, não é recomendado.

Ouça um trecho da faixa “Now We Are Free”.

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