Opinião: UM MERCADO EM CONSTANTE TRANSFORMAÇÃO

Opinião: QUEREM A VALIDAÇÃO DA BAIXA QUALIDADE!
maio 15, 2021
HI-END PELO MUNDO
maio 15, 2021

Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br

Quando as empresas hi-end internacionais nos solicitam ajuda para encontrar um bom parceiro comercial, sempre temos que, nos primeiros contatos, “desmistificar” a ideia de que por termos dimensões continentais, somos um grande mercado a ser descoberto.
Sempre começo por explicar que é preciso baixar todas as expectativas, pois ainda somos um país de terceiro mundo, com alíquotas de importação aviltantes, e completamente fechados em relação ao mercado mundial de bens duráveis.

Muitos de nossos interlocutores se assustam com o quadro que apresento, pois imaginam que aqui há um universo de oportunidades a ser explorado e que seus produtos são tudo que o consumidor de hi-end almeja.

Interessante que, mesmo depois de eu dar todas as coordenadas e mostrar a nua e crua realidade, muitos ainda querem fincar sua marca por aqui.

Fazendo uma retrospectiva dos nossos 25 anos, é notório que muitas das empresas de áudio hi-end espalhadas pelo mundo, também são empresas pequenas e que possuem um volume de venda anual tímido, e que poder estar em 20 a 30 países já será um feito e tanto, pois poderão sempre escoar sua produção sem enormes sobressaltos a cada nova crise econômica.

E neste um quarto de vida já sobrevivemos a grandes crises econômicas, internas e externas, e agora a uma epidemia de nível global. Claro que ainda é cedo para saber o tamanho do estrago que esta pandemia fará ao mercado hi-end, mas me parece que a grande maioria das empresas está conseguindo se sustentar mudando a maneira de atender o consumidor, e criando ações em conjunto com suas revendas para driblar as restrições sanitárias.

Aqui, além da pandemia, temos as eternas crises políticas, e de câmbio, para dificultar ainda mais o que já é complicado. Então todos os importadores, fabricantes e revendas estarem em pé, já mostra o quanto o brasileiro é resiliente e criativo.

Já são 13 meses em que este frágil mercado luta com todas as forças para se manter atuante e, por incrível que pareça, nesses meses todos houveram “bolhas” de consumo que se mostraram essenciais para a sobrevivência da maioria.

O que todos aprenderão depois que a tempestade passar, ainda é uma incógnita, mas que temos inúmeras lições a serem assimiladas e discutidas, isso temos. E vou mais longe: se não aprendermos e fizermos as correções tão urgentes e essenciais, perderemos a maior de todas as oportunidades desses últimos 25 anos!

Vamos às lições:

A primeira é que o mercado de áudio estéreo hi-end só sobreviverá e colherá frutos se tiver a coragem de se reinventar, diminuindo custos, trabalhando seus produtos mais baratos diretamente online e vendendo direto ao consumidor.

As revendas precisarão também se adaptar a esta nova realidade, voltando-se integralmente ao mercado de automação e home-theater.

Os importadores terão que ser firmes e objetivos em suas negociações com os fabricantes de hi-end, pegando a representação tanto para o Brasil quanto para o Paraguai. Pois caso não feche a representação para o Paraguai, todo seu esforço será inútil, pois não se tem como concorrer com o contrabando e tão pouco o governo brasileiro consegue coibir a entrada de contrabando aqui.

Com a pandemia, a venda interna cresceu graças à falta de mercadoria no Paraguai, o que levou ao total desabastecimento de receivers em nosso mercado. O que prova que se os importadores brasileiros não tivessem a concorrência desleal do Paraguai, a venda de receivers no Brasil seria dez vezes maior!

O problema é que o Paraguai descobriu as vantagens de também oferecer hi-end via Mercado Livre, o que em médio prazo será a destruição deste mercado aqui, caso os importadores não sejam rigorosos na hora de fechar seus acordos comerciais.

Ou se estabelece essa política comercial agora, em que o mercado paraguaio ainda sofre com escassez de mercadoria, ou os importadores sofrerão muito nos próximos dois anos. Há muitos anos sabemos que seria uma questão de tempo os comerciantes paraguaios perceberem que o mercado de hi-end no Brasil havia se solidificado, e que seria muito fácil para eles abocanharem parte deste mercado. Nós sempre fomos contrários a qualquer aproximação deles, tanto que sempre fechamos as portas, tanto na tentativa de participação no Hi-End Show como na possibilidade de anúncio na revista.

Ainda que em muitos momentos poderia ter sido financeiramente muito essencial à nossa sobrevivência fazê-lo. Mas sempre foi uma questão de princípio, fortalecer o mercado interno e ajudar a todos que nos procuraram para o desenvolvimento de seu trabalho.

A outra questão pertinente às mudanças urgentes que devemos encarar, e que já citei em outros Opiniões, é a valorização do produto usado. Ele representa mais de 50% do mercado de hi-end e significa a “porta de entrada” de inúmeros novos consumidores. É preciso que o mercado de usados se torne uma vitrine permanente para quem deseja se aventurar no universo audiófilo, mas se sente intimidado pelos preços dos novos com um dólar a quase 5,50.

Nós temos inúmeras ideias para fazer este segmento ter o valor merecido, mas precisamos unir esforços, sentar para conversar e deixar as ideias fluírem, para podermos montar uma estratégia que atenda a todos e ofereça ao consumidor a oportunidade de ter o seu primeiro equipamento hi-end, com garantia de três meses, apoio na montagem do sistema e principalmente que tenha a segurança de que está comprando um produto em excelente estado de conservação.

Os importadores também precisam participar e criar condições para que o produto usado possa ser parte do pagamento do produto novo. Pois enquanto o importador quiser vender o seu, mas não abraçar o usado, as vendas se tornam muito mais difíceis.

Nós sempre nos propusemos a ajudar a fomentar este segmento de usados (podendo desde que com a participação de todos que trabalham com usados), desde que eles emprestem esses equipamentos para que possamos fazer uma radiografia de como se situam em relação aos novos (recursos, performance, avaliação de seu estado – se está bem conservado, se é tudo original, embalagem, controle remoto, etc.).

Criando esta seção, certamente ajudaríamos nossos leitores indecisos a definirem se desejam ou não realizar tal upgrade. Pois um dos itens de maior consultoria é justamente este: se vale ou não a pena investir em um produto usado, se ele não está obsoleto e se ainda poderia atendê-lo. Que momento pode ser mais propício do que este que teremos pós pandemia?

E, por fim, temos o crescimento do fabricante nacional, que finalmente está em seu melhor momento nos 25 anos da revista. Estou cheio de confiança que os próximos cinco anos, o fabricante nacional de produtos hi-end irá ter uma fatia considerável do mercado, pois o “preconceito” aos poucos vem se diluindo, e o audiófilo entendeu que a política de fidelidade criada por muitos desses fabricantes permite que os upgrades sejam constantes dentro da marca.

O que eu espero e desejo é que o fabricante nacional, perca o medo de nos enviar seu produto para avaliação. Pois nossa linha editorial, desde a edição zero, foi sempre dar o direito de abortar o teste desde que as expectativas do fabricante não sejam atendidas em nossa avaliação. Foram mais de 1000 testes abortados e nunca foram vazados para o mercado o que rejeitamos.

E sempre mostramos o motivo de tal teste não ser publicado (graças à Metodologia e nosso Sistema de Referência e sala tratada). Muitos aceitaram sem problemas e muitos não, e respeitamos perfeitamente que cada um reaja de acordo com suas expectativas e estratégias de mercado.

O que não muda nada, pois nosso compromisso editorial foi mantido desde nosso primeiro número lançado em março de 1996. Então não existe motivo algum para o fabricante nacional ter algum melindre ou receio.

E esqueçam as “barbaridades” que já ouviram falar sobre o Fernando Andrette, e tirem suas próprias conclusões e não por terceiros: venham conhecer nosso trabalho, ele não é perfeito, mas é transparente e honesto. E o que nos moveu nesses 25 anos de vida continua sendo a essência de tudo o que já fizemos e ainda faremos: o amor e o prazer por tudo que produzimos.

Entendo que para muitos (leitores, importadores e fabricantes), nossa escolha de uma linha editorial que prima pela qualidade da reprodução musical, acima da qualidade dos equipamentos, não seja ainda muito bem aceita por todos.

Mas, à medida que nossos leitores passam por todas as etapas audiófilas (do descobrimento do palco sonoro à materialização física do acontecimento musical, e os arroubos e sustos com variações dinâmicas), ele percebe que esta longa jornada tem um único objetivo: fazer com que a música que amamos soe da forma mais magistral possível, dentro de nosso orçamento.

E qualquer desvio deste objetivo não tem como perdurar por um longo tempo, pois quanto mais nos tornamos obcecados por equipamentos, maior o risco de erros e de esquecermos o motivo de dedicarmos tantos anos de nossas vidas à busca deste santo graal sonoro.

Um dia todos temos que voltar para casa. E se neste dia cada um dos nossos leitores, por este um quarto de século, ao voltarem puderem ouvir toda sua coleção de discos e reconhecer que todo esforço, tempo e dinheiro valeu a pena, nossos 25 anos também valeram!

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