Influência vintage: AMPLIFICADOR INTEGRADO TRIO-KENWOOD KA-2002

Música de graça: JAZZ TRIOS EM VIENNE, SARAJEVO & CHICAGO
outubro 7, 2022
Vinil do mês: TOMMY – LONDON SYMPHONY ORCHESTRA (ODE RECORDS, 1972)
outubro 7, 2022

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Equipamentos Vintage que fazem parte da história do Áudio.

O termo Vintage tem a ver com ‘qualidade’, mais do que ‘ser antigo’. Vem do francês ‘vendange’, safra, sobre uma safra de um vinho que resultou excepcional. ‘Vintage’ quer dizer algo de qualidade excepcional – apesar de ser muito usado para designar algo antigo.
Nesta série de artigos abordamos equipamentos vintage importantes, e que influenciam audiófilos até hoje!

O AMPLIFICADOR INTEGRADO TRIO-KENWOOD KA-2002

Minha lembrança desse amplificador vai até o começo da década de 80, quando ele e um modelo menor eram facilmente encontrados no Brasil. Era uma época quando a ‘Internet’, a ‘TV por assinatura’ e o ‘videogame’ das pessoas eram o Aparelho de Som – todo mundo tinha algum sistema em casa, porque todo mundo ouvia música, e com mais dedicação e atenção do que hoje.

Trio KA-2002

Encontrei esse amplificador (e seu irmão menor KA-2000A) em vários sistemas em casas de amigos, assim como muitas lojas de aparelhos usados. E a minha lembrança – tocando nos equipamentos consumer de época – sempre foi: tocava bonito e com bastante vivacidade.

Por que o chamo de Trio-Kenwood? A Kenwood é uma empresa de áudio que não é das mais conhecidas das gerações mais jovens, mas nas décadas de 70, 80 e 90 era uma das marcas top que vinham do Japão. Nessa época, todos os aparelhos deles que saiam no Japão vinham com a marca Trio no painel. E os mesmos aparelhos que saiam no exterior, vinham com a marca Kenwood, com poucas exceções.

Kenwood KA-2002

Em linha no Japão entre 1970 e 72, o KA-2002 chegou pouco tempo depois ao Brasil, importado do Japão, talvez via Reino Unido. Alguns sortudos tinham ele com o logo da Trio no painel! Diz o mito que o modelo para o mercado japonês tocava ‘um pouquinho’ melhor… Logo a importação passou a trazer os equipamentos da empresa com o logo Kenwood – provavelmente vindos via EUA ou Reino Unido.

Depois, em janeiro de 1975 entrou a Lei da Reserva de Mercado, que literalmente derrubou as importações impondo uma alíquota que chegou a 128% de imposto da noite para o dia. Isso levou ao surgimento e elevação de numerosos fabricantes nacionais de equipamentos de áudio, como a Gradiente e a Polyvox, e também a CCE.

A CCE foi a empresa que acabou, a partir de 1976, por produzir no Brasil muitos aparelhos da Kenwood – ou projetos inspirados e adaptados de modelos Kenwood – mas com a marca CCE em cima.

Traseira

Os primeiros em produção, que ainda ostentavam os dois nomes na frente – Kenwood & CCE – ainda eram de melhor qualidade. Mas, depois disso, como essas empresas da Reserva de Mercado produziam em Manaus, a Suframa (uma autarquia que era a Superintendência da Zona Franca de Manaus) impôs uma regra onde os aparelhos produzidos no Brasil poderiam usar um máximo de 50% de componentes importados. E isso fez a qualidade dos ‘Kenwood’ produzidos pela CCE, não ser da mesma altura da qualidade dos importados.

O KA-2002 era estado sólido com transístores bipolares, e trazia duas entradas Phono (ambas MM), botão Loudness, graves e agudos, balanço, botão Stereo/Mono – e conexões traseiras para se usar o aparelho como pré-amplificador de linha ou como power, separando internamente a parte de pré da parte de potência do aparelho.

Os originais Trio, e a melhores versões que chegaram aqui, todos passavam a impressão de ter muito mais potência do que os declarados 13W RMS contínuos em 8 ohms (15W em 4 ohms) – sendo que era difícil passar o botão de volume muito além da metade, isso com as caixas de média e alta sensibilidade da época. Mas eu suspeito que, mesmo hoje, ele tocaria sem grande problemas caixas modernas menores e menos exigentes. Como já disseram muitos na área de áudio: “Watts de hoje não são mais como antigamente”…

Interior

A Kenwood apostava na confiabilidade do aparelho, e sua durabilidade, até porque era feito para iniciantes, então o KA-2002 aguentava um bocado de maus tratos. Cada canal de sua saída transistorizada tem um circuito de proteção que monitora sobrecargas de potência, desligando tal canal até que ele baixasse para um nível aceitável, e aí religava o canal automaticamente. E seu controle de volume fica antes dos estágios de ganho, fazendo com que ele aguente aparelhos de saída alta ligados em suas entradas, sem saturá-las, bastando usar o botão de volume com parcimônia.

Uma curiosidade: o amplificador KA-2002, segundo um site americano, foi definido como o “Amplificador para o Orçamento
Estudantil para Cerveja” – da época, graças a seu baixo custo com alta performance musical.

MODELOS SEMELHANTES

A mesma linha do KA-2002 – com visuais seguindo o mesmo estilo clássico – possui um irmão menor, o KA-2000A com praticamente as mesmas especificações de potência, mas com menos recursos e entradas (mas que eu penso ter o mesmo circuito de potência). E, acima, vem o KA-4002 com mais entradas, gabinete maior, e com mais potência e recursos.

Manual

Em 1973, em renovação à linha, vem o KA-2002A em substituição, com upgrades cosméticos, mesma potência e recursos, mas sem as conexões para pré-amplificador de linha e power externos. O 2002A também trouxe fusíveis de proteção, e novos transistores no estágio de phono, com menor ruído.

COMO TOCA O TRIO-KENWOOD KA-2002

As minhas memórias – de mais de 40 anos atrás – me dizem que era um som bom de ouvir com boa pulsação e sensação rítmica, e médios bastante limpos. Mas, vejam, essas impressões são no contexto de época.

KA-2000A, o Irmão Menor

Como descobri que na época que a Terra estava esfriando, um pouco antes dos dinossauros, nosso intrépido editor Fernando Andrette foi o feliz proprietário de um Trio KA-2002, então leiam o Box aqui na matéria, para saberem suas impressões e lembranças.

SOBRE A TRIO-KENWOOD

A japonesa Trio Corporation foi fundada como Kasuga Radio em 1946, para depois ser rebatizada de Trio em 1960, focada mais em equipamentos para radioamador e faixa do cidadão. Ainda na mesma década, uma sociedade nipo-americana estabeleceu a
Kenwood USA, na Califórnia, para importar os equipamentos da Trio para os EUA – e foi essa diretoria americana que resolveu criar o nome Kenwood, onde ‘Ken’ é um nome que é comum tanto ao Japão quanto ao ocidente, e ‘Wood’ referindo-se ao material nobre que é a madeira, e alguns dizem que é uma referência de marketing à Hollywood. E o nome Kenwood já era bem conhecido em países de língua inglesa, já que existem três lugares chamados Kenwood na Inglaterra, e treze distribuídos em vários estados dos EUA.

KA-2002A, o Sucessor

O fato, também, é que lugares como o Reino Unido comercializavam os equipamentos de áudio da empresa com o nome Trio até os anos 90, por causa da existência local de uma marca inglesa Kenwood que fazia (e ainda faz) equipamentos para a cozinha, como torradeiras, processadores de alimentos e liquidificadores.

Com a marca Kenwood se tornando mais popular que a marca Trio, em 1986 a Trio Corporation comprou a Kenwood USA e rebatizou todos seus produtos e subsidiárias mundiais com o nome Kenwood.

Em 2007 a Kenwood descontinuou sua linha de produtos de eletrônicos de consumo, e em 2008 houve uma fusão de empresas entre ela e a também japonesa JVC. O resultado hoje é a corporação multinacional chamada JVCKenwood – cuja marca Kenwood hoje fabrica tecnologia de comunicação por rádio, sistemas de som para carros, e fones de ouvido sem fio.

O PRIMEIRO KENWOOD A GENTE NUNCA ESQUECE
Por Fernando Andrette

Para os que não sabem, antes de trabalhar na extinta Audio News e, depois, idealizar o Clube do Áudio, e a atual Áudio e Vídeo Magazine, eu fui publicitário. E o filme do primeiro sutiã da Valisére “O primeiro sutiã a gente nunca esquece” do Washington Olivetto, foi um filme que marcou toda uma geração de publicitários!

Por isso minha brincadeira no título desse texto.

Mas não deixa de ter um fundo de verdade, o fato do Integrado Trio-Kenwood KA-2002, ter sido um amplificador que guardo com carinho em minha memória já borrada pela vida, que teima em deletar o que não foi relevante.

É nossa mente tentando arrumar espaço para o que de mais importante vivemos, e queremos preservar até o fim.

Minha história com essa marca está intrinsecamente atrelada a do meu pai, que era um admirador da Kenwood, e que indicava, vendia e consertava, antes da estúpida Lei de Reserva de Mercado.

Então, convivemos em casa com diversos aparelhos da Kenwood, de 1970 até 1975, quando se tornou impossível legalmente importar equipamentos de áudio.

Quando fui morar sozinho, em 1977, a primeira coisa em que pensei antes de sair da casa de meus pais – muito antes de televisão, geladeira e máquina de lavar – foi em montar meu sistema, claro.

E comecei minha peregrinação por um sistema modesto, mas que eu conhecesse o suficiente para continuar ouvindo minha coleção de discos – que nessa altura da vida já tinha mais de 200 LPs e umas 70 fitas cassete. E tive a sorte de conseguir, com a rede de clientes do meu pai, um KA-2002 em excelente estado de conservação.

Era um dos integrados favoritos do meu pai e meu, e ouvi em várias oportunidades com diversas caixas: Pioneer, JBL, Klipsch, Wharfedale, Sony e JVC, mostrando como aqueles modestos 13 Watts eram poderosos.

O que me chamava muito a atenção, era que o original japonês soava mais quente e musical que a versão importada dos Estados Unidos, um pouco menos ‘quente’.

E como eu sabia? Pelo simples fato de olhar o painel e ver estampado no logo a marca TRIO, ou a marca Kenwood (como o Christian explicou em seu texto).

Lembro que entre os clientes do meu pai, possuidores do KA-2002, existia até uma discussão entre os que preferiam a versão japonesa ou a americana. Eu e meu pai sempre preferimos a japonesa, mas se tornou cada vez mais difícil adquirir um original, a partir do meio dos anos setenta.

E para embaralhar ainda mais essa busca, entrou – a partir de 1976 – a versão feita em Manaus pela CCE, com um alto grau de nacionalização e que mudou ainda mais sua sonoridade.

Vivi com o meu versão americana, de 1977 a 1982, e ele foi sempre o ‘cérebro’ do sistema, com os toca-discos Dual, Garrard e Thorens que tive, assim como as caixas Pioneer, JBL e Kenwood que utilizei nesse período. E posso garantir que ele proporcionou a mim e meus amigos (nas longas audições de sábado, que já compartilhei muitas vezes nessa revista), inúmeros momentos de êxtase! Pois ele tinha a capacidade de transmitir a música de forma simples e singela.

Não tinha a impetuosidade dos integrados com maior potência, mas era capaz de transmitir o âmago do discurso musical de forma coerente e honesta.

Fiz audições inebriantes com o KA-2002, e descobri obras que estão ainda hoje entre as minhas favoritas de todos os estilos musicais.
Uma vez um amigo levou em casa a versão nacional do KA-2002, para fazermos uma comparação (se não me falha a memória isso ocorreu em 1978) e fiquei surpreso em ver que a ‘essência’ do Kenwood estava preservada. Ainda que não tivesse mais o refinamento, deixando o som um pouco mais borrado, mas ainda assim muito superior ao que se oferecia ao mercado na sua faixa de preço.

Essa comparação me levou a indicar a todos os amigos essa versão nacional, e pude constatar que com as caixas nacionais da época ele fornecia, a muitas delas, o que faltava nos amplificadores nacionais. Graves com mais segurança e definição, calor na região média e um agudo com pouco mais de definição e extensão.

Posso garantir que, até 1980, quando ainda era possível achar a versão tupiniquim do KA-2002, eu a indiquei a mais de 20 pessoas. E todos se sentiram gratos por essa indicação!

Se eu pudesse colocar as mãos em um ‘original’, adoraria saber como soaria hoje em meu sistema!

Saudosismo?

Não, apenas curiosidade mesmo!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *