Opinião: IDEIAS ‘ERRÔNEAS’ SOBRE AUDIOFILIA II – O POÇO QUE NUNCA SECA

Opinião: EXPLORANDO O VÁCUO
outubro 7, 2022
HI-END PELO MUNDO
outubro 7, 2022

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Você gosta de música? E gosta também de ouvi-la através de equipamentos que dão melhor QUALIDADE de som, em vez de “qualquer coisa serve”? Então você é Audiófilo. Simples assim.

Por exemplo, ser nascido em São Paulo, mas não concorda com a maneira como a cidade existe, e isso lhe dá vergonha e desprezo por ela, de maneira a se declarar ideologicamente como “não-paulistano”, não quer dizer que você tenha mudado de ‘Paulistano’ para qualquer outra coisa. O mesmo se aplica à Audiofilia – e não é necessário ter desgosto por ela, porque ela não representa somente as coisas piradas e incompreensíveis, o comportamento exacerbado, etc, até porque ela é o que te permite uma conexão muito maior com a música que você ama. A Audiofilia que te permite, te traz e adiciona à você e à sua vida, uma experiência muito mais profunda ao ouvir música, e deixar que ela mexa na sua alma.

Não deixe de dizer que você é Audiófilo – assim como, não deixe de dizer que você é Paulistano (nascido ou adotado), pois de tudo que existe de ruim em São Paulo, ainda tem o melhor bolinho de salsicha do mundo! rs…

Uma coisa que eu tenho visto gente falar sobre, é: ‘música audiófila’ – o que é? Bom, não existe música ‘audiófila’, mas sim existem gravações cujas pessoas envolvidas em todo o processo técnico delas, tinham em mente um objetivo comum: QUALIDADE sonora. E isso não se obtém gravando nos estúdios mais caros e usando as soluções tecnológicas mais bacanas e nem as mais modernas – não adianta usar gravador de rolo analógico estupidamente caro para gravar em 30 polegadas por segundo de velocidade, e resultar em algo cuja filosofia de registro e mixagem deu um disco onde as músicas eram tão emboladas e frontais, que você fica com claustrofobia ouvindo (eu vi isso mais de uma vez). Não é ‘tecnologia avançada’ e sim ‘conhecimento e técnica de gravação’.

Infelizmente, quanto mais se navega pela Internet, pela mídia especializada audiófila – escrita e de vídeo – mais abobrinha se vê e ouve. Você é quase tomado de assalto por abobrinhas – vira vegetariano aural!

E isso é um tremendo desserviço ao Audiófilo!

Então, aqui voltamos com mais um capítulo: Ideias ‘Errôneas’ Sobre Audiofilia, parte 2:

Cada um ouve de um jeito? Importa?

Incrível como o mundo ainda usa essa desculpa – que tem suas raízes na pura falta de informação, e em um certo conformismo, já que é uma resposta ‘fácil’.

Cada pessoa vai ouvir de um jeito ligeiramente diferente – mas não, o mundo não foi feito para se adaptar a nós, e sim o contrário.

De qualquer maneira, tirando essa minha ranzinzice latente, não importa a diferença entre o ouvido de um e de outro, porque um Sabiá é um Sabiá para todo mundo, o trovão é um trovão para todo mundo, e uma voz feminina é uma voz feminina para todo mundo.

O segredo não está em transformar o cenário em um circo com direito a tiroteio de faroeste e dizer que “vale-tudo”. O segredo está em: ouvir e saber que um Sabiá está cantando, que acabou de trovejar, e que uma mulher está cantando.

Entendendo Música

E o ‘Segredo Máximo’, com um tempo de dedicação e experiência, é: saber que o Sabiá está no seu quintal e tem hora que vira para lá e para cá, e que ele parece estar ficando meio cansado e desesperado – é saber que o trovão está ficando mais próximo e que o decaimento de seu barulho parece que rola pelas montanhas cada vez de um jeito diferente – e é saber que a cantora é a vó da sua vizinha, que costumava alguns anos atrás ter uma voz mais aguda que agora está engrossando quase que imperceptivelmente, que ela parece mais lenta, mas agora soa mais precisa e tranquila, e o componente grave da voz está muito mais discernível em seus detalhes.
Isso aí chama-se: REFERÊNCIA.

E, também, eu chamo de Referência Qualificada (vem da palavra ‘Qualidade’ e não da palavra ‘Quantidade’).

Todas as pessoas que Educarem sua audição vão perceber tudo isso acima – não importa o quão ‘diferentes’ sejam seus ouvidos.

Gravações Ruins

Precisa conhecer a música como ela é?

Incrível a quantidade de gente – aficionados, clientes e profissionais – que não faz a menor de todas as ideias em todo o universo de como soam os instrumentos na realidade, do que são os aspectos qualitativos da música e de seus instrumentos. E isso é tão disseminadamente ruim, que agora tem gente falando que todas as gravações são boas: ‘se você gosta, então é boa’. Isso é o equivalente a enfiar um miojo no microondas e se auto-intitular Chef de Cozinha Gourmet. E, além do óbvio, qual é mal de tudo isso?

Gastar dinheiro em um sistema voltado à qualidade sonora, e não usar a tal qualidade. É fazer hambúrguer gourmet com resto de pelanca e sebo – ou usar um Rolls & Royce para fazer entregas de feira com ênfase em caixas e mais caixas de mamão passado…

Ouça o que você quiser. Mas tenha em mente que, se você montará um sistema melhor e fizer o ajuste fino e a sinergia melhor dele, tirará melhor qualidade de som, por exemplo, do pessimamente mal gravado e comprimido disco ao vivo The Way We Walk Volume Two: The Longs, do Genesis (que é o meu preferido da fase anos 80/90 da banda). Acontece que só vai conseguir fazer esse ajuste fino e sinergia, e tirar um pouco de leite de pedra, se você melhorar sua audição compreendendo como soam os instrumentos ao vivo acusticamente (não através de amplificação). Se você nunca comeu carne na vida, por exemplo, como saberá diferenciar um hambúrguer baratíssimo congelado de supermercado, de um hambúrguer feito em casa com carne de primeira?

Eu vivo fazendo analogias aqui com comida, porque todo mundo come – senão não estaríamos por aqui – mas não sei se isso realmente ajuda a solidificar ideias na cabeça das pessoas, porque o feedback acaba sendo muito pequeno. E o melhor exemplo para explicar como o feedback é mal usado pelas pessoas, é o restaurante: se ele é ruim, você conta para todo mundo, e se ele é bom você quando muito conta para um ou dois amigos chegados. Falar com o gerente do restaurante? Jamais! Brasileiro fica constrangido.

A questão é que todos comem ‘desde que nasceram’, então seus paladares vêm sendo educados há décadas, mais de uma vez por dia!

A variedade de temperos, sabores, complexidade ao paladar, é algo com o que a maioria das pessoas já se ‘iniciou’ – então fica mais fácil entender com maior rapidez as diferenças entre uma comida mais natural e uma mais artificial, feita com produtos de melhor ou pior qualidade. Engraçado como, com comida, fazemos julgamentos de valor (ou seja, de Qualidade) de maneira rápida e frequente!

“Percebeu se esse doce de maçã é natural ou artificial?” – “Não sei, nunca comi maçã antes…”. Por que deveria ser difícil de entender que é preciso ser Qualitativo, educar-se em relação aos aspectos de qualidade de um som emitido por um instrumento musical e, consequentemente, por um equipamento de som?

Uma vez me perguntaram: “e qual seria, então, o som real dos teclados e sintetizadores?”. A questão com esses é que, nos de melhor qualidade, os sons dele são feitos para haver alguma semelhança com sons reais – e, na maioria das vezes, não são lá muito bem sucedidos, mas:

Aqui vem a Dica de Ouro: o som de instrumentos eletrônicos contém algumas das características do som dos instrumentos acústicos. Primeiro, você precisa entender como é o gosto de uma maçã, para depois avaliar uma maçã ou ou algo feito com essência de maçã, não? E a hora que você o fizer, ficarão claras as diferenças entre uma gravação bem feita e uma mediana – mesmo de sintetizadores – e ficarão claras as diferenças de como essas gravações tocam em diferentes sistemas. Mas aí você já saberá qual é o melhor, porque você se educou. Simples assim.

Usar música mal gravada para avaliação e testes?

Sim, batendo na mesma tecla novamente. Se você ouve heavy metal, por favor continue ouvindo sempre, o quanto isso te der prazer! Eu ouço várias bandas de heavy metal com alguma frequência, e quer saber de um segredo industrial guardado a sete chaves e passado de pai para filho nas últimas horas da madrugada em algum canto silencioso e mal iluminado de uma praça pública deserta? Todos os meus discos de heavy metal soam MUITO melhores no meu sistema simplesmente porque eu ouvi gravações com qualidade técnica alta ao fazer a escolha dos equipamentos, montagem e ajuste do mesmos.

Simples, não?

Equalizador

O uso de equalizador e de controles tonais é válido?

Eu já falei antes sobre equalizador e controles tonais. É que nem tempero: se você não tem critério, põe sal demais, pimenta demais, molho de menos, etc. E ter critério para o uso de um equalizador, é uma coisa que a maioria das pessoas não têm, por falta de conhecimento de como aquilo funciona, como ele afeta a música, como é música de verdade para que se busque o equilíbrio tonal, etc.

A mesma coisa se aplica a controles tonais (botão de graves, médios e agudos). Se não tiver critério de como usar, vai resultar mal. Vai mais estragar o som do que ajudar.

Dos dois amplificadores que uso atualmente, ambos têm controle tonal de graves e agudos, mas em um o controle é excelente, e o outro é péssimo: enfia sujeira no som, mais estraga do que conserta. Quando eu usava um par de bookshelfs, eu punha um ponto a mais no grave do controle tonal e, assim, na minha sala eu conseguia um equilíbrio tonal melhor com aquela book, que era pequenina – e a melhora era ótima. Um ponto só. Só um! Afinal, caros leitores, a correção a ser feita era na interação do sistema com ele mesmo e com a sala – não uma correção da música a ser tocada.

Então, porque dizem que equalizador e controles tonais não são bons para a Audiofilia? Dois motivos: 1- o critério necessário para usá-los, que demanda conhecimento, que vem por educação e experiência, e grande parte das pessoas não os têm. E, 2- o fato de que a maioria dos circuitos desses, tecnicamente, prejudicam ou diminuem a qualidade de som dos equipamentos, inserindo sujeira, ruídos e distorções – que foi o principal motivo pelo qual tiraram o controle tonal dos equipamentos.

E também têm os muitos que usam equalizadores achando que vão resolver todos os problemas de um sistema e de uma sala – e nada pode estar mais longe da verdade, já que “elevar” e “atenuar” frequências é Quantitativo – você está aumentando ou diminuindo uma Quantidade, e não mexendo em aspectos Qualitativos da sonoridade, que são muitos e muitos. E muitos.

Gravações Ruins

Vinil é só saudosismo, e não presta?

Não é totalmente mentira, esse… Existem dois lados de uma mesma moeda.

Algumas coisas não são ditas sobre o vinil. Por exemplo: discos cujo som é ruim em CD, podem ser tão ruins quanto no LP, como os pop-rock das décadas de 70, 80 e metade de 90 costumam ser – com muito mais frequência do que as pessoas imaginam.

A maioria dos toca-discos novos ‘mais vendidos’ nos últimos 15 anos, não são só ruins, são uma ‘ofensa’ com agulha e prato… Ter um vinil que realmente toca bem, toca decentemente, custa dinheiro e dá trabalho.

Falar dos preços extorsivos dos vinis, tanto novos quanto usados – tanto aqui quanto em muitos lugares do exterior – já é, hoje, chover no molhado.

Vinil dá trabalho para armazenar corretamente, cuidar, lavar. Dá trabalho regular e manter o toca-discos e braço e a agulha. Se não tiver tudo bem acertado e no lugar, a performance não chega lá, não.

Agora, vinil pode tocar melhor que digital? Simmmmmm!

Então, vinil não é uma tecnologia obsoleta em qualidade sonora? Absolutamente não! Quem tem essa ideia na cabeça, nunca ouviu um bom vinil (e eu não estou falando de coisas caríssimas).

Diferenças não são Placebo

Seu ouvido pode te enganar? Diferenças entre equipamentos e cabos são placebo?

Bom, analogia de novo: o paladar de algumas pessoas pode enganá-las, certamente. Por falta de conhecimento, de treinamento. Para pessoas que não são aficionadas de comida especial e gourmet, ou mesmo não têm experiência com as mesmas, as diferenças podem não aparecer para elas, podem não ser notadas.

É necessário haver experiência, dedicação, paciência e, sobretudo, educação ao aprender. Discernimento também ajuda. Áudio não é um hobby ou trabalho fácil e nem nunca foi e nem nunca será – mas é muito gratificante.

E não, diferenças entre equipamentos, caixas, cabos, não são placebo. A ideia de que a maioria dos fãs, aficionados e profissionais está se iludindo e passando por efeito placebo com enorme frequência há décadas (só eu estou nessa há uns 20 anos profissionalmente), seria realmente ‘viajar na maionese’. É como a piada irônica sobre os que acham que é ‘teoria da conspiração’ o homem ter ido à Lua: “agradecemos aos milhares de funcionários da NASA e prestadores de serviço por terem mantido segredo por mais de 50 anos!”.

Ouvido de Ouro

Existe ‘Ouvido de Ouro’?

Não, na verdade não existe. Mas a questão não é essa, não está em capacidades cósmicas sobrenaturais do ouvido de ninguém, mas sim em longo trabalho, educação, dedicação, educação, paciência, educação. Eu mencionei ‘educação’? rs…

É um estudo constante para o resto da vida.

Bom, por hoje é só, pessoal! Novembro tem mais!

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