Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br
Eu esperei toda a pandemia passar, para finalmente receber para teste o cabo digital AES/EBU Apex, e o cabo de força também dessa série, da Dynamique Audio.
Nos dois anos que aguardei o envio, muitas dúvidas foram alimentando minha curiosidade. Estariam ambos no mesmo patamar de performance dos de interconexão e caixa? Pois recebi inúmeras vezes para testes sets completos de cabos, e raramente o fabricante consegue manter todos no mesmo nível de performance e com a mesma assinatura sônica.
E as maiores variações, sempre que ouvi, estavam justamente nos cabos de força e nos digitais. Então, meu questionamento inicial tinha uma certa relevância.
Até que, finalmente, ambos chegaram para teste e pude não só responder a todas as minhas dúvidas iniciais, como também poderei em ambos os testes (o de força publicarei minhas impressões na edição de dezembro), aprofundar por completo o conceito de ‘neutralidade’ que abordei enfaticamente nos testes dos cabos da Dynamique.
Então, meu amigo, se acomode em sua cadeira, escolha uma seleção musical relaxante e tenha paciência, pois esse não será apenas mais um teste de cabos.
Ele terá que embrenhar em um conceito muito utilizado na linguagem audiófila, e ainda muito pouco explorado: a tal da Neutralidade! Que, assim como a musicalidade, me soa mais como um jargão para exprimir subjetivamente o que sentimos do que propriamente ouvimos.
Já tentei lembrar a você leitor que, em nossa Metodologia, a musicalidade é a soma de todos os nossos quesitos, e não algo que possa ser expressado independentemente do todo. Mas sei que não é tarefa simples, pois o que mais lemos em testes, nas conclusões finais, é o quanto o produto testado é musical ou neutro. Diminuindo o peso dessas duas qualidades, no meu modo de ver alta fidelidade.
Afinal, imagino que todo audiófilo clame por ter em seus sistemas esses dois itens na mais perfeita harmonia que seu bolso possa conquistar. Mas será mesmo que possuímos em nossa referência auditiva de longo prazo, consistência para reconhecer quando essas qualidades estão presentes no setup que estamos ouvindo?
Para responder a essa pergunta, será preciso cavarmos mais fundo e entendermos como nosso cérebro interpreta o som, as fundamentais e seus respectivos harmônicos, e saber que toda eletrônica, por melhor que seja, terá uma assinatura sônica, e que determinados harmônicos (pares ou ímpares) irão prevalecer.
E, obviamente que, dependendo dos cabos escolhidos para casar com qualquer eletrônica, eles também criarão sua influência nessa resultante sonora.
Agora, se você tiver munido da paciência necessária para ler esse teste, garanto uma coisa: sua concepção da importância dos cabos irá mudar por completo. Pois existem, sim, cabos mais neutros e cabos que gostam de impor sua assinatura sônica (vejo os objetivistas procurando onde guardaram suas tochas e foices, rs).
Mas antes de entrar por essa mata virgem, vamos à descrição do cabo digital AES/EBU Apex da Dynamique Audio.
Segundo o Daniel Hassany, o desenvolvimento do cabo digital Apex demorou muito a sair, pelo fato de que o Zenith 2 tinha um grau de performance tão alto, que para fazer sentido, o novo top de linha precisaria ser em tudo ainda melhor. Então, a base de desenvolvimento partiu de se aprofundar nas melhorias possíveis e ir buscando a evolução.
O primeiro passo foi aprimorar a mistura de metais nobres, através da galvanoplastia (em que o Daniel se tornou um expert), com a utilização do fio de prata pura 5N com camadas muito puras de ouro e ródio. Em uma topologia de construção ‘quad’ balanceada que consiste em 8 condutores de núcleo sólido por canal, com quatro bitolas de condutores variadas entre 20 AWG e 24 AWG, para uma resposta muito mais estendida e uniforme. O isolamento é similar ao do Zenith 2, de PTFE Teflon, com super espaçamento de ar e uma versão modificada da geometria Helical Array de todas as séries da Dynamique, para um espaçamento ideal dos condutores e seu filtro de ressonância, que foi desenvolvido para combater todo tipo de ruído.
As especificações técnicas estarão no final do teste.
AFINAL, POSSO OUVIR A NEUTRALIDADE EM UM SISTEMA?
Quantas vezes você já parou para se perguntar se o que você está ouvindo é neutro ou não? E, no entanto, os termos Neutralidade e Musicalidade estão presentes na esmagadora maioria dos testes que são publicados diariamente em todos os continentes.
Aqui precisamos esclarecer o que deveríamos utilizar como critério para se dizer se determinado sistema é mais ou menos ‘neutro’ ao reproduzir nossos discos. E, para isso, é preciso pelo menos se fazer uma breve introdução, para leigos, do que estamos a falar.
Toda eletrônica, por melhor que seja, terá algum tipo de distorção. E, dependendo do tipo de distorção, ela irá influenciar no resultado do que ouvimos. Todo instrumento (aqui também incluída a voz, obviamente), possui uma fundamental e seus respectivos harmônicos (que podem ser pares ou ímpares, dependendo do instrumento). E, assim como os instrumentos musicais, os equipamentos de áudio também produzem distorções harmônicas que também são múltiplos ímpares e pares da frequência fundamental (o amigo começa a perceber o labirinto que estamos nos metendo?).
Assim, a soma do que ouvimos é a reprodução gerada por instrumentos que estão na gravação, com a distorção eletrônica de nosso sistema. O que então vem a ser: a soma da fundamental do instrumento junto com a soma do sobretom original e mais as distorções harmônicas do nosso equipamento. O que pode ocasionar que, o que estamos ouvindo não é o que a gravação captou, mixou e masterizou, e sim uma resposta alterada em amplitude.
E aí dizer que esse produto é neutro será totalmente impossível.
Vamos a dois exemplos simples, para que você não comece a arrancar seus fios de cabelo e desista de se aprofundar nesse laborioso tema.
Uma flauta produz apenas harmônicos pares, mas se você ouvir essa flauta em um sistema que tem o ‘hábito’ de adicionar harmônicos ímpares, o que ocorrerá? Se você tem como Referência a música ao vivo não amplificada, ao ouvir essa flauta notará instantaneamente que ela está soando estranha, e que uma flauta ao vivo jamais teria essa assinatura sônica.
Agora, um segundo exemplo: um clarinete com seus harmônicos ímpares – se estivermos a ouvir esse instrumento em uma eletrônica em que possui a predominância de harmônicos pares, o que ouviremos? O mesmo resultado que da flauta.
E só podemos reconhecer esses problemas se tivermos a referência de ouvir clarinetes ao vivo, não amplificados.
Antes que você levante a mão, ofegante, eu me adianto em responder como esses dois instrumentos soarão em uma eletrônica em que os harmônicos predominantes são o oposto dos harmônicos dos instrumentos solos que estamos ouvindo. No caso de ambos, as notas mais agudas soarão duras e agressivas! Simples de ouvir e identificar o problema. Não precisa ter ouvido de ouro, pós-graduação em neurociência da audição, ou falar e escrever poemas em dezoito línguas!
Então, meu amigo, agora que você sabe que o que você escuta em seu sistema é a soma de tudo, fique muito atento quando você ler que determinado produto soa ‘neutro’, pois o que vejo por aí de produtos que ganham esse ‘selo’ de neutralidade, sem merecê-lo, é muito maior do que se imagina.
Sigamos. A próxima pergunta óbvia então é: Pode existir Musicalidade sem Neutralidade?
Evidente que não, meu amigo.
Pois se em um sistema com baixa neutralidade e, dependendo da escolha do projetista, ele favoreceu harmônicos pares ou ímpares, determinados instrumentos soarão ‘estranhos’ (para ser cordial). E se os instrumentos que serão prejudicados terão sua assinatura sônica alterada principalmente na oitava mais alta, esse produto certamente, ao ser reproduzido, perderá sua fleuma musical.
Então, acredito já ter dado a resposta, que Neutralidade e Musicalidade não podem andar separadas. Mas, podemos sim perceber que determinadas eletrônicas conseguem soar mais ‘musicais’ aos nossos ouvidos, ainda que não possuam o mesmo grau de neutralidade.
E como isso ocorre?
Vamos lá. Todo audiófilo já ouviu centenas de vezes que os circuitos valvulados produzem distorções harmônicas mais suaves com uma saturação do sinal mais branda, e que ferem menos nossa audição quando ocorrem.
E que os circuitos de estado sólido, a distorção harmônica é mais abrupta, e isso ocorre pelo fato de o circuito valvulado ter harmônicos pares e o transistor harmônicos ímpares.
Isso, meu amigo, podia ser uma resposta perfeitamente ‘aceitável’ até o século passado. Hoje lhe diria que não mais, pois as topologias evoluíram tanto que se eu te colocar de olhos vendados em nossa Sala de Referência, você terá sérias dificuldades para me dizer se a eletrônica que estou lhe mostrando é transistor ou válvula.
O que podemos lhe dizer é que eletrônicas modernas conseguem soar mais musicais, independente do seu grau de neutralidade, e que para conseguirem vencer esse desafio, obviamente seus projetistas investiram em diminuir drasticamente as distorções harmônicas de seus produtos, e utilizaram escolhas mais ‘corretas’ (entre harmônicos pares ou ímpares).
E QUANTO À NEUTRALIDADE?
Aqui o buraco é tão mais embaixo, que posso lhe dizer que cada degrau novo, deveria ser comemorado com muito maior destaque. E, na minha modesta opinião, isso não ocorre pelo fato de muitos revisores sequer saberem exatamente o que é realmente a neutralidade.
Vou dar um exemplo simples: vamos de novo a flauta, com seus harmônicos pares. Esse instrumento, na mão de um virtuose como o Jean-Pierre Rampal, soará igualmente magistral na mão de um aluno esforçado e talentoso?
O que determinará apresentações distintas aos nossos ouvidos, além da técnica de execução? Muitos revisores, ao ouvir essa apresentação, irão sugerir que ouvimos as diferenças graças à transparência do nosso sistema.
Errado – o que irá mostrar em detalhes as diferenças, será o grau de neutralidade do sistema e não sua transparência.
E aí temos um novo quesito adicional às qualidades inerentes à neutralidade: a intencionalidade na apresentação e execução. E então, adicionamos mais uma qualidade ao buscar a maior neutralidade possível: maior musicalidade e melhor apresentação das texturas e suas intencionalidades.
Mas a neutralidade não traz apenas esses dois benefícios tão essenciais à alta fidelidade, ela traz o componente mais fundamental: a possibilidade de distinção plena e correta entre múltiplas gravações a um patamar jamais antes apresentado. Esse é o grande ‘pulo do gato’ ao se objetivar criar produtos que sejam realmente neutros o suficiente – para fazer emergir esse grau de qualidade tão essencial à reprodução nos equipamentos Estado da Arte.
E a linha Apex de cabos da Dynamique Audio é a única que ouvi até esse momento que, quando instalados em um sistema que também tenha esse mesmo ‘DNA’ sônico, permite um grau de neutralidade que não havíamos ainda experimentado.
Essa questão dos harmônicos pares ou ímpares é tão complexa, que conheço leitores que simplesmente abriram mão de ouvir determinados instrumentos em seus sistemas, pois como soam agressivos, rotularam ser um problema do timbre do instrumento e não de seu sistema.
Nesses casos extremos, ao pedirem minha sugestão, indiquei a eles que tentassem ouvir esses instrumentos ao vivo sem amplificação para ver se era um ‘obstáculo’ auditivo pessoal a altas frequências, ou se era apenas o sistema não sabendo como reproduzir corretamente determinados instrumentos.
Os que não possuíam nenhum problema auditivo, perceberam finalmente onde se encontrava o problema, e aceitaram que seu setup não era tão correto como imaginavam.
Para o teste utilizamos o setup Nagra todo, alimentado pelo set de cabo Apex, com o cabo de força na nossa régua de alimentação, o que fez uma verdadeira revolução no sistema (falarei pormenorizadamente sobre esse cabo na edição de dezembro).
O digital AES/EBU foi utilizado também entre o transporte Rossini e o DAC Rossini Apex da dCS (leia teste 1 nesta edição). O que permitiu ouvirmos em dois setups digitais tão distintos como um cabo verdadeiramente neutro deve se comportar. Acho que não poderia, para avaliar o AES/EBU Apex, dois setups digitais melhores.
Quem nos acompanha sabe que utilizo como referência em AES/EBU o Absolute Dream da Crystal Cable faz muitos anos. E ele sempre se mostrou insubstituível por suas enormes qualidades nos oito quesitos da Metodologia. Ainda que sempre o tenha considerado um cabo que exige de seus pares uma assinatura sônica semelhante. E quando atendido, sempre soa sublime! Então, o Apex não poderia ter um desafiante melhor.
Deixamos o Apex AES/EBU queimando por 100 horas, antes de iniciarmos os testes. Como o setup Rossini estava para chegar, priorizei colocá-lo no nosso Sistema de Referência, e fazer todas as observações possíveis antes da chegada do dCS.
O que posso dizer de diferenças essenciais em relação ao Absolute Dream, é o quanto são difíceis comparações neste nível de patamar, pois ambos são extremamente corretos, precisos, com enorme folga e autoridade na condução do sinal. No entanto, a única comparação possível é a que os faz extremamente distintos.
Com o grau de neutralidade do Apex, o que se ganha é a possibilidade de observar por uma janela mais ampla as diferenças inerentes de cada gravação, a qualidade dos músicos e seus instrumentos, e o grau de acerto e erro do engenheiro de gravação em suas escolhas e finalizações.
O que leva o Apex para um outro grau de perspectiva que nenhum cabo que eu tenha ouvido permite.
Isso é bom?
Meu amigo, dependerá do que você possui de sistema, seu gosto musical, e principalmente o que você entende por etapa final de alta fidelidade. As vantagens são inúmeras, desde que você saiba exatamente o que esperar de um setup todo mais neutro.
Voltemos aos dois exemplos de instrumentos solo com harmônicos pares e ímpares. Ouvindo esses instrumentos no setup todo Apex e com o AES/EBU – tanto nos Nagras como no Rossini – em relação ao Absolute Dream, eles soaram como foram gravados, em todos os discos que coloquei. Se as escolhas do engenheiro de gravação foram equivocadas, ou a qualidade do músico e do seu instrumento não é primorosa, isso ficou audivelmente evidente.
Já com o Absolute Dream, essas evidências não foram tão explícitas, deixando todos os exemplos mais homogêneos. Entende aonde quero chegar? Aí só você para definir o que mais lhe agrada.
Agora, esse setup Apex, quando ligado a um sistema com a mesma proposta, o que ocorre é simplesmente mágico e apaixonante. Pois ainda que as gravações sejam tecnicamente limitadas, o grau de folga do sistema permite audições extremamente prazerosas e corretas.
Esse é o maior trunfo de um setup genuinamente neutro: correção.
E se a alta fidelidade em seu Estado da Arte não primar pela maior correção possível, esse sistema na minha opinião não pode receber essa designação.
Resta, então, a última questão em relação a esse AES/EBU: como ele se comporta longe dos seus pares?
Para isso recorri a deixá-lo sozinho com cabos de interconexão Sunrise Lab Quintessence Edição de Aniversário, cabos de força Transparent Audio G6, e também um interconexão Transparent G6 Reference XL entre os DACs dCS Rossini e Nagra TUBE DAC e o pré Nagra Classic.
E tive uma grande surpresa: ele continuou mostrando sua neutralidade na diferença das gravações de clarinete e flauta, ainda que de maneira menos contundente!
CONCLUSÃO
O AES/EBU Apex da Dynamique é excepcional pelo que não introduz, e pelo que não faz ou coloca no sinal. E isso é um elemento que possui dois lados bastantes distintos na composição de um sistema de alta performance de áudio. Para os que buscam ‘azeitar’ seus sistemas deixando o som mais ‘temperado’ e com um toque pessoal, ele não será uma opção desejável jamais.
Agora, para os que clamam por levar a concepção de alta fidelidade ao seu extremo de possibilidade, não existe nenhuma outra opção mais interessante e consistente até esse momento que alie: musicalidade, naturalidade e correção nesse grau de refinamento!
PONTOS POSITIVOS
A neutralidade na sua máxima possibilidade.
PONTOS NEGATIVOS
A escolha de sua eletrônica precisa seguir essa mesma concepção.
ESPECIFICAÇÕES
Condutores | • Prata pura (5N) sólida • Prata pura (5N) sólida com banho de ródio • Prata pura (5N) sólida com banho de ouro |
Bitola | • 2x 20 AWG & 2x 24 AWG – prata • 2x 21 AWG – prata com ródio • 2x 22 AWG – prata com ouro |
Isolação | PTFE Teflon, super espaçamento aéreo |
Construção | 75 ohm & 110 ohm (Helical array, Quad-balanceada, bitola distribuída) |
Amortecimento / Blindagem | 1x filtro de ressonância / blindagem em malha de cobre de alta-densidade com carbono |
Terminações | Furutech CF-601/602 XLR |
CABO DIGITAL AES/EBU DYNAMIQUE AUDIO APEX | ||||
---|---|---|---|---|
Equilíbrio Tonal | 15,0 | |||
Soundstage | 14,0 | |||
Textura | 15,0 | |||
Transientes | 14,0 | |||
Dinâmica | 14,0 | |||
Corpo Harmônico | 14,0 | |||
Organicidade | 14,0 | |||
Musicalidade | 15,0 | |||
Total | 115,0 |
VOCAL | ||||||||||
ROCK, POP | ||||||||||
JAZZ, BLUES | ||||||||||
MÚSICA DE CÂMARA | ||||||||||
SINFÔNICA |
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