Jean Rothman
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Você comprou sua tão sonhada TV. Desembalou, instalou, acomodou-se no sofá e a imagem está…. péssima. Mas como assim? Os brancos estão azulados, cores super saturadas, tons de pele de pessoas doentes ou parentes próximos do Hulk. E vem a pergunta que todos fazem: “Se eu comprei uma TV novinha de última geração, a imagem não deveria ser perfeita?”
O marketing de uma TV não tem nada a ver com a apresentação de imagens precisas, tem tudo a ver com a venda de mais televisores.
Se você fosse o dono de uma fábrica de TVs e o departamento de marketing viesse e dissesse que eles acabaram de descobrir que as pessoas comprarão mais TVs se as imagens forem verdes, o que você, como Presidente, diz? “Façam as imagens verdes”.
Este duelo entre fabricantes é sobre a venda de TVs, não é sobre a precisão ou imagens corretas.
Para começar, faremos um breve passeio pela memória enquanto olhamos para a história da televisão. Isto começa por volta do ano de 1939, quando os fundadores do sistema de TV (o sistema NTSC) nos Estados Unidos começaram a trabalhar nas especificações do sistema. NTSC significa “Never Twice the Same Color” como zombaria ou National Television System Committee. Enquanto estamos neste jogo de sopa de letrinhas, alguém quer adivinhar como é chamado o nome do sistema de TV de alta definição nos EUA? Vou te dar uma pista, não é chamado de “HDTV”. Na verdade, é chamado de “ATSC”, que significa “Advanced Television System Committee”. Então, em 1939, um dos fundadores disse: “Um dia nosso sistema de TV será capaz de exibir imagens em telas grandes. Imagens tão grandes quanto… 19 polegadas”. O que responde à pergunta que muitas pessoas fazem quando tentam assistir à programação de definição padrão (SD) em sua nova tela de 60, 80 ou 120 polegadas. Por que o material de definição padrão parece tão ruim? A resposta: porque é maior que
19 polegadas.
Então, a televisão em preto e branco começa em 1939. Agora avançamos no tempo para o período de 1952-53. Eles estão trabalhando nas especificações do sistema de TV a cores neste momento. O Governo exige que o sistema de TV em cores seja retrocompatível com o sistema Preto e Branco (P&B) existente. Parte da lógica aqui é que as emissoras de TV acabaram de fazer um grande investimento em equipamentos para transmitir TV em P&B e pedir que comprem mais equipamentos para TV em cores pode ser um pesado fardo financeiro. A questão é, então, como funcionará a compatibilidade com versões anteriores?
O sistema de TV a cores realmente usa o sinal de TV P&B original que já estava lá e simplesmente sobrepõe a cor em cima de uma imagem em preto e branco. É como pegar lápis de cor em uma imagem em preto e branco. Então, pense no nosso sistema de TV a cores como duas partes ou camadas distintas; uma parte de TV P&B e uma parte de TV a cores. Você pode ver isso por si mesmo em qualquer imagem colorida, girando o controle de cores até a extremidade inferior e observando suas cores sumirem. Na maioria das telas, a extremidade inferior é uma imagem sem cor. Isto é preto e branco. Este é o sinal original de transmissão de TV. Isso se aplica tanto a SDTV quanto a HDTV porque a HDTV precisou ser compatível com versões anteriores para suportar SDTV.
Então, a TV em cores possui duas partes; uma para preto e branco e outra para as cores. Mas a TV a cores não é um dispositivo preto e branco. Ela faz sua imagem com base em pixels vermelhos, verdes e azuis. Então, a primeira parte da equação da TV é que ela precisa usar esse sistema RGB para criar uma imagem em preto e branco neutra. Não é um P&B de cor verde ou vermelho ou de cor azul… mas um P&B neutro. A TV é mais do que capaz de fazer isso, mas é aí que os fabricantes de TV se desviam das regras e do padrão da indústria do cinema.
Os fabricantes de televisores fazem uma lição que foi aprendida no negócio de sabão em pó e aplicam-na em nossas TVs. “Isso mesmo, você também pode deixar suas meias mais brancas do que o branco!”
O que é “mais branco do que o branco? Eu não sei, mas essa meia é claramente mais branca que a outra meia (figura acima).
Alguém se lembra qual a cor do detergente para roupas? Azul.
A indústria de sabão em pó gastou dinheiro olhando para a ciência de como os olhos humanos funcionam e descobriram que nossos olhos são mais sensíveis ao azul do que ao branco. Adicione um pouco de corante azul ao detergente para fazer os brancos azulados e os nossos olhos terão a sensação que este branco se destaca dos outros como sendo “mais branco”. Quando você dirige à noite, quais são os faróis dos carros que você vê melhor? Provavelmente são as lâmpadas brancas azuladas de xenônio. Nós percebemos que elas são mais brilhantes que os faróis normais por causa do azul na luz. Achamos que eles são mais brilhantes, mas na verdade são semelhantes aos faróis normais. A sensibilidade ao azul nos engana para pensarmos que é mais brilhante.
E agora voltamos à comercialização de aparelhos de televisão. Em vez de tornar o material preto e branco neutro de acordo com as normas, os fabricantes de TV alteram a temperatura de cor para obter brancos azulados. Brancos azulados atraem a atenção das pessoas, especialmente em uma loja. Nós achamos que é mais brilhante; e como mais brilhante é sempre melhor, agora temos TVs que vendem mais pois chamam mais a atenção.
Muitas pessoas me perguntam sobre por que as TVs simplesmente não saem da caixa com a aparência correta, ou pelo menos o mais correto possível. Por que as TVs não podem sair da caixa corretamente? Você é testemunha da resposta. Eles podem, mas TVs precisas e com imagens corretas não vendem. Os fabricantes querem que suas TVs chamem mais atenção na loja que as TVs dos concorrentes. E para isso, deixam o branco azulado, saturam demasiadamente as cores e aumentam a nitidez. Resultado: imagens totalmente artificiais, como a da foto no início da matéria.
A Sociedade dos Engenheiros de Cinema e Televisão dos Estados Unidos (SMPTE) definiu normas para imagens do cinema e TV.
Uma imagem profissionalmente calibrada apresenta valores corretos de brilho, contraste, temperatura de cor, perfeito equilíbrio de cores e correta saturação das mesmas, garantindo perfeita visualização de detalhes tanto nas altas luzes (partes mais claras da imagem) quanto nas áreas de sombra (mais escuras). É bastante comum em imagens não calibradas vermos uma roupa preta ou camisa branca totalmente “chapadas”, ao passo que na imagem original as mesmas apresentam vincos e dobras, aumentando a sensação de profundidade.
As cores ficam muito mais realistas e nossos olhos percebem de imediato ao observar principalmente tons de pele e cores palpáveis como frutas, céu e árvores.
Quando um diretor finaliza um filme e inicia-se a etapa da produção de Blu-Rays e DVDs, é necessário adequar a paleta de cores para o padrão utilizado em TVs e projetores (REC709). Esta paleta é menor do que a paleta do cinema (DCI-P3). Para isso, o diretor e um colorista repassam todas as cenas do filme utilizando um monitor profissional caríssimo e cuidadosamente calibrado dentro das normas da SMPTE. Eles então ajustam cada cena à nova paleta de cores para que nenhum detalhe se perca e ao final deste ajuste é gerada uma matriz para a gravação dos discos.
Profissionais especializados utilizam um colorímetro e softwares específicos, ajustando precisamente a imagem nos mesmos padrões dos monitores dos estúdios de cinema. Isto garante que você verá filmes exatamente como o diretor concebeu e intencionou.
Além disso, quando assistimos uma imagem descalibrada, com cores ruins e não naturais, nosso cérebro fica o tempo todo “brigando” com a tela. No momento em que assistimos uma TV ou projetor calibrados, a naturalidade da imagem propicia uma enorme imersão no filme, como no cinema.
Outro fator muito importante é a luminosidade, o popular “brilho” da TV. Nos ajustes de fábrica temos uma luminosidade exagerada, normalmente no limite que a TV é capaz de oferecer, justamente para chamar nossa atenção na loja. Assistir um filme de 2 horas em ambiente escuro com a luminosidade muito alta causa enorme fadiga visual e chegamos ao final do filme com a vista extremamente cansada. Foram feitos diversos estudos de luminosidade x fadiga visual onde foram determinados padrões ideais de luminosidade para TVs e projetores. Você já deve ter notado como é agradável a sensação de conforto visual após uma sessão no cinema. Um dos fatores é a luminosidade correta e ausência de fadiga visual.
Por incrível que pareça, assistir TV atualmente com os ajustes de fábrica é o mesmo que comprar um automóvel super esportivo que venha sem nenhum alinhamento e balanceamento. E da mesma forma que alinhar e balancear seu carro requer equipamentos de precisão e um profissional especializado, o mesmo se aplica às TVs, principalmente os novos modelos 4K e 8K com HDR que oferecem enorme resolução e incrível gama de cores e detalhamento.
“Posso utilizar na minha TV os ajustes que vejo nos testes e fóruns da Internet?” Não é uma prática nada recomendada. Veja a explicação a seguir.
A imagem de uma TV ou projetor é resultado de uma combinação de fatores: a TV (ou projetor), cabos, reprodutor de Blu-Ray ou decodificadores de TV a cabo, Receivers, material da tela de projeção (no caso de projetores), cores de paredes, teto, piso e mobiliário. A imagem emitida pela TV ou pela tela de projeção reflete nas superfícies do ambiente e retorna à tela, alterando o resultado final da imagem.
A TV é composta de uma enormidade de componentes, como resistores, capacitores e diversos outros. Se desmontarmos uma TV encontraremos até 1.000 componentes diferentes em seu interior. A tolerância entre componentes de um mesmo lote varia entre 5 a 10%, por questões de custos e escala. Se os fabricantes utilizassem componentes com 1% de tolerância, o custo seria absolutamente proibitivo.
Portanto, a soma destas tolerâncias pode gerar variações de 30 a 50% na imagem de TVs de um mesmo lote.
Entre 2008 e 2010 a empresa Pioneer realizou uma pesquisa baseada no ajuste “Pure” que vinha de fábrica em suas TVs de plasma (consideradas entre as melhores TVs já fabricadas). Verificaram 50 TVs nas quais os proprietários utilizaram ajustes de calibração encontrados em fóruns da Internet. Sabe o que descobriram?
Duas das 50 TVs apresentaram imagens melhores que o ajuste de fábrica, o que significa 4%. As outras 48 TVs apresentavam imagens piores que os ajustes de fábrica.
Portanto, ao copiar ajustes de calibração efetuados em outra TV e outro ambiente, você terá 96% de probabilidades de obter imagens iguais ou piores.
Somente uma calibração efetuada por profissional treinado e competente, utilizando equipamentos profissionais de medição (colorímetros, softwares e computadores) irá garantir que você assista a imagens nos mesmos padrões de monitores dos estúdios de cinema, nos quais os diretores fazem a masterização de DVDs e Blu-Rays.
2 Comments
A matéria serviu apenas de alerta, quais pessoas contratariam um profissional deste para calibrar tvs ?, projetor ainda tem seu apelo .
Olá, moro em São Paulo capital, e venho a um tempo procurando por profissionais de isp level 1 ou 2, não consigo achar gente qualificada, alguém tem ideia de por onde procurar?