Dois mercados crescem a olhos nus, com crise ou sem crise: o de caixas acústicas e de toca-discos (alguém vai espernear e gritar: “e o de fones de ouvido?”, mas este na verdade é impulsionado mais pelos fones mid-fi e low-end, então não atendem ao escopo desta matéria).
E em um mercado com imensa demanda, sempre cabe mais um fabricante, seja para sentar na janelinha e na Primeira Classe, ou na fila do meio na Classe Econômica. A AVM é um renomado fabricante de áudio alemão que acaba de dar seu primeiro passo no segmento de toca-discos, com dois lançamentos: o R 2.3, mais simples e para os iniciantes no mundo analógico, e o R 5.3, com aspirações de se tornar um best-buy no mercado intermediário, mais acima do mercado.
O diretor executivo da AVM, Udo Besser, deixou claro que o R 5.3 foi um presente de aniversário para o seu filho, ao completar 18 anos de vida. “Queria dar a ele algo significativo, e daí nasceu a ideia de um toca-discos, afinal esta nova geração está redescobrindo a magia do vinil”. Udo ressalta que foi um desafio e tanto levar adiante esta ideia, pois era preciso iniciar um projeto do zero sem perder a identidade de todos os produtos da AVM, que primam por um excelente acabamento e um grau de confiabilidade muito alto dos usuários.
O desenvolvimento do primeiro protótipo saiu do papel em 2013 e, no final, acabou sendo o projeto mais caro até o momento da empresa. Afinado o projeto, ambos os modelos foram terceirizados para um fabricante europeu especializado somente em toca-discos, mas Udo faz questão de acrescentar que todo o projeto foi desenvolvido internamente. E Udo quis que tudo fosse feito a seu modo. O R 5.3, que recebemos para teste, utiliza um sistema de acionamento por correia conhecido como ‘Elipso Centic Belt Drive’.
A base, de proporções interessantes, tem 470 x 390 mm, e foi toda construída em um painel de fibra de alta densidade e inerte ao toque dos dedos, e bastante sólido. A parte de cima e da frente do toca disco possuem uma lâmina de alumínio escovado colado no painel, o que dá o ‘caráter’ de padrão AVM. Os pés de amortecimento são parafusados para manter a ressonância muito baixa e bem próxima de zero. O prato pesando 5 kg é todo de acrílico, apoiado em um prato interno de metal que gira dentro do alojamento principal do rolamento montado no chassi, sendo que a correia que gira sobre dois pinos só tem contato com o prato interno nas laterais dele, para diminuir as vibrações geradas no motor. Realmente, depois da velocidade estabilizada, o silêncio do giro do prato de acrílico é bastante suave e silencioso. A velocidade é selecionada por meio de três pequenos interruptores na frente, do lado direito. O motor servo DC tem a velocidade controlada eletronicamente, não sendo possível ajuste fino (algo que na minha opinião, em um futuro upgrade, deveria ser revisto, pois nos concorrentes em sua faixa de preço, a maioria disponibiliza este recurso). Mas a ‘menina dos olhos’ deste toca-discos, sem dúvida, é seu braço de 10 polegadas em alumínio cromado. Não tem quem resista a olhar detalhadamente sua construção e seu acabamento.
Udo disse que optar pelo alumínio cromado teve um custo alto, mas valeu apena todo esforço. O braço já vem instalado no toca-discos e aceita cápsulas de 5 a 8 gramas. O braço permite o ajuste de azimute, VTA e bias (este último através de um pequeno ajuste de polias e pesos) e, claro, o antiskating. Ajustado o braço, o usuário só precisa escolher o cabo RCA que irá usar em seu pré de phono e o AVM Rotation R 5.3 está pronto para mostrar todos os seus atributos.
Me chamou a atenção, nos dois testes que li deste toca-discos, que os articulistas usaram apenas uma cápsula para escrever suas avaliações. Sempre achei que em testes de toca-discos mais sofisticados, o uso de apenas uma cápsula (ainda que seja a de referência do articulista), os resultados podem ser limitados. E quando falamos de um toca-discos e braço absolutamente ‘virgem’ fazendo sua estreia mundial, o ideal seria usar o maior número possível de cápsulas com gramaturas e materiais distintos, para se ampliar o leque de observações. E como tínhamos à mão no momento três excelentes cápsulas, usamos e abusamos do nosso colaborador André Maltese (ainda tenho esperança que ele arrume um tempinho para compartilhar conosco sua vasta experiência no universo analógico), para instalar três cápsulas neste AVM. Começamos com a Transfiguration Protheus, depois trocamos para a Ortofon Quintet Black e, pôr fim, a SoundSmith Hyperion 2, que se encontra em teste e publicaremos em breve nossas observações. O veredicto obviamente será a média das três cápsulas utilizadas, já que o teste foi feito com o mesmo cabo RCA e o mesmo pré de fono (Boulder 500).
A eletrônica utilizada na maior parte do tempo foi: Hegel H30 e power Edge da Cambridge Audio. Pré amplificador Dan D’Agostino Momentum. Caixas: Dynaudio Evoke 50, Kharma Exquisite Midi, Yvette e Sasha DAW, ambas da Wilson Audio.
O R 5.3 possui um ‘agrado’ às novas gerações, que foi instalar um led azul que ilumina o prato em duas intensidades: mais forte e mais suave. Mas os adeptos de pouca luz sobre o acontecimento musical (como é meu caso), podem desligar este ‘efeito especial’. Em tarde de céu de brigadeiro, com um azul tão intenso e sem nuvem alguma, coloquei o primeiro disco para ouvir com a cápsula Proteus: Duke Ellington, Blues In Orbit, um disco que cresci ouvindo nos mais distintos setups analógicos que o leitor possa imaginar. Sei até aonde estão os plocs inevitáveis com tantas décadas de uso, e ainda me surpreendo, quando em um bom conjunto de braço/cápsula e pré de phono, como este LP soa tão bem. O naipe de metais e os solos de Jimmy Hamilton no sax tenor e no clarinete, Ray Nance no trumpete e no violino, ainda fazem os pelos dos braços levantarem. E estamos falando de uma gravação feita em uma única noite em 2 de dezembro de 1959! Uma gravação que faz inúmeros sistemas digitais de alguns milhares de dólares corarem de vergonha com um corpo harmônico esquelético e sem energia, enquanto no analógico os solistas enchem a sala e nos colocam ali a 3 metros dos músicos como se tivéssemos o privilégio de sermos teleportados para aquela noite de dezembro de 1959! Esta magia é que faz com que o vinil, apesar de todos os avanços tecnológicos, mantenha seu posto supremo e encante à tantos ainda hoje. E, pelo visto, esta supremacia se manterá por algumas décadas!
O AVM R 5.3, ainda que zerado (é preciso lembrar aos não familiarizados, que dentro do braço temos cabos que conectam a cápsula ao pré de phono e que este cabo, ainda que de alguns centímetros e muito fino, também precisa de pelo menos umas 20 horas de amaciamento). E, ainda assim, a apresentação do Blues in Orbit foi muito convincente. Baixo ruído de fundo, graves muito bem recortados e definidos, com excelente energia, ótimo arejamento nas altas, mostrando com enorme precisão a ambiência da sala de gravação e os rebatimentos laterais dos solistas.
E uma região média exuberante, e com recorte e foco corretíssimos. O segundo LP que ouvimos, para anotar nossas primeiras impressões, foi Peter Gabriel, Shaking the Tree. Esta uma gravação típica multicanal em que, se o setup não for de alto nível, se torna rapidamente cansativo escutá-la. É preciso um equilíbrio tonal preciso, e que a extensão nos extremos seja a melhor possível em termos de decaimento.
Novamente o resultado foi muito satisfatório, tanto em termos de inteligibilidade como de conforto auditivo. O braço do R 5.3 é, sem dúvida, um acerto e tanto em termos de correção, trilhagem e inércia. Sabemos que, em um braço que não possua essas qualidades, a energia gerada pela cápsula vai se acumulando e voltando em forma de atrito para a própria agulha, fazendo-a tremer e perder a precisão no trilhamento dos sulcos, resultando em um som sujo nas baixas frequências com menor recorte e definição e agudos com uma coloração tonal indesejável.
Ainda ouvimos mais dois LPs antes de fechar o primeiro dia com a cápsula Protheus: Friday Night In San Francisco com o trio Al Di Meola, John McLaughlin e Paco de Lucia (nas versões 33 e 45 RPM). Este é um disco que não faz reféns: ou passa no teste ou enfia a viola no saco e volta para fazer novamente o dever de casa. Meu amigo, já escutei cada barbaridade na apresentação da faixa 1 do lado A – Mediterranean Sundance/Rio Ancho – tão torta tonalmente que os violões soam como se tivesse com corda de aço e não de nylon, para vocês terem ideia da barbaridade que um sistema sem equilíbrio tonal pode ocasionar. Então este disco é matador para avaliação de praticamente todos os itens de nossa metodologia, mas sobretudo para equilíbrio tonal, transientes, corpo harmônico e micro e macrodinâmicas.
Em um sistema digno desta apresentação magistral, o ouvinte terá a chance de estar ali a frente de dois dos mais virtuoses violonistas de todos os tempos, a 4 metros deles. E não conseguir sequer desviar os olhos, tamanho o impacto auditivo/emocional. Interessante que, dependendo do setup analógico, soa mais contundente a versão 45 RPM e, em outros conjuntos braço/cápsula, a versão 33 RPM. Sinceramente não sei ao que se deve esta diferença, já que ambas as prensagens foram extraídas da mesma master (segundo o fabricante). Mas a compatibilidade com diversos braços/cápsulas é maior com a versão 33 RPM. Então, se você for se aventurar a comprar este disco, minha indicação é a 33 RPM, mais barata e mais fácil de conseguir. Só não indico a prensagem nacional de 90 gramas, simplesmente sofrível! Não vale a pena, aí fique com o CD (também sofrível, mas sem os riscos e má conservação dos LPs vendidos em nossos sebos).
E o último LP que escutei neste primeiro contato com o R 5.3 foi o Jeff Beck’s Guitar Shop. Adoro este disco. Quando meu filho, na sua adolescência, trazia algum amigo de escola em casa, e estes jamais tinha escutado LP em sua vida, este era o meu favorito para apresentar o mundo analógico a eles. Suas expressões valeriam um curta metragem, com palavrões típicos de adolescentes explodindo em suas bocas com um misto de riso e completo êxtase! Este disco é um primor para avaliação de todos os quesitos da metodologia. Gostaria, se tivesse a oportunidade de dar um pitaco na mixagem, de um pouco mais de respiro entre os instrumentos, com isso o disco ganharia mais profundidade. Mas em termos de captação é um desbunde. A bateria do Terry Bozzio, como diriam os jovens; “É animal!”. O bumbo é um coice no nosso peito e a massa sonora na amplificação da guitarra do Jeff é um ‘muro de Berlim’!
O R 5.3 passou com méritos neste primeiro encontro, mostrando ser um toca-discos com qualidades suficientes para ganhar um ‘lugar ao sol’ neste competitivo universo de toca-discos hi-end.
Deixamos o cabo do braço amaciando por 20 horas, e as mudanças da primeira audição para a queima foram muito pontuais. Mudanças apenas na extensão dos agudos e uma melhora na média-alta, que encaixou melhor com os agudos. Claro que, para fazer essas observações, ouvimos sempre os mesmos 4 LPs, com o mesmo setup, mesmo volume, etc. E o mesmo procedimento na troca das cápsulas.
Aqui faço um parêntese. Se tivéssemos testado o R 5.3 com apenas uma cápsula, certamente teríamos um teste incompleto. Pois minha experiência diz que um bom braço escolhe a dedo as cápsulas que irão casar bem com ele. Um ótimo braço abre esse leque, e permite que as cápsulas se sintam à vontade para apresentar sua assinatura sônica.
E o braço do R 5.3 me pareceu um excelente braço, pois permitiu que as três cápsulas utilizadas tivessem as condições ideais para mostrar suas virtudes e limitações. Se eu tivesse escolhido apenas uma cápsula para este teste, certamente minhas impressões seriam do conjunto cápsula/braço (pendendo muito mais para a assinatura sônica da cápsula). Dou ênfase a este fato, pois características descritas pelos articulistas dos dois testes que li não bateram com as características que ouvi em duas das três cápsulas utilizadas.
Por coincidência, um dos testes em que o articulista descreve um grave com pouca definição, ele utilizou também uma Ortofon, só que de uma série superior à que utilizei. E mesmo assim, quando instalada a Quintet Black (por ser um modelo inferior à Cadenza que ele usou) não senti os graves embolados ou sujos (Jeff Beck’s Guitar Shop é matador para avaliar os graves).
Voltando às nossas observações, depois da queima de 20 horas ampliamos o leque de LPs para cantores e cantoras, música clássica, étnica, trios de jazz e quartetos de cordas. Vou citar apenas os que mais se destacaram, por abranger vários quesitos de nossa metodologia: Shakti A Handful Of Beauty, o LP Dizrhythmia Too de um quarteto de jazz de músicos de estúdio de Nova York, Patricia Barber Companion, Bill Evans Trio Exploration, e Frank Sinatra September Of My Years – todos discos ‘de cabeceira’, que conheço como a palma das minhas mãos.
Todos, independente da cápsula utilizada, soaram corretamente, e com enorme fidelidade na captação, mixagem, masterização e prensagem (no caso do analógico a prensagem simplesmente pode destruir todo um trabalho bem feito). Mostrando o alto grau de precisão e compatibilidade do braço.
Acostumado há tantos anos com a minha referência, o SME Series V, que tem uma pegada e peso maior, estranhei um pouco, mas não pensem que este braço do R 5.3 de alumínio cromado seja tão delicado como um braço unipivot, pois não é isso. Apenas por ser mais leve que minha referência, levei alguns dias para acostumar. Depois nem pensei mais nesta questão. Uma coisa que gostei muito e achei muito bem sacada, é a colocação de um pequeno imã no apoio do braço, que toda vez em descanso, fica bem apoiado e preso pelo magnetismo. Gostei muito deste recurso – isto certamente foi pensado para evitar que o braço, que já vem preso a base do toca-discos, fique balançando e possa ser danificado nos transportes marítimos, aéreos e terrestres.
Com a troca da Protheus para a Quintet, passamos para um patamar abaixo em termos de performance geral, mas me surpreenderam positivamente todas as qualidades da Quintet. Muito musical, transparente na medida certa, ótimo equilíbrio tonal, texturas e transientes. Em relação à Protheus, perde em termos de macrodinâmica, corpo harmônico e soundstage, mas estamos falando de mais que três vezes o preço. É uma cápsula que entrou no meu radar de cápsulas com uma relação custo/performance muito alta. E pode ser uma opção definitiva para a grande maioria dos nossos leitores que querem uma cápsula hi-end para toca-discos de nível intermediário (Diamante Referência, início do Estado da Arte).
Faltava ouvirmos a Hyperion 2, que acabara de chegar zerada, sem nenhum uso. O fabricante pede no mínimo 50 horas. Então ela foi utilizada no teste muito mais para termos uma ideia do patamar em que ela já sai antes de todo o amaciamento, e para saber do grau de compatibilidade com o AVM.
Bem meu amigo, o teste será publicado em outubro ou novembro (pois recebemos uma dezena de produtos tops para serem avaliados nas próximas três edições), então não quero adiantar muita coisa a respeito da Hyperion 2, apenas que se trata de uma cápsula ‘ponto fora da curva’, literalmente. Capaz de brigar no topo do podium, ou então como diria um grande amigo: “Muita calma nessa hora”. Sua passagem pelo braço do AVM por 14 horas, consolidou o que esse toca-discos tem de melhor: o braço.
A Hyperion 2 tem como conceito de marketing o seguinte slogan: “Detalhes, detalhes e mais detalhes”. E foi exatamente isto que ocorreu. Nos mesmos LPs ‘brotou’ do silêncio uma quantidade de detalhes que jamais ouvi em nenhum setup meu de referência! Uma capacidade e controle de energia que levou duas vezes a baixar o nível de volume de todos os LPs utilizados no teste, até encontrar o volume ideal, com um conforto auditivo maravilhoso.
Ora, senhores, se o braço do R 5.3 fosse o elo mais fraco, essas virtudes não seriam ouvidas com tanta clareza e redundância. Não imagino o quanto mais de surpresas surgirão com braços mais sofisticados (contarei no teste da Hyperion 2), mas que não fez feio o braço de alumínio cromado, não fez.
Para um primeiro produto, e com base em um impulso emocional (de presentear o filho), diria que Udo e a AVM estão de parabéns! O produto possui um excelente acabamento, foi meticulosamente pensado no sentido de atingir um público que deseja um bom toca-discos, que seja fácil de instalar e manter e não tenha pretensões de upgrades futuros.
Faz um ‘mimo’ aos mais jovens com a iluminação no prato, e possui a confiabilidade que os usuários da marca estão acostumados a receber. Tem melhoria que podem ser feitas? Sim, mas podem vir em futuros pacotes ou em novas versões. Mas se também não forem feitas, não impedem o produto como está de ter uma trajetória de sucesso. Eu reveria o cabo RCA que vem nele (ele atende, em um primeiro momento, mas não é a melhor opção para quem tem uma boa cápsula e um bom pré de phono), mudaria o fornecedor da correia (concordo com o articulista de um dos testes que a achou abaixo do produto), e veria a possibilidade do ajuste fino de rotação para uma versão futura. Pois com a variação de voltagem nas grandes cidades, por mais que o motor DC seja de alto padrão, as variações ainda que imperceptíveis podem estar presentes.
Para mim o ponto alto do R 5.3 é, sem dúvida, o braço, com sua construção linda aos olhos e de muito boa compatibilidade com cartuchos tão distintos como os três utilizados no teste. Ele realmente nos pareceu bem neutro (o mais difícil e importante do desafio de se construir um bom braço), permitindo que as cápsulas tenham ‘liberdade’ para mostrarem suas habilidades sonoras.
Se você busca um toca-discos bem acabado, bonito e prático em termos de instalação e compatibilidade, conheça o AVM R 5.3 – ele merece uma audição.
Nota: 88,0 | |
AVMAG #255 Ferrari Technologies (11) 5102.2902 US$ 15.900 |
https://www.facebook.com/avmaudio/videos 325522361594326/
Sempre tive um enorme interesse em ouvir e testar os toca-discos da empresa alemã Acoustic Signature, pois dos três grandes fabricantes germânicos de toca-discos, tive para meu uso pessoal Clearaudio e Transrotor.
Parece coincidência, mas estava justamente lendo o teste do Invictus deste fabricante, quando recebi a cápsula Soundsmith Hyperion 2 e, junto, o distribuidor enviou-me, para conhecer, o Storm MkII e o braço também deste fabricante, o TA-1000.
O amigo e colaborador André Maltese já havia me falado muito bem deste fabricante de toca-discos e enfatizado sua construção e robustez! Na hierarquia deste fabricante, o Storm MkII se coloca no meio, sendo o toca-discos que já recebe todos os benefícios dos modelos superiores a ele, e com a versatilidade de upgrades na fonte, motor, base para um segundo braço, etc.
Ou seja, pode perfeitamente ser o toca-discos definitivo de qualquer audiófilo que deseje parar de investir no analógico, mas não abre mão de todos as benesses que um toca-discos Estado da Arte oferece. Sua construção é impecável, e seus 28 kg de aço nos dão a segurança de que foi feito para durar por um século!
Dos 28 kg, entre sua base para apenas um braço (pois com uma segunda base se acrescenta mais 5 kg ao peso total), 11 kg são do prato em alumínio. O prato possui oito cilindros de cor dourada que são inseridos estrategicamente para amortecer ressonâncias que venham tanto do conjunto braço/cápsula, como do motor. Estes cilindros ressonantes foram ‘batizados’ com o sugestivo nome de Silencer.
O prato também é revestido por baixo por um material de amortecimento de uso exclusivo do fabricante. O motor, externo, é alimentado pela fonte de alimentação Beta-DIG, da própria Acoustic Signature. A empresa defende que o motor precise ter força e energia inercial suficiente para atingir a velocidade adequada do prato, mas depois da velocidade estabilizada ele não pode influenciar na rotação. Portanto, o fabricante solicita, em seu manual, que o usuário antes de passar a rotação para ouvir um disco de 45 RPM, ligue em 33 RPM e deixe a rotação se estabilizar. Depois, com um toque, em apenas 4 segundos a rotação já estará estabilizada para 45 RPM.
O prato é conectado ao motor por uma excelente correia e é possível o usuário fazer os ajustes de rotação, depois de tudo devidamente instalado (braço, cápsula, distância do motor em relação ao prato, etc).
Desde que foi instalado (dois meses já se passaram), nunca houve a necessidade de reajuste fino algum. A fonte de alimentação separada é conectada primeiro ao console que fica à frente do toca disco com os botões de liga/desliga e velocidade, e depois do console um outro fio se conecta ao motor. Quando ligado, a velocidade aumenta gradativamente e uma luz vermelha fica piscando. Quando a velocidade correta foi estabilizada, a luz vermelha fica acesa direto.
A base em que vai afixado o braço é de fácil instalação e o fabricante fornece os gabaritos corretos para diversos braços, como: Rega, SME, e os TA (fabricados por eles). No entanto, é preciso que o usuário tenha espaço para trabalhar e força, para encaixar a base do braço no toca-discos. Munido da paciência necessária, entre o encaixe da base do braço e a instalação da cápsula e ajustes, se você tiver a prática necessária, levará de duas a três horas. Se você não tiver nenhuma vivência com instalação de braços e cápsulas, esqueça e contrate alguém ‘do ramo’. Pois para se ter a performance deste toca-discos, à altura do investimento feito, vale chamar um especialista. Você não correrá nenhum risco de danificar a cápsula, e terá a garantia de extrair do setup todo o seu potencial.
E que potencial meu amigo!
Para o teste utilizamos o braço SME Series V, cápsula Soundsmith Hyperion 2, cabos de braço Quintessence da Sunrise Lab (plugues DIN>XLR), pré de phono Boulder 500 e cabo XLR Ágata 2 da Sax Soul entre o Boulder e o prés Nagra HD e Dan D’Agostino. O restante do sistema: integrado Hegel H590, power Hegel H30 e Nagra Classic Amp (em estéreo e mono bloco). Caixas: Rockport Avior II e Wilson Audio Sasha DAW. Cabos de caixa: Dynamique Audio Halo 2 e Quintessence da Sunrise Lab.
A diversidade de ideias e buscas por soluções que aprimorem a performance no hi-end são uma constante. Cada fabricante tem uma resposta diferente para o mesmo problema. E a forma com que cada um aborda e apresenta soluções, faz com que o audiófilo iniciante fique absolutamente ‘tonto’ com tanta informação antagônica.
Tenho muito cuidado com o leitor que está iniciando sua trajetória, pois ele é bombardeado tão intensamente que muitos desistem no primeiro obstáculo. No mundo do analógico, então, as informações são ainda mais descabidas. Pois o jovem raciocina que somente os mais antigos audiófilos, que conviveram por décadas com o analógico, possam ajudar, e muitas vezes esses ‘anciões’ audiófilos também abandonaram o analógico com a chegada do disquinho prateado. Então seu feedback em relação ao analógico também está defasado em 40 anos! Suas referências são todas ‘vintage’, e ele cultua ainda em sua mente os toca-discos dos anos 60 e 70, como se o analógico não tivesse também mudado de século.
Como diz a garotada: “a fila anda”, e também obviamente andou para o analógico (e como andou). Por outro lado, com a volta do modismo pelos LPs, essas três últimas gerações recebem uma enorme quantidade de informação fake. Como a de que um toca-discos de 900 reais, comprado no mercado livre, irá tocar com sua limitada agulha de cerâmica todos seus LPs. É mentira meu jovem! Este toca-discos de plástico de má qualidade geral irá destruir seus LPs! E seu som será tão ruim como ouvir MP3!
Então fuja desse engodo. Junte seu suado dinheiro e compre um toca-discos decente, que tenha o mínimo necessário de qualidade como: braço que aceite upgrades de cápsulas, que possa ser ajustado decentemente e tenha solidez de construção, um toca-discos que tenha estabilidade na rotação, estabilidade e robustez mecânica, e um pré de phono silencioso e bem aterrado.
Então imagine, na parte de cima, o melômano e audiófilo que busca realizar um upgrade no seu setup analógico, a quantidade de informação desencontrada que ele recebe.
“O melhor é belt-drive!”, “Negativo, o direct-drive é melhor!”
“Pratos de metal têm problema de ressonâncias que voltam para a cápsula, o ideal são pratos de vidro ou acrílico!”
“Motores junto à base não prestam, precisam ser fora da base!”
“Braços unipivot não possuem melhor trilhagem de forma alguma!”
“O ideal são braços de 12 polegadas e não de 9 ou 10 polegadas!”
“Braços precisam de rigidez e serem maciços! Negativo, quanto mais leves e de preferência de madeira, melhor!”
Quem já não ouviu pelo menos algumas dessas frases? Quem já não travou calorosas discussões, defendendo seu ponto de vista? Eu não sei se sou mais prático por ser um articulista e estar neste meio há tanto tempo, ou se é a idade que me permitiu olhar todas essas discussões com um ‘enorme distanciamento’! Antes de mais nada, eu me pergunto: se alguma dessas ‘teorias’ são realmente corretas, e por qual razão a vencedora não prevalece? E a resposta é simples, meu caro Watson! Todas são escolhas.
Pois se prestarmos a devida atenção, existem em todas essas ‘vertentes’ projetos bons e ruins. Toca-discos que funcionam perfeitamente bem e que recebem enorme aceitação do público alvo e outros que são descartados e vistos como bizarrices.
Mas antes que algum engraçadinho queira sair pela tangente, afirmando que não existe então o certo e o errado – não caiam nesta! Pois existem sim parâmetros muito bem firmados e que possibilitaram o avanço do analógico nos últimos 20 anos como nunca antes ocorrerá!
O que precisa ficar claro é que um toca-discos de alto nível como este em teste, é que o fabricante buscou soluções para diversos problemas que são inerentes à reprodução eletrônica de contato mecânico. E são vários problemas, como: vibração, realimentação física do atrito da agulha com a parede do sulco, estabilidade de rotação, ressonância de motor, braço e agulha, ressonância das baixas frequências emitidas pelas caixas acústicas, etc. Problemas reais que, se não forem sanados, colocam por terra abaixo qualquer ‘boa intenção’.
Já testei toca discos que tentam contornar os problemas de vibração desacoplando prato e motor, com molas, suspensão a ar, até o uso de materiais exóticos e ligas exóticas nos pratos e base, para minimizar os problemas gerados por motor e braço/cápsula. E todo o problema não só é audível, como pode tornar uma audição medonha (principalmente em sistemas mais bem ajustados).
Dos toca-discos mais recentes (últimos 5 anos), a solução proposta pela Acoustic Signature para o Storm MkII, me pareceu deveras interessante. Pois ela se baseou em fazer com que o prato seja o ponto crucial a ser trabalhado. Afinal, este é a ponte entre base/motor e braço/cápsula. E conseguir isolar corretamente para que nenhum desses elementos interaja com as ressonâncias do outro, é no mínimo sensato e inteligente! Pois os 8 cilindros inseridos no prato, e batizados como Silencier, acreditem, não são apenas algo com um nome pomposo. Foi uma solução comprovada que focar no prato para impedir que as ressonâncias e vibrações de motor passem para o braço e cápsula, e vice-versa.
E como podemos constatar a veracidade desta afirmação (perguntaria eu, se fosse um leitor)? Ouvindo o Storm. Não precisa de nenhum estudo avançado de física dos elementos pesados, ou qualquer coisa semelhante. Basta ouvir.
O que o Storm trouxe de benefícios para o conjunto braço/cápsula em termos de silêncio de fundo, foi algo impressionante. Este silêncio de fundo só havíamos escutado no toca-discos da Basis (que ainda hoje é o primeiro do nosso Top Five), também com o braço SME Series V e a cápsula Air Tight PCM-1 Supreme.
E, segundo, a estabilidade inercial do conjunto prato e motor. Quando giramos um prato com o motor desligado, ele girará por um tempo, nos melhore projetos, por um bom tempo! E se encostarmos a orelha bem próximo do prato, podemos ver se ele, pelo contato metal/metal cria algum ruído de fundo. E depois de ouvirmos, basta ligar o motor e ver se algum ruído é adicionado ao prato, pela correia ou pelo eixo do motor ou o pino central que liga a base do
toca-discos ao prato.
Meu amigo o Storm é impressionantemente silencioso mecanicamente. Se você colocou a distância correta entre o motor e o prato, e a correia está com a tensão correta (nem muito esticada ou frouxa), zero de ruído! É um dos conjuntos base, motor e prato mais impressionantes que tive o prazer de testar. E estamos falando em um toca-discos intermediário, deste fabricante! Fico imaginando como se comportam e o grau de performance nos modelos mais top! Eu me daria por satisfeito em parar por aqui, pois com todas as suas possibilidades de upgrades em fontes, base para um segundo braço, ele me atende perfeitamente como articulista e melômano!
Como relatei, o Storm está em uso diário há mais de dois meses (para ser preciso, enquanto fecho este teste, já são 9 semanas e meia), e jamais tivemos que reajustar a velocidade nem em 33 ou 45 RPM.
Sua precisão é cirúrgica, e a sensação de que foi feito para durar uma eternidade é cada vez mais consistente. Seu motor impressiona tanto quanto a fonte e o toca-discos pelo acabamento, o silêncio e a precisão. Subir de patamar só mesmo se o audiófilo ou melômano quiser desfrutar dos toca-discos deste fabricante em que o conceito de precisão e silêncio são levados ainda mais ao extremo. Caso contrário, garanto que o custo e performance deste modelo sejam difíceis de superar.
Decidir pelo upgrade final em um setup analógico, nos dias de hoje, não é uma tarefa fácil. Principalmente na faixa de preço do Storm. São centenas de opções de excelentes fabricantes. Esta é a faixa mais concorrida no mercado, e o analógico possui um outro componente muito importante, que se chama design.
Os mais velhos, possivelmente, serão mais conservadores em termos de design, preferindo opções mais tradicionais. Já os que abrem mão do design, não verão nenhum problema em partir para um toca-discos como o Storm MkII, desde que atendam a todas as suas exigências de custo e performance.
Este é um toca-discos diferenciado, com uma série de soluções muito interessantes. Não são muitos os toca-discos nesta faixa de preço que sejam tão versáteis em termos de upgrade. E este é, na minha opinião, um grande diferencial! Mas se nos concentrarmos na questão performance apenas, o leque de opções de concorrentes será ainda mais reduzido. Pois suas qualidades são muito evidentes para serem descartadas. Acredito mesmo que, para se atingir o mesmo nível de performance do Storm MkII, seja preciso se gastar um pouco mais em produtos concorrentes.
De uma construção impressionante e com soluções tão práticas para os velhos problemas de todo toca-discos, o Storm MkII é simplesmente uma proposta tentadora!
Obs: A nota final do Storm MkII foi a média entre os braços TA-1000 e o SME Series V, com a cápsula Hyperion MkII.
Nota: 103,5 | |
AVMAG #257 Performance AV Systems Ltda (11) 5103.0033 Toca-discos: € 11.000 Braço TA-1000: € 3.800 |