Editorial: DOLBY ATMOS MUSIC: AVANÇO OU RETROCESSO?

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Acompanhei de perto toda a repercussão do lançamento do Dolby Atmos Music, na feira de Munique em 2019, em que a Dolby se juntou à eletrônica Bryston e ao fabricante de caixas PMC para apresentar o que a Dolby dizia ser a experiência “mais imersiva” que jamais ouvimos desde o nascimento da reprodução estéreo! Mas todo esse entusiasmo logo se dissipou, quando ficou claro para o mercado que essa experiência Atmos era limitada aos smartphones e tablets Android compatíveis com a versão móvel da tecnologia Dolby, e a quantidade de mídias remixadas era algo próximo de duas dúzias de discos! Seis meses depois do lançamento na feira de Munique, a Dolby procurou parceiros para ampliar seu campo de ação, e fechou acordos com a Amazon e sua caixa acústica inteligente Echo Studio, o serviço de streaming Tidal e a gravadora Universal, para tentar dar sequência ao projeto. No início de junho, no meio da pandemia, a Tidal lançou uma oferta Atmos Music, permitindo que os assinantes do pacote Hi-Fi Tidal experimentem a “experiência imersiva de áudio”. Como nas trilhas dos filmes Dolby Atmos Music da Tidal, o objetivo é: “Que os sons sejam colocados com precisão, adicionando dimensionalidade para criar uma atmosfera de áudio completa”. Esse foi o comunicado apresentado à imprensa escrito em conjunto pelas duas empresas. Em outra parte do texto temos a seguinte ‘pérola’: “O Dolby Atmos Music permite que as pessoas se conectem com suas músicas favoritas de uma maneira totalmente nova, colocando-as na música e revelando o que foi perdido com as gravações estéreo. Os ouvintes descobrirão detalhes e sutilezas ocultas com clareza incomparável. Seja uma harmonia complexa, um solo de guitarra lendário que enche a sala, ou o hálito sutil de um cantor”. Com um comunicado tão ‘retumbante’, fiquei atento quando teria a meu dispor este pacote da Tidal, e no dia 8 de junho eis que recebo o comunicado que já poderia “saborear” e entrar finalmente no século 21 com O Dolby Atmos Music. Respirei fundo, parei tudo que estava fazendo, sentei em frente ao nosso sistema de referência e vi que a Tidal acabara de me disponibilizar 17 músicas para ter um gostinho da audição ‘imersiva’ que será a nova referência de áudio daqui para frente. Confesso que me senti um pouco frustrado com a seleção disponível, de artistas que jamais escutei na vida, como: Booka Shade, Post Malone, Shawn Mendes, Nelly Furtado, Katrina & The Waves, Red Rider, etc. Dessa seleção, só dois nomes que possuo alguns discos: James Brown (que pegaram uma gravação mono do final dos anos 60) e o primeiro disco da cantora e guitarrista Meredith Brooks, quando ela tinha apenas 17 anos. Como não sou um cara preconceituoso, resolvi conhecer todos esses artistas e dei play na primeira faixa – Just Like Tonight de Booka Shade e Craig Walker. Música tecnopop, mal tocada, mal arranjada e mal captada. Pensei comigo: talvez seja proposital, os caras queiram mostrar o milagre de pegar algo ruim e tornar “imersível”! Fica nítido, comparando com a gravação estéreo original, que todo o trabalho foi remixado, alterando volumes nos multicanais, e ampliando a compressão ainda mais para dar uma sensação ao leigo de que agora tudo está mais inteligível! O mais impressionante, no entanto, não é o aumento da compressão para ampliação de volume de cada canal, e sim a tal da ‘grandiosidade’ dos solos em que o instrumento é ampliado na sala do ouvinte. Sabe como é feita a mágica? Brincando com o panpot da mesa de mixagem. O truque beira ao ridículo, do engenheiro de gravação ficar ‘passeando’ com o instrumento de um canal para o outro (as 17 faixas utilizam este efeito bizarro, usado à exaustão pelos grupos de rock no início dos anos 70 nas gravações multicanal). Mas, não pensem que a insanidade acaba aí, amigo leitor. O grau de compressão utilizado na remixagem das gravações é tão grande que conseguiram distorcer a voz do James Brown! Ela está saturada do começo ao fim da faixa de quase 6 minutos! E ninguém virou para o engenheiro que destruiu essa faixa, e o alertou que estava saturando e distorcendo! Sabemos de como a indústria fonográfica e as empresas de tecnologia estão desesperadamente se reinventando, mas eu, sinceramente, nos meus 62 anos, achava que o MP3 havia sido o fundo do poço, e agora vejo que estava redondamente enganado! Vivi tempo suficiente para ver um ‘pacote tecnológico’ ainda mais nefasto em termos de falta de qualidade e criatividade. Alguém precisa avisar ao pessoal do pró-áudio que o hi-end não morreu e ele está aí para desmascarar todas essas ‘invencionices tecnológicas’ estúpidas e ineficazes. Um sistema hi-end de qualidade lhe dá tudo que o Dolby Atmos promete e não cumpre. E só fortalece a necessidade de se manter viva as três mídias físicas que são as referências de áudio desde os anos 50: LP, fita de rolo e CD. Já vimos esse filme muitas vezes, e ainda assim a indústria do entretenimento e a de tecnologia insistem de tempos em tempos de tentar recriar a roda! Foi assim nos anos 70 com a reprodução quadrifônica, nos anos 80 com o CD-Player, e fim dos anos 90 com o DVD Áudio e SACD. Porém, as mídias físicas se mantêm vivas e permanecerão por no mínimo mais duas décadas. E o motivo? A existência do segmento Hi-End que consegue, como um farol, indicar o estágio real em que cada novo padrão se encontra. Acredito que se os engenheiros da Dolby tivessem consultado e ouvido as impressões e críticas do mercado hi-end, eles não lançariam essa plataforma ainda tão embrionária. Pois, do jeito que nasceu, a chance de vingar é nula! Soa mal, causa fadiga auditiva, e quando reproduzido em um sistema hi-end todos os seus defeitos são escancarados. O mais incrível é que, uma das coisas que ele promete com maior ênfase (a imersão no acontecimento musical), quando você escuta em um sistema hi-end, ocorre o oposto. Pois o som é totalmente bidimensional e soa sem profundidade alguma (uma das qualidades mais apreciadas do som estéreo bem feito quando reproduzido em um setup hi-end). Se a indústria fonográfica e de tecnologia de consumo deseja realmente dar um salto de qualidade, a primeira lição é entender o nível de qualidade de reprodução eletrônica que o mercado hi-end atingiu. Pois tudo que o Dolby Atmos Music promete, o Hi-End já cumpre há muito tempo!

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