Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br
Me perguntaram novamente, porque eu não indico muita música moderna, atual, ou mesmo mais “popular” – afinal, não teriam, estas, boas gravações? Bom… a resposta é meio complicada… Fico um tempo pensando no que responder, sem parecer um pouco esnobe, arrogante ou que esteja desdenhando dos outros – afinal hoje não se pode falar mal de absolutamente nada nem ninguém, especialmente do gosto dos outros.
E aqui eu começo o segundo parágrafo e… continuo sem saber o que responder, que não resulte em cercarem a minha casa com tochas e ancinhos nas mãos, gritando “palavras de ordem” (“pega aquele gordo!”).
Vejam, eu ouço numerosos estilos musicais, andei um bom tempo dentro de estúdios, frequentei um número sem fim de concertos e shows de música, conheço um bocado de músicos e já ouvi bem de perto a maioria dos instrumentos musicais existentes ou, no mínimo, mais utilizados – até gaita de fole eu já ouvi de perto, e tive a impressão que, em momentos, dá pra se usá-la para coalhar leite (vou vender a idéia para fábricas de iogurte!). Eu só detesto o banal – tem um bocado de música especial por aí, de todo os séculos, para ficar gastando nossa ‘alimentação do espírito’ com coisas banais, ocas, vazias, de gosto duvidoso.
Eu prezo muito, muito, a capacidade de um instrumentista de tirar bela música de um instrumento, sua capacidade de interagir com outros músicos como se fossem diálogos em um plano superior. Prezo a capacidade de um compositor de, dentro da cabeça dele, sonhar em por tudo isso junto e, depois, trazer isso ao mundo. Prezo a capacidade do produtor musical ou intérprete de criar novos e especiais arranjos, juntando todas as partes de uma música e mostrando sua arte em uma nova.
Nosso bonacheirão e donairoso editor Fernando Andrette, fala bastante da importância da beleza musical, da intencionalidade dos músicos, do quanto bons sistemas de áudio mostram melhor isso – como, talvez, melhores óculos e uma iluminação correta, e o melhor estado de espírito, permitam admirar, absorver e entender melhor a Mona Lisa de Leonardo da Vinci. Da mesma maneira, acredito que um melhor e mais correto sistema de áudio irá permitir que a gente entenda e absorva melhor as melhores gravações (e por ‘melhores gravações’, entenda-se: melhor qualidade sonora e musical também).
Sinto da parte de muitas pessoas a necessidade – ou a obrigação – de consumir apenas (ou principalmente) a música mais nova, a que tiver no mainstream atual. Ora, isso me cheira muito ao que fazíamos quando éramos jovens, quando havia um “abismo” de geração entre nós e os nossos pais, e precisávamos “ser diferentes”, termos o “nosso”. Hoje já não há tanta diferença de gerações, eu acho. E mesmo muitas das diferenças da minhas época eram mais imaginárias do que outra coisa qualquer. Por exemplo: meu pai foi criado com música clássica e a adorava, a vida inteira. Tivemos juntos muitas e longas conversas, audições e troca de LPs e CDs de música clássica, assim como ele mesmo acabou incorporando à discoteca dele coisas como Jean-Michel Jarre, Pink Floyd e Vangelis (que ele adorava, especialmente os discos com o vocalista do Yes, Jon Anderson). Existe muita variedade com qualidade, felizmente!
E assim como Ben Harper vendeu muito disco e encheu muitos shows, e o U2 inegavelmente frequentou as paradas de sucesso mundiais por mais de uma década, podem ter certeza de que o velho e bom Johann Sebastian Bach, com muitas de suas obras, esteve no topo da paradas de sucesso da “Rádio Boca-à-Boca-Barroca” de 1723!
Portanto, o variado cardápio de delivery desta semana traz os seguintes. Primeiro um folk rock moderno, com toques de blues, letras engajadas e muita musicalidade. Em segundo, um dos mais interessantes e instigantes de todos os clássicos barrocos, nas mãos de um extraordinário mestre que é, também, uma personalidade e tanto! E, por último, um rock irlandês da década de 1980 que é, em muitos sentidos, irretocável.
Vamos à eles:
Em outubro de 1998 fui ao Jockey Club de São Paulo, em uma das tendas armadas no estacionamento por ocasião da edição daquele ano do Free Jazz Festival. Fui, na verdade, assistir o show da sensacional Dave Matthews Band – mas, como cheguei cedo, acabei assistindo boa parte do primeiro show dentre as duas atrações da noite: Ben Harper. As tendas eram pequenas, o Free Jazz mais intimista naturalmente, e eu vi ambos shows a poucos metros do palco, obtendo absolutamente todas as impressões possíveis e imagináveis de se obter ao assistir um show. E me lembro de, apesar de ser numa tenda, e ser obviamente um show amplificado (com PA), o som era bem decente.
Nunca tinha ouvido falar em Ben Harper – apesar de que, nessa altura, seus primeiros álbuns já haviam sido lançados. Lembro de algumas coisas sobre o show: a precisão de seus músicos e entrosamento musical da banda, e o sentimento passado pelos vocais e guitarra de Harper – que toca o show inteiro sentado, cantando e tocando uma guitarra slide Weissenborn em seu colo. Aparentemente Harper é notório por ser introvertido no palco, sendo que o principal, para mim, não é sua presença, e sim sua música. Isso me lembra, aliás, que foram feitas críticas quanto à ele “cantar sem sorrir, sem se mover”, e eu podia ser leniente com o crítico, mas ele chamou a Dave Matthews Band de “sub-banda”, e isso não tem nada a ver com gostar dessa banda ou não, mas sim com demonstrar completo e total desconhecimento do que se está falando.
Outras duas coisas marcaram o show de Ben Harper: o baixista, um negro gorducho de nome Juan Nelson (apelidado de “Bass Boss”), que “comia um baixo de 6 cordas com farinha” e ainda dava troco em Euro – e, sim, era o músico mais se mexia no palco, o cara mais fisicamente animado. A outra, e última, lembrança é o fato de que, durante o show, acho que eu e um par de amigos éramos os únicos que não acendemos um “cigarrinho do capeta” – era tanto ar quente que eu achei que a tenda ia começar a levitar como um balão. Cada um se diverte do jeito que gosta…
Ben Harper, competente é, mas pelo meu gosto da época seu trabalho veio me agradar mais apenas na década seguinte, com vários de seus discos – principalmente o Welcome to the Cruel World aqui em questão. A excelente gravação, arranjos nota 10, e a proficiência técnica de todos os músicos, estão bem acima da maioria do folk-rock-pop da época (e de agora também).
Benjamin Chase Harper nasceu na Califórnia em 1969, filho de um negro com ascendência de índios Cherokee e uma mãe judia com ascendência lituana. Harper, que aprendeu a tocar guitarra desde criança, pode ter sua música definida como uma mistura de folk, rock, reggae, blues e soul. Suas influências de blues e folk nasceram no período que ele vivia na loja The Folk Music Center & Museum, de propriedade de seus avós, que era frequentada por luminares como Leonard Cohen e Taj Mahal. E sua influência do reggae vem de ter assistido Peter Tosh e Bob Marley tocando ao vivo.
Também uma criança prodígio, Harper já se apresentava ao vivo aos 11 anos de idade, assumindo como instrumento principal a guitarra tipo slide, influenciado pelo blues de Robert Johnson. Harper, no final da adolescência, saiu em turnê com o blueseiro Taj Mahal, participando da gravação de um disco dele no começo dos anos 90.
Uma curiosidade audiófila é que Harper e o guitarrista Tom Freund gravaram, em 1992, um LP para o selo Cardas: Pleasure & Pain, uma gravação minimalista acústica feita pelo próprio George Cardas, usando seus microfones e cabos, e registrada direto em analógico em um gravador de rolo Studer A80 – e lançado somente em vinil pelo selo Cardas.
Na sequência, Harper fechou contrato com a Virgin Records e lançou seu primeiro disco, aqui apresentado: Welcome to the Cruel World. São, até hoje, 15 discos de estúdio, sendo que alguns são colaborações com nomes como Charlie Musselwhite e o grupo vocal Blind Boys of Alabama.
Harper, que pratica filantropia e tem engajamentos políticos que vão além de suas letras – como participar de movimentos que incitam as pessoas a voltarem nos EUA, e movimentos contra armas nucleares – foi casado com a atriz hollywoodiana Laura Dern (Jurassic Park, Star Wars: Os Últimos Jedi) e é um ávido skatista.
O disco Welcome to the Cruel World, além de ser o primeiro disco de Harper, é o único que usa essa banda de apoio – provavelmente toda de músicos de estúdio. A partir do disco seguinte, e até hoje, a banda criada por Harper permanece praticamente inalterada, e recebeu a alcunha The Innocent Criminals.
Entre os instrumentos usados na diversas faixas de Welcome to the Cruel World, estão: guitarras e violões, gaita irlandesa, bateria, percussão, cello, baixo, acordeon, e numerosos backing vocals. Informações técnicas sobre a gravação? Nenhuma, claro.
Atenção especial deve ser dada às muito boas faixas Whipping Boy, e Don’t Take That Attitude to Your Grave, entre outras.
Pode ser encontrado em: CD / Vinil / Cassete(!!) / Serviços de Streaming selecionados. Conheço o CD e a versão Streaming: excelentes! Sempre ouvi esse disco em digital, e sempre gostei dele, tanto musicalmente quanto pela qualidade de som – é um disco bem feito. A versão em vinil eu nunca peguei nas mãos, mas no momento do fechamento desta edição, tinha um vinil deste álbum para vender no Mercado Livre por R$345,00!!
Política, “bolacha ou biscoito”, e interpretações das Suites para Cello Solo do compositor clássico barroco alemão Johann Sebastian Bach, todas têm algo em comum: elas dividem pessoas em discussões acaloradas mais que times de futebol. Acho que puxam a faca e rola sangue! Certamente rolam maldições! Hehehe…
Em idos da década de 1990 (lá pra 1997 ou 98) estava eu, alegre e pimpão, assistindo a então boa programação da TV à cabo brasileira, quando topei com um sujeito oriental tocando um cello e falando sobre Bach. Só que não era um documentário sobre Bach, era algo diferente, era uma série de vídeos conceituais, seis episódios inspirados pelas seis Suítes para Cello Solo do célebre compositor. Foi o meu primeiro contato com as Suítes, e o primeiro contato com o cellista: Yo-Yo Ma, hoje quase tão famoso quanto os Beatles.
Os vídeos são sensacionais, tanto em suas ideias quanto em suas execuções, mostrando coisas como processo de se criar um jardim no meio de uma grande metrópole canadense inspirado em uma específica das seis Suítes. Ou outro que mostra a criação de uma coreografia de Kabuki, no Japão, também para uma das suites. Todos os filmes são apresentados e conduzidos, estrelados, pelo Yo-Yo Ma e os vários colaboradores envolvidos em cada ideia.
Assistindo todos os filmes (os quais hoje tenho em DVD), e me apaixonando por todas as Suites, comprei o CD duplo que faz a trilha sonora deles: Inspired by Bach – The Cello Suites, gravado pela Sony Classical. Deve-se dizer aqui que a música do disco são as Suites para Cello Solo completas, sem alterar uma nota, sem alterar a ordem, nada. Ou seja, o CD é a trilha da série e é, ao mesmo tempo, uma magnífica interpretação da obra.
Esta é a segunda gravação que Yo-Yo Ma faz delas, sendo que a primeira foi nos anos 80, quando ele era mais jovem. Claro que quem vê ele hoje em dia, acha que nesses filmes o cellista está jovem, mas ele já estava com mais 40 anos de idade, em plena maturidade musical – e isso para mim transparece claramente em sua interpretação.
Johann Sebastian Bach (cujo nome pode ser traduzido como João Sebastião Ribeiro) é um dos mais conhecidos e celebrados compositores do repertório mundial da música clássica, e um dos mais prolíficos também: em 65 anos de vida (nascido em 1685), compôs mais de 1000 obras – apesar de ser mais lembrado por poucas delas, como os Concertos de Brandenburgo, a Paixão Segundo São Mateus, Air on the G String, o Cravo Bem Temperado, entre outras.
Não se sabe exatamente quando Bach compôs as Suites para Cello, mas estima-se que tenha sido entre 1717 e 1723, quando ele ocupava o cargo de Mestre de Capela na cidade alemã de Köthen, e seu título original, no manuscrito, é “Suites para Cello Solo sem Contrabaixo”. Cada uma das seis Suites são divididas em seis movimentos, sendo um prelúdio e mais cinco danças barrocas típicas, como: allemande, courante, sarabande, bourrée, gavotte, minueto e giga. As Suites já foram chamadas por críticos de “danças com Deus”, e alguns de seus movimentos são frequentemente tocados por cellistas em concertos ao vivo, além de já terem sido gravadas por praticamente todos os cellistas proeminentes do mundo.
Uma das coisas que chama a atenção nos seis filmes é a simpatia, eloquência e a paixão musical de Yo-Yo Ma. Claro que falar isso hoje em dia é “chover no molhado”, já que Ma é uma espécie de superstar da música clássica e de vários crossovers com vários gêneros. Mas quem começou a acompanhar o trabalho dele 25 anos atrás, percebe sua integridade musical e técnica. E essa é a segunda impressão que ele me passou com sua música quando vi os filmes: um dos mais perfeitos equilíbrios entre técnica e feeling musical. Yo-Yo Ma é, para mim, um dos melhores e mais completos músicos vivos e em atividade.
Yo-Yo Ma nasceu em 1955 em Paris, filho de chineses: uma mãe cantora e um pai violinista e professor de música, que migraram para a França em uma época de conflitos comunistas na China. Ele foi uma criança prodígio e começou a tocar violino e viola, e depois cello, assim que teve tamanho suficiente para segurar o instrumento. E logo, quando Ma tinha apenas sete anos, a família mudou-se para Nova York, nos EUA, onde acabou por tocar para presidentes americanos com sete anos, e apareceu em um concerto na televisão aos oito, sendo regido por ninguém menos que Leonard Bernstein. Entre outras apresentações honrosas, Ma tocou na Casa Branca para uma platéia que incluía o então presidente Reagan, e a princesa Michiko e o príncipe Akihito da família real japonesa – isso já na década de 80.
Ma estudou na célebre Juilliard School of Music, aos 19 anos, tendo como mestre o célebre pedagogo e cellista Leonard Rose, e se formou no Harvard College em 1974 (do qual recebeu um doutorado honorário em 1991). Sua carreira foi, digamos, meteórica – e ainda é! A lista de trabalhos relevantes, participações e projetos dele é tão grande que só pode ser apresentada se for itemizada, senão ficaria parecendo bula de remédio de tão longa e cheia de vírgulas.
Praticamente tudo que Yo-Yo Ma gravou, vale a pena ser ouvido. Porém, acho que vale a pena destacar certos trabalhos, participações em trilhas sonoras, entre outros: as trilhas de O Tigre e o Dragão e Sete Anos no Tibete, como solista na Symphony 1997 do compositor chinês Tan Dun (por conta da devolução de Hong Kong para a China), como parte do grupo Silk Road Ensemble trazendo música de vários países da Rota da Seda, CDs com música brasileira, música de Astor Piazzolla, de Ennio Morricone, colaborações com o guitarrista Carlos Santana, o violonista James Taylor e o compositor minimalista Philip Glass, além da extensa discografia de música clássica propriamente dita. Totaliza mais de 90 discos, sendo que 18 deles ganharam Grammys.
Entre as curiosidades sobre Yo-Yo Ma, está que ele foi nomeado Embaixador da Paz da ONU, em 2006, durante a direção de Kofi Annan, e que foi nomeado pela revista americana People como o “Mais Sexy Músico Erudito” – que ele diz ser a pior qualificação à qual ele já foi exposto.
Yo-Yo Ma utiliza, em geral, três instrumentos. O principal é um cello do mestre veneziano Domenico Montagnana, de 1733, que recebeu o nome Petunia, dado por uma estudante de Ma: em uma aula, a estudante perguntou se o instrumento tinha nome, e Ma respondeu graciosamente: “Não, mas se eu tocá-lo para você, você dá um nome?”. O segundo é o cello stradivarius chamado Davidov, que era tocado pela célebre cellista inglesa Jacqueline du Pré, e foi passado à ele quando ela faleceu em 1987, e que Ma usa somente para o repertório barroco. E o terceiro instrumento é um cello de fibra de carbono feito pela célebre empresa Luis and Clark, luthiers de Boston, nos EUA.
Fica aqui o registro que, como profundo apreciador da arte musical, e também das técnicas de gravação, eu acho que deveria ser obrigatório haver informações e documentação de todas e quaisquer gravações decentes já feitas. Seja para poder falar sobre em artigos de música em revistas especializadas, seja para técnicos diletantes como eu aprendermos e entendermos sempre mais um pouco. Dito isso, a única informação técnica interessante que eu achei sobre este disco é que o engenheiro de gravação foi Charles Harbutt, que foi o engenheiro principal da Sony Classical do final da década de 80 até meados da de 90 – ou seja a Sony empregou o melhor que eles tinham à disposição.
Destaque para todas as faixas, da primeira à última, em “repeat” no aparelho de CD ou no Player do serviço de streaming – uma obra imortal!
Pode ser encontrado em: CD duplo / Serviços de Streaming selecionados. Obviamente um disco que merecia um vinil, que provavelmente ocuparia um disco quádruplo, já que tem acima de 2 horas e 20 minutos de duração – e que vale cada minuto!
Minha adolescência foi nos anos 80 portanto eu, como fã de rock, ouvia U2 com uma certa frequência – e é uma banda que me traz boas lembranças dessa época. Anos atrás, quando eu ouvia mais rock, eu costumava indicar o disco Rattle & Hum para os amigos, em vinil, como um disco de boa qualidade sonora. Mas, um dia desses, eu simplesmente lembrei da banda U2, e pensei: onde andam esses caras? Os trabalhos mais recentes deles não me agradam muito, mas eu pelo menos estava consciente do aparecimento deles na mídia. Tenho a impressão que já faz algum tempo que U2 virou uma banda para o grupo de fãs que eles já têm, para o pessoal mais velho.
Enfim, a época do trabalho do U2 que eu considero mais bem elaborada é, justamente, a década de 80, com discos excelentes como Boy, War, The Unforgettable Fire e The Joshua Tree, que traziam os maiores sucessos da banda, os hinos que todos sabiam cantar, o trabalho mais criativo – como Sunday Bloody Sunday, New Year’s Day, Pride (In the Name of Love) e With or Without You. Após esse período, na década de 90, a banda começou a mudar sua sonoridade e a ‘se reinventar’ – foram em direções que não me eram tão interessantes quanto é a qualidade inicial da banda.
Então por que não escolher um disco desses aí citados para indicar aqui nestas mal traçadas linhas? Motivos: Rattle & Hum é um disco parcialmente ao vivo, que traz convidados de primeira, mais músicos na banda de apoio, uma boa maturidade da banda, interpretações energéticas, além de trazer boas faixas de alguns dos discos citados acima. E é um disco que tem fortes influências de raízes sonoras americanas, trazendo blues, folk e gospel ao som irlandês um pouco politizado – carrega um grande tributo à música americana, com faixas de Bob Dylan (e participação dele), além de uma participação do blueseiro BB King, um cover dos Beatles, e um coral Gospel em uma faixa. E é um disco mais bem gravado que os outro deles desta época – principalmente sua prensagem em vinil.
O U2 tem uma história longa, em um carreira que vem, oficialmente, desde 1980 até hoje, como banda internacional, com discos lançados. A banda começou a ser formada em 1976, na escola Mount Temple Comprehensive High, em Dublin, na Irlanda, com o nome de Feedback, quando o baterista Larry Mullen Jr, então com 14 anos de idade, pôs um anúncio procurando músicos para formar uma banda. Com a resposta vieram o vocalista Bono (Paul Hewson), os guitarristas The Edge (David Evans) e seu irmão Dik Evans, e o baixista Adam Clayton. A Feedback (depois chamada durante pouco tempo de The Hype) tocava principalmente covers e sua principal influência era o punk rock. Em 78, com a saída de Dik Evans, a banda se consolidou sob o nome U2 (sugerido por um amigo) e, ao ganhar um show de talentos local, usaram o dinheiro para gravar um demo e mandá-lo às gravadoras – sendo que em fevereiro de 1980 conseguiram assinar com a Island Records. O primeiro álbum, Boy, trouxe o primeiro single de sucesso no exterior: I Will Follow. E o resto, como diz o ditado, entrou para a história.
Muito conhecidos no mundo inteiro, o U2 lançou seu melhor disco de estúdio, The Joshua Tree, em 1987, trazendo uma enormidade de sucessos mundiais, como: With or Without You, I Still Haven’t Found What I’m Looking For, e Where the Streets Have No Name, com uma mudança de sonoridade garantida pelos produtores do disco, Daniel Lanois e Brian Eno.
Me parece que essa fase toda do The Joshua Tree, com o Rattle & Hum no meio, chegando ao disco Achtung Baby, foi a de maiores mudanças na música da banda – o que, na minha opinião, garante o Rattle & Hum como muito interessante, porque pega o melhor dos vários mundos dos anos de mudança, e por ser algo mais livre na criação e influências da banda, já que estavam em pleno sucesso e recebendo apoio financeiro de gravadores e até o estúdio de cinema Paramount Pictures. Explico: o projeto do disco Rattle & Hum não foi apenas o álbum, mas também um filme em preto e branco, estilo documentário, que começou sendo financiado pela própria banda, mas acabou encampado pela Paramount Pictures após seus custos de produção ficarem muito altos. A Paramount, por sua vez, estreou o filme dos cinemas no mundo todo – inclusive no Brasil, onde eu me lembro de ver noticiado, mas acabei não assistindo. As críticas ao filme são mistas, como sempre, mas devido a ele não fazer tanto sucesso assim, muitos críticos disseram coisa como: o filme é monótono, mal iluminado, e sofreu com a super promoção por ter migrado de um projeto de documentário de uma turnê para uma produção hollywoodiana.
Parte das faixas do disco (um vinil duplo) são gravadas ao vivo na turnê do disco The Joshua Tree, em várias localidades nos EUA, que incluem faixas inéditas, covers, participações e até faixas de discos anteriores. O resto é material inédito, de estúdio. A tonalidade do material todo é um pouco eclética, mas é altamente influenciada por música americana, blues e folk.
Rattle & Hum chegou a vender mais de 14 milhões de cópias, e acabou sendo certificado como disco de ouro e de platina em vários países, assim como foi primeiro lugar nas paradas de sucesso no Reino Unido, EUA, Austrália e vários países da Europa.
Não há nenhuma informação sobre técnica de gravação, neste caso, também – mas isso era de se esperar de uma gravação comercial de um grupo de sucesso internacional.
O destaque especial vai para as faixas Van Diemen’s Land, e When Love Comes to Town, e para quase todo o resto do disco.
Pode ser encontrado em: CD / Vinil duplo / Serviços de Streaming selecionados. Este disco em digital é bem decente, mas ele brilha realmente em vinil – uma compra obrigatória e fácil, já que ele, por ser de 1988, existe no excelente vinil nacional em profusão. Claro que o objetivo é achar uma prensagem americana ou européia – ou mesmo uma japonesa! Em 2002 houve uma pequena prensagem em vinil na Europa, em 180 gramas, mas que deve ser muito difícil – e até um bocado cara – de se obter.