PLAYLIST DE AGOSTO
agosto 13, 2021
Opinião: POR QUE O SETUP CORRETO PARECE SER TÃO RARO DE SE ENCONTRAR?
agosto 13, 2021

Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br

Costumava rir ou dar de ombros com as besteiras que escreviam a respeito do vinil, principalmente nas mídias não especializadas.
Mas com o ‘aquecimento’ na venda de discos novos e usados dos últimos anos, eis um tema que voltou à tona, e todas as ‘baboseiras’ propagadas por décadas voltaram a ser publicadas aos quatro cantos, como ‘verdades absolutas’.

Então resolvi, em respeito aos leitores mais novos, dar continuidade à série – que aqui tratou da importância das cápsulas e braços – e agora falar um pouco a respeito dos ‘mitos’ em relação ao LP.

Geralmente, para tentar explicar o interesse ainda hoje pelos LPs, os artigos começam falando de como é legal o contato físico com o disco, as capas, os encartes com detalhes da produção, e ouvir a obra completa sem pular as faixas. Outros buscam explicar a ‘magia do áudio’ pelo calor da sonoridade, afirmando ter o LP um ‘som quente’, ao contrário do CD que tem uma sonoridade mais ‘fria’. E, finalmente, estes artigos nos lembram que muitas obras não foram relançadas em CD, o que justifica a procura por essas obras na única mídia lançada.

Eu vou direto ao ponto ‘nevrálgico’ desta questão: o LP não morreu pelo simples fato de ser ainda uma mídia com um grau de performance que, junto com a fita de rolo, ainda são as referências em termos de qualidade de áudio! O resto é apenas ‘confeitaria’. Pois tivesse o CD-Player uma qualidade superior ao LP, esta mídia também teria sucumbido, como a fita K7, o cartucho de 8 pistas, a DCC (a fita K7 digital), a fita de vídeo Betamax, etc.

O mercado é implacável com o que se torna obsoleto – não se iludam. Então este ressurgimento nada tem a ver com modismos ou tendências retrô, como muitos alardeiam e faturam em cima.

Veja a quantidade de vitrolas oferecidas a menos de 1000 reais no Mercado Livre. O que é preciso lembrar aos mais jovens é: LPs para tocarem bem necessitam de um sistema à altura, e isso custa caro, meu amigo, além de ser muito mais complexo de montar do que tentam lhe vender.

Vitrolas e toca-discos de entrada só irão estragar seus discos, nada mais que isso. Já escrevi a respeito uma dezena de vezes, mas continuarei insistindo, enquanto tiver um leitor pedindo ajuda para montar um sistema analógico de até 2 ou 3 mil reais! Esqueça, pois com essa grana você jamais desfrutará o que o vinil tem a oferecer.

Entendo que você ache que estou sendo muito ‘radical’ na minha posição, portanto vou descrever nas próximas linhas todos os obstáculos a serem vencidos para você extrair do analógico tudo que ele pode oferecer. Vamos lá:

VITROLAS OU TOCA-DISCOS DE PLÁSTICO

Seus LPs em equipamentos deste nível, irão soar muito pior que qualquer streamer de entrada decente. Além de, cada vez que você ouvir seus discos nestes equipamentos, você estará destruindo os sulcos do LP. Até que um dia o LP estará esbranquiçado!

Tenha-os como decoração e nada mais que isso, se for o caso!

VITROLAS OU TOCA-DISCOS DE PLÁSTICO

É triste a comparação da mesma obra um disco prensagem nacional com um importado – e não estou falando de prensagem alemã ou japonesa, que são as melhores ainda hoje. O quanto falta de informação das mais simples, como mais decaimento ou detalhes de microdinâmica, como até erros mais graves: na apresentação do Equilíbrio Tonal, por exemplo.

Peguei três LPs que tenho a prensagem nacional e a importada. Duas inglesas e a terceira americana, dos discos: Eric Clapton –
Unplugged, Bill Evans – You Must Believe In Spring, e Laurie Anderson – Strange Angels. É preferível mil vezes ouvir as versões em CD destas três obras, que as prensagens nacionais.

Agora, em um sistema analógico de bom nível, as três prensagens importadas, ‘massacram’ a versão digital.

É importante salientar todas essas questões, pois vejo inúmeros de nossos novos leitores, por confiarem ‘cegamente’ nos mais velhos, acharem que precisam embarcar nesta onda do analógico para poderem desfrutar do verdadeiro som hi-end. Pois lhe digo que será a barca mais furada na qual você pode entrar, se tiver que começar do zero, e a mais cara e frustrante também, caso não tenha consciência de todos estes percalços que estou lhe apresentando.

As diferenças entre a prensagem nacional e a importada, se assemelham a ouvirmos duas mixagens e masterizações completamente distintas. No disco da Laurie Anderson, frequências no grave e no extremo agudo, foram completamente ‘limadas’ na versão nacional! Falta corpo na região médio grave, além dos planos e a microdinâmica ter sido reduzida ao mínimo necessário, para a obra não ser desqualificada.

Ainda que em doses de erros menores, tanto o Eric Clapton como o Bill Evans também têm erros grosseiros, de Equilíbrio Tonal, corpo harmônico, textura e planos.

Então, raciocine comigo: vale mesmo a pena investir em um setup analógico de alto nível e ter uma coleção de LPs comprados nos sebos, todos nacionais? Infelizmente boas prensagens nacionais são exceção, principalmente de obras importantes da música brasileira, seja ela cantada ou instrumental. E vender a ideia de que ainda assim será melhor ouvir essas obras em LP do que CD, é bastante relativo, acredite. Pois em muitas dessas obras, a masterização para a venda de uma nova fornada de LPs a preços exorbitantes, a fita master já não é mais a original e sim uma remasterização do digital.

Aí entramos em uma outra das mais ardilosas armadilhas: vinis fabricados através de master integralmente digitais. Aqui tenho escutado as mais célebres barbaridades em termos de comparativos, para tentar convencer o jovem que o LP soa sempre melhor que o digital.

Quando ouço este tipo de argumento, pego três exemplos atuais: LPs do Ben Harper (geralmente o The Will To Live), da Madeleine Peyroux – Bare Bones, e o Jack Johnson – Sleep Through The Sting. E mostro primeiro em CD, e depois em LP.

O pior em LP, de longe, é o Ben Harper, e aqui eu me pergunto a razão de soar tão abaixo em LP, já que em CD ele soa muito bem. E possui um dos melhores corpos harmônicos que escutei em música pop comprimida e equalizada. O trabalho feito em LP foi catastrófico, pois até isso se perdeu. Chamo a atenção do ouvinte para esses detalhes, e para o trabalho nos pratos no LP, que foi totalmente ‘ceifado’. E para o outro extremo, em que os graves na versão analógica foram turbinados – o que consequentemente alterou o Equilíbrio Tonal de todo o disco. Certamente a visão do engenheiro encarregado da remasterização para o analógico, traz a ideia equivocada de que que precisava ‘alterar’ o que era excelente na master digital, causando este estrago retumbante.

O mesmo ocorreu no disco da cantora Madeleine Peyroux, em que o corpo do analógico é mais pobre que no digital, e o arejamento simplesmente sumiu no LP!

O que chama atenção nessas prensagens analógicas, é justamente a incapacidade dos engenheiros se manterem fiéis às masters originais. Tenho uma tese pessoal para estes erros ‘grosseiros’, mas como não conheço a fundo o trabalho destes profissionais e sua ‘cultura’ com o analógico, prefiro omitir minha opinião pessoal.

Mas fica aqui o alerta, para você que acha que comprar discos de 180 gramas de obras contemporâneas seja uma garantia de excelente qualidade, pois não é.

Quanto ao LP do Jack Johnson, este como o da pianista e cantora Diana Krall – Live in Paris, estão acima da média, sendo um ‘oásis’ no meio deste universo árido de lançamentos mais recentes em vinil. Pelo menos as qualidades das masters originais não foram adulteradas a bel prazer do engenheiro, podendo sim mostrar com ‘solidez’ os encantos do analógico.

Agora, imagine sair do zero para montar um setup analógico e ter que ir em peregrinação aos sebos e à Amazon para montar sua discoteca, e ter que saber separar o joio do trigo! É uma tarefa hercúlea e sem nenhuma garantia de sucesso no final!

Essa é a realidade nua e crua, meu amigo. Então se você não herdou uma discoteca bem cuidada e com excelentes gravações, esqueça, e gaste seu tempo e dinheiro na compra de CDs, que estão sendo colocados à venda aos milhares pelo mundo afora.

Eu tenho comprado em média de 25 a 40 CDs mês, com esta onda do streaming. Obras absolutamente maravilhosas em todos os gêneros e estilos musicais existentes. Alguns CDs importados em excelente estado de conservação por 30 reais – este é o caminho, meu amigo. Se você não resolveu trocar a mídia física pelo comodismo mais uma vez (como milhares fizeram lá atrás com os LPs), agora é a hora!

Mas se você já tem um bom setup analógico, mais de 200 LPs bem conservados, e deseja continuar aumentando seu acervo, acho que as dicas aqui levantadas podem lhe ser úteis.

Mas, lembre-se: nunca os preços dos LPs usados foi tão inflacionado, então fazer um bom ‘pente fino’ será essencial, para adquirir apenas obras que lhe sejam imprescindíveis!

E aos que estavam achando que só com um setup analógico você terá um sistema Estado da Arte: esqueça essa bobagem, por favor. Pois com o grau de evolução dos DACs, agora você pode desfrutar de toda a beleza que sempre esteve armazenada nos disquinhos prateados também!

1 Comment

  1. Adriano Nazareth disse:

    Muito interessante este seu artigo. Sou um adepto do vinil há muitos , porque não encontrava no CD a qualidade que o vinil oferecia. Hoje, apesar de continuar a ser fã do disco preto (e detentor do estado da arte em turntable), começo a sentir uma verdadeira frustração na compra de novos discos porque observo que muitos deles soam pior do que a versão CD e até alguns pior do que a versão streaming. Interesses de mercado ou desleixo? Não sei.

    Parabéns e abraço
    Adriano

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