Fernando Andrette
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Na verdade, essa playlist era para ter sido publicada na edição de novembro, mas com a morte repentina do Nelson Freire, optei por adiar para outro momento.
Continuo com a explícita intenção de arrancar vocês leitores da zona de conforto, com gravações e artistas que exigem atenção e foco redobrado. Tenho esperança que alguns de vocês gostem de serem ‘cutucados’. Se, porém, estiver errado, é só se manifestarem que volto à estrada principal sem aventurar-me pelas estradas vicinais, rs.
No entanto se quem ‘cala consente’, manterei essa linha de escolha, ok?
Vocês decidem e eu cumpro!
Yuri é um saxofonista holandês, nasceu em 1965, e seu primeiro trabalho foi para o selo Jazz In Motion Records, lançado em 1998. Eu o conheci somente em 2001, ao ganhar de presente o disco Memory Lane lançado pelo selo Turtle Records, em SACD.
O que me chamou a atenção é sua visão de grupo e não de um solista acompanhado de um grupo. O que permite que tanto seus trios e quartetos trabalhem as melodias, e não apenas sirvam para solos intermináveis e muitas vezes voltados apenas para mostrar sua virtuosidade ou técnica refinada.
Dois trabalhos seus ganharam prêmios internacionais e críticas muito positivas: Yuri Honing And Floris – Phase Five, lançado em 2009 pelo selo Verve Records, e o North Sea Jazz Legendary Concerts que foi lançado em CD e DVD-Video em 2013.
Desire é de 2015 e foi lançado pelo selo Challenge Records.
Eu gosto mais de suas formações com quartetos do que trio, mas é uma questão de gosto. Vale a pena se você apreciar essa indicação, ouvir as duas formações. O que me agrada nos quartetos, é que os arranjos soam (para mim) mais elaborados e com maior liberdade para todos os músicos, justamente pela entrada do piano.
Esse é um trabalho que não dá para ser pano de fundo enquanto preparamos uma refeição ou colocamos a correspondência em dia. Pois os temas exigem concentração e total internação para se entender a proposta musical do grupo.
Em um sistema bem ajustado tonalmente, é possível observar o quão cuidadosa foi a captação, mixagem e masterização.
Nossos leitores assíduos de longa data sabem de minha admiração por essa excelente pianista francesa. Suas gravações, feitas para o selo Deutsche Grammophon, estão cada vez melhores técnica e artisticamente.
Essa compilação foi lançada ano passado, e dá a oportunidade àqueles que não a conhecem de ouvir Hélène tocando Debussy, Chopin, Bach, Sawhney, Silvestrov, Gluck, Schumann, Beethoven, Bartok, Mozart e Rachmaninoff.
Nasceu em 1969 e, aos sete anos, decidiu estudar piano. Sua formação musical ocorreu no Conservatório Nacional Superior de Música e Dança de Paris e, inicialmente, no Conservatório Regional de Marseille. Poucos sabem que além de uma das mais importantes pianistas de sua geração, Hélene também é escritora e compositora. Aos 13 anos, ganhou o prêmio do Conservatório de Paris e foi aluna de Gyergy Sándor (aluno de Bela Bartok) e de Leon Fleisher (aluno de Maria Curcio).
Seus três livros já publicados (em 2003, 2005 e 2013), são quase que autobiográficos, sendo o primeiro (Variations Sauvages), uma descrição com muito humor de sua infância, adolescência e sua rebeldia em aceitar regras familiares e escolares.
O segundo livro (Leçons Particulieres), tem um tom mais introspectivo, filosófico e poético em que a autora se questiona sobre o sentido da vida, os concertos, viagens, escolha de repertório e a busca da perfeição e o tempo que está sempre a nos apressar.
E seu último livro (Retour à Salen), mostra sua volta às raízes familiares e perguntas ainda sem respostas.
Mas o que é mais notório em Hélène é sua proteção aos Lobos, com a criação até de uma Fundação para defendê-los. Ela se tornou uma especialista no assunto e corre o mundo fazendo palestras e lembrando as novas gerações que é preciso salvar o habitat antes de falarmos em preservação das espécies.
Mas se você imaginou que as virtudes desta múltipla mulher se esgotaram, saiba que Grimaud tem a capacidade pessoal conhecida como sinestesia, que a faz representar a música com cores. Para ela, ré menor é sempre azul escuro, dó menor é sempre preto, sol é verde, fá é vermelho, e si bemol é amarelo. E ela explica: “A cor muda com cada modulação, mas a cor dominante é a da tonalidade em que a peça foi escrita. Não me ajuda necessariamente a memorizar as obras que toco, mas é, no entanto, uma coisa bonita de experimentar”.
A primeira vez que escutei Grimaud tocando foi um disco com obras de Chopin, e o que me chamou muito a atenção foi sua digitação, tão firme (lembrando a de Nelson Freire), mas com um toque emocionalmente mais sutil.
Fiquei aturdido de sua técnica unir de maneira tão magistral precisão e emoção, e desde aquele primeiro disco acompanho com grande interesse sua carreira.
Se o amigo leitor ainda não conhece, este é um belo disco para apreciar toda a exuberância técnica de Hélène Grimaud.
Alisa nasceu em Nova York em abril de 1982. Começou a tocar violoncelo (pasmem!) com 4 anos, e aos 13 fez sua estreia profissional tocando com a Orquestra de Cleveland, apresentando Variações de um Tema Rococó, de Tchaikovsky.
Desde os 12 anos se apresenta com seu pai, Donald Weilerstein, o violinista fundador do Cleveland Quartet.
O que admiro nessa impressionante cellista é trabalhar fora do repertório clássico existente, que as gravadoras adoram impor aos solistas para garantir o retorno do investimento. Alisa sempre fugiu do lugar comum, preferindo trabalhar com compositores contemporâneos, como: Osvaldo Golijov, Lera Auerbach e Joseph Hallman.
Foi ela que foi escolhida para a estreia, em Nova York, de Azul – um concerto para cello de Golijov – além de, na sequência, apresentar a estreia dos 24 Prelúdios para Violoncelo & Piano, de Auerbach.
Em 2016, nova estreia com Outscape, o segundo concerto para violoncelo de Pascal Dusapin, com a Orquestra Sinfônica de Chicago. E, em março de 2017, executou a estreia mundial do Concerto para Violoncelo & Orquestra de Matthias Pintscher, com a Orquestra Sinfônica de Boston.
Seu instrumento é um William Forster, de 1790, com uma sonoridade de tirar o fôlego pela clareza, energia e dramaticidade, exploradas por Alisa minuciosamente.
Escolhi para vocês justamente um disco solo, para que todos em um bom sistema percebam a virtuosidade do músico e a beleza do timbre do instrumento. É uma gravação feita para o selo London e lançada em 2014. Com obras complexas que exigem de mais do solista, de inúmeros compositores, como: Kodály, Golijov, Cassadó, Sheng, Ligeti, Britten e Prokofiev.
Não tem, com esse repertório, como não colocar à prova seu sistema em termos de textura, corpo harmônico, transientes e equilíbrio tonal.
Boa Sorte meu amigo!
Meu amigo, estou apaixonado por esse disco lançado independente pela própria cantora em 2020, em pleno início da pandemia. Ainda que já tenha escutado dezenas de vezes, a cada nova audição descubro algo novo.
Yumi Ito é uma vocalista, compositora, produtora e arranjadora nipo-polonesa, que mora em Basel, na Suíça. Seu pai é japonês e sua mãe polonesa.
Ela mesma define suas composições como uma: amálgama de jazz, arte pop, eletrônica e neoclássica, que pode ser arranjada e executada a capela ou com um trio ou um grupo de até 11 músicos.
Ela já dividiu palcos com Mark Turner, Al Jarreau, Becca Stevens e músicos ainda em começo de carreira. Já se apresentou em todos os grandes festivais e casas de jazz, de Montreux ao Blue Note em São Paulo (não me perdoo de não ter ido).
Escolhi esse disco por ser, na minha opinião, o mais elaborado e ela estar acompanhada de 11 músicos de excelente nível para executar seus belos arranjos e apresentar suas ideias melódicas complexas. Gravado em 2019 e lançado em 2020, o amigo terá uma excelente oportunidade de conhecer essa genial cantora, compositora e arranjadora.
Decidi que, a partir de agora, quem vier com a ladainha que nada de novo está surgindo, farei a pessoa sentar e ouvir esse disco no nosso Sistema de Referência, ok?
Brincadeiras à parte, se dê uma chance e escute esse belo disco, meu amigo. Só não precisa ouvir a última faixa, pois sei que seria pedir demais, rs.
Espero que gostem desta Playlist – a primeira de um ano que parece ser uma incógnita em todos os sentidos.
Ouçam muita música, e se cuidem, sim?