Fernando Andrette
fernando@clubedoaudio.com.br
Se você não esteve desconectado do mundo nesses últimos dois anos e meio de pandemia, certamente sabe que o glamour do vintage voltou com tudo, da moda aos utensílios domésticos (está faltando ressurgir apenas no setor automotivo). E no segmento de caixas acústicas, cada dia surge um novo modelo, nos transportando diretamente para as décadas de 60/70, nos anos dourados, em que toda família de classe média tinha um sistema de áudio em sua sala de estar (nem que fosse um móvel enorme com tudo acoplado).
Eu vivi essa fase intensamente, e posso garantir que ter uma caixa de enormes dimensões no meio da sala era sinal de status, e um belo porta-copos e cinzeiros em dias de festas.
Claro que os grandes fabricantes de caixas acústicas, desses anos dourados, que sobreviveram à décadas de mudanças na maneira de ouvirmos nossa música, estão surfando nessa onda vintage ‘de braçada’ e ditando as regras, já que para eles ‘relançar’ seus maiores ícones se tornou quase que obrigatório.
Então era uma questão de tempo para o fabricante francês Elipson pedir aos seus engenheiros para mostrar como soariam hoje suas caixas daquele período, assim como fizeram (e com enorme sucesso) JBL, Mission e Wharfedale.
No entanto, como esse mercado vintage começa a ficar mais competitivo, entrar nessa onda necessita de que as empresas encontrem algum diferencial significativo para colher frutos.
E a Elipson optou por buscar esse diferencial no preço final ao consumidor!
Ao receber a Heritage XLS 15, me assustei com seu peso e com o volume da embalagem, pois estávamos ainda com a JBL L100 Classic em teste, e pudemos mesmo antes de abrir a caixa, observar que era ainda maior em tamanho que a JBL.
Ao desembalar as caixas, com ajuda de meu filho, é que notamos que as semelhanças com a JBL não acabam aí. O woofer de
12 polegadas também possui um cone branco e ainda que a Elipson seja mais alta e mais larga, o gabinete é muito semelhante, me lembrando que todas as caixas dos anos sessenta e setenta eram assim.
Outra semelhança é o pedestal baixo inclinado, idêntico ao da JBL, e que também necessita de quatro braços, para colocar a Elipson sobre eles.
Os bornes da caixa, arriscaria dizer que são os mesmos que da JBL, com o mesmo problema para rosquear, já que são muito próximos e de difícil acesso. Nesse caso a Wharfedale deu uma aula com suas caixas ‘vintage’, pois renovou onde era fundamental – e bornes de caixas também são fundamentais, tanto quanto falantes, crossover e gabinete.
As semelhanças com a JBL acabam aí, já que seu falante de médio de 44 mm é um domo de cúpula de seda, assim como seu tweeter de 25 mm.
Os cortes de frequências da Elipson também são bem distintos e interessantes, com o woofer trabalhando dos 40Hz até 700Hz, passando para o falante de médio que vai de 700Hz a 5000Hz, entregando ao tweeter nos 5000Hz, que vai até os 25kHz. Esse corte se mostrou bastante interessante, e foi possível perceber as vantagens dessa escolha nas nossas audições.
O fabricante fala em uma sensibilidade de 92dB para uma impedância de 6 ohms (valor mais próximo para uma medição em câmara anecoica). Diria que para salas normais de audição, a sensibilidade real da Elipson seja de 89dB, que já é suficiente para poder trabalhar com amplificadores em salas pequenas a partir de 20 Watts.
Como a maioria das caixas ‘vintage’ da atualidade, o consumidor pode ajustar em 1dB para mais ou para menos os médios e agudos, para se adaptar a acústica da sala de audição. E eu diria: esqueça esse ajuste e deixe a caixa, depois de amaciada, em flat – se você deseja o melhor equilíbrio tonal delas!
Por experiência, sabia só ao olhar aquele enorme woofer de cone de papel, que a queima seria longa (bota longa nisso), assim como foi das duas JBL (L100 Classic e L82 Classic).
Feita a primeira audição para minhas anotações pessoais, deixei-as nas mãos do belo amplificador integrado Willsenton R8 (leia teste na edição de outubro), que também estava em fase de amaciamento – e só voltei a ouvi-las após 100 horas de queima.
Os médios e agudos com 100 horas, com ajuste em flat, já se mostraram bem encaixados e já foi possível perceber que a escolha dos engenheiros em estender os médios até os 5kHz foi extremamente acertada, e o encaixe para a passagem para os agudos se mostrou suave e sem nenhum vale ou pico.
Em compensação, os graves ainda eram o ‘grave de uma nota só’, e os médios-graves completamente recuados. Tanto que se o revendedor mostrar a Heritage XLS 15 nesse período de amaciamento, não irá vender nenhuma! Pois realmente o que se escuta, é assustador!
Voltando para a ‘sala de tortura’, deixamos a Elipson por mais 200 horas, só amaciando com gravações de órgão de tubo (Fuga de Bach, noite e dia).
Para o teste utilizamos os seguintes equipamentos. Amplificadores integrados: Sunrise Lab V8 edição de aniversário (leia teste na edição 287), Krell K-300i (leia teste edição 286), e Willsenton R8 (leia teste edição de outubro de 2022). Powers: Nagra HD. Pré de linha: Nagra Classic. Digital: Nagra TUBE DAC, Transporte Nagra. Analógico: Pré de phono Gold Note e toca-discos Thorens TD 1610 (leia teste edição 287). Cabo de caixa: Virtual Reality Trançado. Cabo de interconexão: Kimber Kable Carbon RCA (leia teste 4 nesta edição).
Depois de 300 horas, finalmente os graves apareceram com peso, corpo e autoridade. Faltava ainda velocidade, mas pelo menos já foi possível deixá-las na sala de teste com o sistema e ir ouvindo inúmeros gêneros musicais à medida que fechávamos os testes da edição de julho e agosto.
O que nos surpreendeu nessa fase, foi que mesmo fora da posição ideal, com caixas entre elas, sua imagem, foco e recorte no centro do palco eram bastante fidedignas. Mostrando que aquele enorme gabinete tinha muito a oferecer em termos de imagem sonora, quando estivesse no ponto ideal de audição.
A velocidade nos graves levou mais 80 horas – então, meu amigo, se você for um futuro comprador dessa caixa, é bom se munir de enorme paciência e colocar na cabeça que, antes de sair mostrando sua nova caixa, serão necessárias 400 horas de queima.
Ao buscar seu melhor posicionamento, descobri outra enorme semelhança com a L100 Classic: seu posicionamento é exigente e minucioso. Caso contrário, a altura do acontecimento musical sempre será mais baixa que o ideal. Para se corrigir esse obstáculo, sugiro que se comece por estabelecer a distância entre as paredes laterais e as costas das caixas. O primeiro passo é que a reprodução nas baixas frequências seja limpa, e para que isso ocorra, elas terão que ficar entre elas a pelo menos 2 m de distância. Se atente à quantidade de toe-in possível, pois elas não gostam de um ângulo muito voltado para o centro de audição, pois perdem uma de suas maiores virtudes: uma imagem ampla em termos de largura e profundidade.
O segundo passo, enquanto os graves nos guiam à escolha da posição ideal, é a distância das paredes. Elas, pelo seu tamanho, precisam de ar. Lembre-se que elas foram projetadas para salas entre 16 a 32 metros quadrados – usá-las em espaços menores será jogar seu dinheiro fora.
No mínimo elas precisam de 70 cm das paredes laterais e 80 cm da parede às costas delas. Mas se você quer deixá-las respirar de verdade, 1 metro no mínimo de todas as paredes, dará um excelente resultado, pois irá descongestionar os planos, foco e recorte.
Sem esse minucioso posicionamento na sala, o equilíbrio tonal será prejudicado. No entanto, se feito, a Heritage SLS 15 lhe recompensará com excelentes audições.
Outra dica importante: ainda que possua um gabinete imponente, é uma caixa para se ouvir em volume ‘correto’, pois se você se exceder no volume, ela tende a deixar o som mais frontalizado, perdendo a magia dos planos que ela apresenta. Mas não pense que nos volumes corretos, soará fria ou sem emoção. Pelo contrário, ela possui a capacidade de reproduzir em volumes corretos a música de maneira integral e muito cativante.
Seus graves possuem autoridade, peso e deslocamento de ar suficiente mesmo em baixa pressão sonora (entre 60 e 80dB), o que possibilita longos períodos de audição sem fadiga auditiva. Mas sua magia está na região média, com um grau de transparência incrível para sua faixa de preço (50% a menos que a L100 Classic), com uma apresentação natural e riquíssima em micro detalhes. Essa característica possibilita uma apresentação pormenorizada das texturas e intencionalidades.
Os agudos são corretos, sem nunca soarem brilhantes ou fatigantes. Essa escolha tem um preço: menor sensação de ambiência. Mas antes isso do que termos que ‘aposentar’ parte de nossa coleção por não conseguirmos ouvir os agudos.
Os transientes são corretos, porém sem aquela precisão cirúrgica que ouvimos em caixas com woofers menores – mas nada que tire o prazer de escutarmos música com forte marcação rítmica e variação de andamento.
A dinâmica é excelente, tanto a macro como a micro, mas com o adendo de jamais extrapolar o volume da gravação, pois ainda que os fortíssimos sejam reproduzidos, o endurecimento com o aumento de volume excessivo irá estragar essa passagem.
Os amantes de corpo harmônico (como o nosso colaborador Chris Pruks), iria ter orgasmos auditivos ao ouvir essa Elipson. Pois ela realmente sabe como reproduzir o tamanho real dos instrumentos (desde que fielmente captados). Ouvindo obras sinfônicas com os naipes soando uníssonos, é um verdadeiro deleite ‘ver’ aquela imensa imagem sonora à nossa frente. Um excelente exemplo de corpo harmônico correto? Início do Quarto Movimento da Nona de Beethoven, com os contrabaixos tocando com arco. Nesse quesito, a Heritage XLS 15 é uma referência para qualquer caixa, independente do preço.
A materialização física do acontecimento musical dependerá sempre das melhores gravações existentes – nesses exemplos a sensação de estar acontecendo à nossa frente, será quase real!
CONCLUSÃO
Sempre, ao fechar um teste, a primeira pergunta que me vêm à mente é: A quem esse produto seria interessante? A resposta imediata é: a todo melômano que passou a vida buscando uma caixa dentro de seu orçamento e que possua sinergia com sua eletrônica (geralmente vintage ou mais de entrada). A este segmento arrisco dizer que essa caixa será o paraíso sonoro, pois ela não será exigente com seus pares, nem tão pouco seletiva ao extremo para se negar a tocar com eletrônicos mais antigos.
Mas, à medida que fui escrevendo o teste, tive que ampliar esse leque de consumidores aos que também amam válvulas – pois o casamento dela com o integrado Willsenton R8 foi magistral – como se tivessem sido feitos sob medida! Até no preço são semelhantes.
E, por fim, aos consumidores audiófilos que aprenderam a preservar sua audição e desejam uma caixa que possa lhes dar prazer em ouvir seus discos em volumes seguros, e não perder as nuances e detalhes de cada gravação.
Se você tem uma sala maior que 16 metros quadrados (o ideal seria de 20 a 25 m), e procura uma caixa com essas características descritas no teste, recomendo uma audição.
Ela pode lhe surpreender, só tenha a certeza de ouvir uma com 400 horas de amaciamento, por favor!
PONTOS POSITIVOS
Uma caixa musical e de alta compatibilidade com todas as topologias de amplificadores.
PONTOS NEGATIVOS
Precisa de espaço para seu ajuste correto.
ESPECIFICAÇÕES
Tipo | Caixa 3-vias compacta |
Tweeter | 22 mm domo de seda |
Médio | 55 mm domo tratado |
Woofer | 300 mm polpa de celulose – Bass-reflex frontal |
Resposta de frequência | 40 Hz a 25 kHz (+/- 3 dB) |
Crossover | 700 & 5000Hz |
Sensibilidade | 92 dB (1m/1w) |
Impedância | 6 Ohms |
Amplificação recomendada | 50 – 200 W |
Potência | 200 W |
Dimensões (L x A x P) | 420 x 730 x 339 mm |
Peso | 28 kg |
Peso embalada | 34.5 kg |
CAIXAS ACÚSTICAS ELIPSON HERITAGE XLS 15 | ||||
---|---|---|---|---|
Equilíbrio Tonal | 11,0 | |||
Soundstage | 11,0 | |||
Textura | 11,0 | |||
Transientes | 11,0 | |||
Dinâmica | 11,0 | |||
Corpo Harmônico | 12,0 | |||
Organicidade | 10,0 | |||
Musicalidade | 12,0 | |||
Total | 89,0 |
VOCAL | ||||||||||
ROCK, POP | ||||||||||
JAZZ, BLUES | ||||||||||
MÚSICA DE CÂMARA | ||||||||||
SINFÔNICA |
Impel
(11) 3582.3994
R$ 16.930