Vinil do Mês: MARILLION – BRAVE (EMI / PARLOPHONE, 1994)

Espaço Analógico: TIPOS DE TRAÇÃO DO PRATO DO TOCA-DISCOS
julho 5, 2024
Playlist: MÚSICA PARA APRECIAR E AVALIAR SEU SISTEMA
julho 5, 2024

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Todo mês um LP com boa música & gravação

Gênero: Rock Progressivo

Formatos Interessantes: Vinil Duplo Importado / Nacional

O Marillion é uma banda inglesa de rock neo-progressivo, ativa e famosa a partir do começo da década de 80. Muitos acham que a banda é escocesa porque o primeiro vocalista da banda, o Fish, é escocês – mas todos os outros membros são ingleses, exceto o tecladista, Mark Kelly, que é irlandês.

O mundo é dividido entre os que adoram Marillion e os que não suportam ouvir a banda. Eu até entendo esses últimos, quando são fãs ferrenhos do progressivo original da década de 70, e também quando são os que gostam da influência do jazz-rock, do clássico e do improviso no rock progressivo – coisas que não tinham no neo-prog. Além disso, o Marillion – que foi seu expoente de maior sucesso no mundo todo – teve sua primeira fase com o vocalista Fish sendo um grande imitador de muitos dos trejeitos e tons de voz de seu ídolo Peter Gabriel. E, claro, os fãs do progressivo raiz odiavam isso.

Ainda na ativa, muito do trabalho da segunda fase do Marillion mudou tanto o som da banda, com muita influência pop, pós-punk e depois hard rock, que eu mesmo não sou muito fã. A primeira fase, até 1988, tinha o vocalista Fish (nascido Derek William Dick), e a segunda fase, de 89 até hoje, traz o vocalista inglês Steve Hogarth (que frequentemente responde pela alcunha ‘H’).

Capa da edição original de 1994

A voz e o estilo de H é tão diferente do Fish, que realmente parecem duas bandas diferentes. A maior parte dos primeiros discos da banda com ele, são realmente mais calcados no pop, e bem menos no neo-prog – tanto que desde a década de 90 que eu não considero mais o Marillion como uma banda de progressivo.

Mas, bem no meio da década de 90, eles resolveram fazer sua obra-prima: Brave! Que este ano comemora 30 anos de existência, aliás. E, como todo real amante de música sabe: não existe música velha ou nova, existe música boa, e existe música ruim. Grandes discos e grandes obras sempre foram concebidos, e sempre serão.

E que ninguém se engane: Brave é rock progressivo da melhor estirpe! É diferente do que havia na década de 70? Claro! Mas é um disco que, para mim e para muitos, constará para sempre na prateleira dos grandes discos, no panteão do rock progressivo.

É um ‘álbum conceito’ – como foi feito muito nesse gênero musical – onde todas as faixas viram uma faixa só, com a continuidade de um só tema ou de uma história sendo contada, e sua sonoridade é bem mais rock progressivo do que neo-prog.

Selo da edição remixada

No caso, a história da obra é baseada em algo que apareceu nos noticiários, onde uma adolescente foi encontrada, com amnésia, perambulando pelas proximidades da grande ponte sobre o rio Severn, na Inglaterra, na divisa da Inglaterra com o País de Gales. O ocorrido ficou na memória do vocalista Hogarth – pois lhe parecia como as primeiras páginas de um livro de mistério. E, anos depois, foi usado de inspiração para uma história, um conceito geral para o álbum – a história de uma adolescente que sofreu abusos em um lar disfuncional, e foge para o mundo, de seu nascimento até sua juventude – e inclui temas bem pesados, como drogas e suicídio – resultando no mais ambicioso, e melhor, trabalho da banda até hoje. E isso inclui performance superior de todos os músicos envolvidos, e alguns dos mais belos solos do fenomenal guitarrista Steve Rothery.

Brave sendo trocado ao vivo

No Reino Unido, e em boa parte do mundo, os discos da banda saíam pelo selo EMI, mas nos EUA era pela gravadora I.R.S. Records, a qual foi fundada e pertencia a Miles Copeland, um prolífico produtor de discos que foi o empresário do The Police e da carreira solo de Sting. Por ‘coincidência’, Miles é irmão de Stewart Copeland, exímio baterista do The Police! E, vale lembrar que tanto Miles quanto Stewart são filhos de Miles Copeland, um dos fundadores da agência de inteligência norte-americana, a CIA (!).

Miles acabou por alugar para a banda, por três meses, seu Chateau Marouatte, no sudoeste da França, para onde eles levaram seu equipamento de gravação e puderam compor, arranjar e gravar em paz e sossego – e em uma atmosfera que, segundo alguns membros da banda, lembrava os antigos e bons filmes de terror em castelos.

O disco anterior, Holidays in Eden, não tinha feito o sucesso que a gravadora esperava – e era, também, muito pop e muito comercial. E então veio Brave, elaborado e complexo, bebendo da sua fonte no rock progressivo – que era o completo oposto de Holidays in Eden. Assim como a banda diz que Brave alienou vários de seus fãs, eu acredito que a saída de Fish da banda, e seu primeiro disco muito comercial, foram responsáveis pela perda de vários fãs hardcore, de mais de década.

Marillion na década de 90

Ou seja, uma situação de mudança radical e um disco comercial, alienou fãs do Marillion como banda de rock progressivo – e um disco complexo e elaborado não só como conceito mas como obra e instrumentação, um disco bastante mais intelectual, alienou fãs ‘comerciais’ e mainstream. Acho que a banda já estava fadada a sair do mainstream de qualquer maneira.

A crítica achou que Brave misturava bem o rock progressivo chamado de ‘sinfônico’ (acho que pelas proporções almejadas e duração da obra) com rock mais moderno (mas menos do que se imagina) – e elegeu o disco como um dos “20 Melhores do Ano de 1994” e, alguns anos depois, um dos “30 Melhores Álbuns dos Anos 90”. E, em 2003: um dos “30 Melhores Álbuns Conceituais do Rock”. Eu concordo.

O Marillion (sim, o nome foi tirado do livro Silmarillion do autor inglês J.R.R. Tolkien) foi formado em Aylesbury, no sul da Inglaterra, em 1979, lançando seu primeiro disco em 1983 – e ainda estão na ativa com um público seguidor fiel. Em Brave, o vocalista Steve Hogarth, também nos teclados e percussão adicionais, foi acompanhado de Steve Rothery na guitarra, Mark Kelly nos teclados, Pete Trewavas no contrabaixo, e Ian Mosley na bateria. Além deles, havia Tony Halligan na gaita irlandesa, e cellos e flauta da Filarmônica de Liverpool. Toda a ambiência da gravação foi captada pela engenharia de som no próprio Chateau Marouatte e imediações (incluindo uma caverna!).

Encarte do vinil duplo

Para quem é esse disco? Para todos os fãs de rock progressivo e de rock mais elaborado e complexo. Porém, fãs ferrenhos de como o rock progressivo era na década de 70, podem não aceitar o que Brave traz de diferente, sua sonoridade mais atualizada para a década de 90. O critério é, sempre, de quem ouve.

Prensagens boas? O disco saiu bem em um dos últimos anos de produção de vinil – então lhe foi dada ênfase no CD. Porém, existe uma prensagem britânica em 1994 mesmo, assim como uma prensagem brasileira, dupla também, no mesmo ano. Em 2013, a EMI relançou o disco em 180 gramas (o que ela fez para vários discos do Marillion, com qualidade de som duvidosa). E, em 2018, saiu de novo em vinil – com melhor qualidade – como parte de vários relançamentos de discos do gênero rock progressivo remixados por Steve Wilson (da banda Porcupine Tree) pelo selo Parlophone – eu ouvi e gostei muito da remixagem.

Ouça um trecho da faixa The Great Escape, no YouTube (no disco não tem esses diálogos do vídeo abaixo, não se preocupem). Boas férias escolares de julho – com muita música!

Ouça um trecho da obra no YouTube.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *