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PRÉ DE PHONO GOLD NOTE PH-10
Fernando Andrette

Ainda que esteja em recuperação da mão direita e em início de fisioterapia (serão ainda alguns meses até a recuperação plena dos movimentos dos dedos e da força na mão), tinha que colocar minhas observações no notebook, mesmo ‘catando milho’.

Meu primeiro contato com essa marca italiana de produtos hi-end ocorreu quando assisti um vídeo da feira de Milão, e conheci o belíssimo toca-discos Mediterrâneo, com sua bela mistura de madeira e metal. Descobri ali que todo o toca-discos era totalmente produzido pela própria Gold Note (inclusive seu engenhoso braço e cápsulas). Nos dias de hoje, em que a concorrência exige corte de custos, levando a produção para a Ásia, a Gold Note encontra-se na contramão desta tendência, fabricando produtos que não custam seis dígitos (como muitos dos produtos suíços e alemães).

Com a publicação em uma das edições recentes do hi-end pelo mundo de um produto da Gold Note, o distribuidor oficial para o Brasil, a Living Stereo, nos procurou oferecendo o PH-10 para teste. Claro que não iríamos recusar a oferta.

Com dimensões bem modestas (200 x 80 x 260 mm) e pesando apenas 4 kg, o PH 10 não dá muitas pistas, ao primeiro contato, de toda a sua enorme versatilidade e qualidade de áudio. Seu gabinete, com aberturas laterais, possui um design sóbrio, muito bem construído e muito prático nos ajustes todos que oferece. Seu painel frontal apresenta o selo/logomarca no canto esquerdo no alto, sua tela fica ainda do lado esquerdo, acabando quase ao centro do painel – e o único botão que comanda todas as funções encontra-se no lado direito. Nada de chaves DIP, em que o usuário necessita de uma lupa e um palito de dente para ajuste de carga e ganho, que existem em todos os pré de phono mais baratos do mercado.

Os engenheiros da Gold Note foram ousados e substituíram estes comutadores DIP por um seletor frontal, que apertando por cinco segundos coloca o pré em funcionamento, apertando de novo você seleciona nove opções de ajuste (10 Ohms a 47K Ohms) e quatro ajustes de ganho, além de três diferentes curvas de equalização mais utilizadas pela maioria dos bons prés de phono, mais a curva da Decca-London e American-Columbia, para o usuário ‘brincar’ se tiver discos dessas gravadoras em sua coleção (eu tenho centenas e usei com enorme prazer).

O fabricante disponibiliza o produto em três cores: preto, prata ou dourado. O modelo enviado foi na cor preta. Impressionei-me com a quantidade de conexões, como: dois conjuntos de entradas phono (podendo se conectar dois toca-discos ou dois braços de um só toca-discos), saídas balanceadas e RCA, tomada IEC, dois aterramentos independentes, conexão para uma fonte externa dual mono PSU-10 e uma entrada USB para futuras atualizações. Ligado à tomada, basta seguir os seguintes procedimentos para colocar o PH-10 em uso: pressione o botão por 3 a 5 segundos, ele sai de stand-by e sua tela acende. Para selecionar a opção desejada, basta pressionar o botão novamente e na tela irá aparecer, no canto do display, o que você estará ajustando. Aí você pressiona novamente e mexe para a direita ou esquerda até encontrar o ajuste desejado.

O legal é que você pode fazer tudo isso com o disco tocando, sem risco, pois ele entra em ‘mute’ até o novo ajuste escolhido estar pronto. O RIAA eu indico manter no modo universal, principalmente se você não tiver gravações da Decca ou Columbia. Agora caso você disponha de discos dessas duas gravadoras, valerá a pena ouvir e comparar. No meu caso, senti sempre uma melhora tanto no equilíbrio tonal, quanto no soundstage adequando a curva de equalização correta a cada disco, mas dependerá do nível de sua cápsula e braço para você observar ou não melhoras.

Para o teste utilizamos a cápsula Sumile, braço SME Series V, toca-discos Air Tight e os seguintes cabos: Sunrise Lab Quintessence (XLR e RCA), Sax Soul Ágata (XLR e RCA), Timeless Guarneri (RCA) e Ortofon Reference Black. Pré de linha: Audio Research REF 6 e Dan D’Agostino Momentum. Power: Hegel H30 e Audio Research VSi75SE. Cabos de força no PH-10: original de fábrica, Transparent PowerLink MM2, Timeless, e Reference SE Sunrise Labs.

O PH-10 veio praticamente lacrado (a caixa não estava, mas o aparelho não tinha funcionado nem por dez horas). Fizemos nossa primeira audição para as primeiras impressões por cerca de seis horas e gostamos muito de tudo que ouvimos. Ainda que nesta primeira audição ele tenha se comportado de maneira bastante restrita nos dois extremos, e com um palco bastante frontalizado, os timbres e a sensação de conforto auditivo se mostraram muito convincentes, mostrando ao ouvinte que ele irá proporcionar audições muito prazerosas.

Muitos prés de phono, antes de todo o amaciamento, costumam ter um caráter muito embotado (ou fechado), com pouco corpo nas baixas e uma sensação que a queima irá durar uma eternidade! Não é o caso do PH-10. A cada dia as melhoras, além de audíveis, foram se tornando empolgantes, pois com apenas cinco dias de audição (de 5 a 6 horas por dia), a transformação foi surpreendente.

Muitos dos nossos novos leitores nos questionam como observamos essas mudanças no comportamento do produto no processo de queima. É simples: nesta fase utilizamos sempre os mesmos discos, o mesmo volume, o mesmo setup de cabos e de equipamentos e, sempre que possível: no mesmo horário. Com a experiência adquirida realizando audições há mais de cinquenta anos, eu já nem anoto todas as diferenças encontradas a cada mudança no período de queima, me concentrando apenas naquelas mudanças significativas, que indicam a evolução do produto. E cápsulas, prés de phono, caixas acústicas e cabos são os produtos mais ‘esquisitos’ em termos de performance nessas primeiras 200 horas. Pois não existe uma metodologia que explique tamanha variação de um produto para outro produto similar. Com um agravante no caso de cápsulas e prés de phono: você tem obrigatoriamente que acompanhar minuto a minuto desta queima. Então, não preciso nem dizer o quanto gostei do PH-10 com a evolução de apenas uma semana.

Com 60 horas os graves já tinham aquele colchão de sustentação, peso e velocidade – ainda que o corpo parecesse um pouco tímido em relação ao nosso pré de referência. Mas, as audições de rock, blues e música eletrônica já se tornaram mais agradáveis de se ouvir! Pequenos grupos instrumentais acústicos e vozes à capela já soaram agradabilíssimos desde os primeiros cinco dias, mas grandes orquestras e música com maior variação complexa, ainda se sentiam intimidadas com a falta de alargamento do palco e a ausência de respiro no extremo alto. Aí o buraco foi mais embaixo, e foi preciso 180 horas para os agudos surgirem como em um radiante nascer do sol em uma praia do nosso lindo Nordeste. Mas, quando surgiram, mostraram a razão deste pré de phono ter recebido tantos testes tão positivos.

Seu caráter sônico prima por ser bastante realista, não querendo mostrar mais do que a gravação captou. E ainda que não tenha uma sonoridade neutra, ele possui a virtude de sempre optar por uma assinatura muito musical.

Seu equilíbrio tonal é muito correto, com excelente apresentação de toda a região média de cima/embaixo, com excelente corpo. E os extremos, ainda que não tenham o mesmo grau de refinamento da região média, possuem decaimento suave e arejamento correto. Seu soundstage foi o último quesito a estabilizar em todo o período de queima, levando 200 horas para recuar e apresentar planos mais corretos e aprimorar o foco e recorte.

Como todo produto hi-end de bom nível, a escolha certa do setup de cápsula/braço e cabos fará toda a diferença no grau de refinamento do PH-10, sendo bastante crítico tanto na escolha do cabo de força como de interconexão. Com o ganho em 6 dB, e o cabo RCA entre ele e o pré de linha, obtivemos excelente silêncio de fundo em prensagens e discos mais bem conservados. E com os cabos XLR tivemos que diminuir o ganho em 3 dB para extrair este mesmo silêncio de fundo.

Suas texturas, pelas suas características sônicas, se ajustam à assinatura do cabo de interconexão. Os melhores resultados para este quesito conseguimos com os cabos RCA da Timeless e da Ortofon. Para gravações acústicas esses dois cabos se mostraram matadores, com uma naturalidade e intencionalidade espantosas!

Ouvi todas as minhas gravações da Decca (todos os discos da Ella Fitzgerald) com a curva DECCA e esses dois cabos. O som, além de orgânico, tinha um invólucro harmônico tão rico e tão bem resolvido que só com os discos da Decca fiquei praticamente uma semana repassando um por um.

O mesmo se passou com as gravações da Columbia (desde Duke Ellington a diversas obras clássicas). Interessante que aqui o cabo Ortofon Black casou melhor que o Timeless, principalmente na apresentação dos transientes e corpo harmônico. É maravilhoso quando temos a disposição um arsenal de equipamentos a mão, cabos e um produto versátil que nos possibilita um ajuste tão preciso.

Este é o maior diferencial do Gold Note, pois em sua faixa de preço tamanha versatilidade não existe. Ele foi pensado para atender tanto o audiófilo quanto o melômano que possui uma eclética discoteca e sonha em possuir um pré que extraia dessas gravações até o âmago – e não custe um caminhão de doletas!

Visitando um fórum internacional só de produtos analógicos, alguns usuários do PH-10 já fizeram o upgrade de colocar a fonte externa, afirmando que o produto salta de performance. Eles citam justamente melhoras nos extremos, silêncio de fundo, maior recuo do palco e, consequentemente, uma apresentação de micro-dinâmica irrepreensível!

Gostaria muito de ter tido a oportunidade de ter escutado o PH-10 com sua fonte externa, pois o produto parece mesmo estar totalmente apto a render ainda mais.

CONCLUSÃO

De todos os prés de phono que ouvimos e testamos nos últimos seis anos, abaixo de 10 mil reais, o PH-10 é o que mais nos encantou, pois ele possui uma quantidade de recursos, versatilidade e facilidade de uso, que são inconcebíveis para esta faixa de preço. Tantos recursos assim estamos acostumados a ver em produtos custando o dobro do PH-10.

Junte-se a isso a possibilidade de aprimorar ainda mais sua performance e teremos um produto que atende a um enorme leque de usuários que clamam por um pré de phono completo e que seja um upgrade definitivo em seus sistemas analógicos.

Se você se encontra naquela situação que investiu todos os seus recursos no conjunto braço/cápsula e toca-discos, e não consegue uma solução financeiramente viável para o pré de phono, meu amigo ouça este Gold Note. Ele possui um coração de leão em um corpinho de filhote de gato.

Altamente recomendado e provavelmente Produto do Ano, digno de Selo do Editor!

Nota: 93,0
AVMAG #249
Living Stereo
(11) 2592.0036 / (11) 99982.8456
lima.geremias@uol.com.br
R$ 9.000




PRÉ DE PHONO BOULDER 508
Fernando Andrette

Assim como meus prés de linha, dá para contar nos dedos das mãos os meus prés de phono também, nesses últimos 25 anos! Prefiro comprar o melhor pré de phono dentro do meu orçamento, que atenda as minhas necessidades para testes, e investir em cápsulas, toca-discos e braços. Meus últimos cinco prés de phono me serviram por longos períodos – foram eles: da Jeff Rowland, da ASR, os prés internos dos prés de linha da Accuphase e da dartZeel, e o Tom Evans, com o qual fiquei por quase sete anos! Como ele atendia praticamente a todas as minhas necessidades como articulista, e gostava imensamente de sua sonoridade e compatibilidade com tantas cápsulas distintas, foi ficando, ficando, até que, com a minha última decisão de realizar um upgrade consistente no sistema analógico, vendi meu toca-disco Air Tight, o pré Tom Evans e, provavelmente, também realize um upgrade em minha cápsula PC-1 Supreme, que está no estaleiro e só volta no final do próximo mês. O sistema analógico é de suma importância, tanto para o meu trabalho de articulista como para minhas audições pessoais, já que 70% dos meus LPs não tenho versão em CD, e me são muito ‘caros’ emocionalmente, pois muitos estão na família desde os anos 60!

Um upgrade seguro em meu sistema analógico consiste em buscar soluções em diversas frentes. São elas: compatibilidade total com as diferentes prensagens, de 90, 100 e 180 gramas! Discos em condições de uso por décadas e alguns no limite! Diversos gêneros musicais e gravações tecnicamente do ‘sofrível’ ao ‘impecável’, em 33RPM e 45RPM! Então o sistema não pode ser analítico ao extremo, mas também não pode ser meloso, pois é antes de tudo uma ferramenta de trabalho. Então as pesquisas levam meses (às vezes até mais de um ano), aí começo a montar o quebra cabeça em minha mente, volto a ler os testes dos produtos que estão em meu radar mental e, se conheço alguém que tem o produto, e confio em seu ouvido, peço informações e, se possível me desloco para ouvir o produto.

Quando falo: “ouvido em que confio”, estou falando de gosto semelhante ao meu e não que seja um par de orelhas pior que o meu, que fique bem claro! Gosto deste trabalho de garimpo, e o faço com prazer nas horas vagas e sem pressa nenhuma. E no momento que bato o martelo, começo a anunciar os meus produtos, para poder realizar o upgrade, pois sem vender, não tenho como realizar o salto. Para continuar os testes, sempre recorro a um amigo, que possa emprestar o produto de que me desfiz até que o definitivo chegue. Pois se não tiver esta ‘solidariedade’ não consigo fazer o upgrade.

Para este teste, contei com a ajuda do Martin Ferrari, que disponibilizou o Basis Debut 4 e, para a instalação no meu braço SME Series V (este não venderei), das cápsulas: Grado Statement Master 2, Clearaudio Stradivarius Mk2 (emprestada gentilmente pelo André Maltese) e a Transfiguration Protheus. Antes que me perguntem qual será meu novo toca-discos, peço que aguardem até agosto/setembro que aí eu conto!

Agora, voltemos ao pré de phono. Escutei uma única vez o pré de phono da Boulder, o 1008, e lembro que a impressão foi a melhor possível. Pois senti que sua assinatura sônica ia na direção do que mais busco em termos de pré de phono: o equilíbrio entre transparência e musicalidade.

Ouvi quatro gravações com qualidades técnicas bem distintas, e o Boulder teve autoridade para conduzir as gravações com um grau de neutralidade (quando o sistema não impõe sua assinatura), mostrando todas as diferenças técnicas de cada disco, sem nos fazer perder o interesse na música. Muitos audiófilos e melômanos recorrem à topologia de tubo (válvula), para galgar esse compromisso de extrair musicalidade de gravações tecnicamente inferiores, com certo sucesso. Mas se você ganha por um lado, é muito fácil você perder de outro (quando as gravações já são tecnicamente boas e a sonoridade começa a ficar melosa acima do ponto). O que mais eu gostava no Tom Evans era sua capacidade de dar vida mesmo a gravações sem graça, como que jogando luz onde precisava. Com isso o ouvinte nunca perde o fio da meada, seja em passagens sutis, seja em complexas resoluções de macrodinâmica. Mas, com cápsulas também ‘acesas’, o casamento para acontecer tinha que passar pela escolha de cabos de puro cobre, menos acesos, etc! Como sempre falo, não existe o sistema ideal, 100%! Sempre haverá que se fazer concessões, independente do patamar em que o setup esteja.

E se não for a eletrônica, será a sala ou elétrica, os vizinhos, cachorro, etc! Ou seja, são desafios para toda uma existência. Então, ou você se mune de paciência oriental, ou irá perder o prazer neste hobby facilmente! No Boulder 1008 descobri uma característica que não havia percebido com tanta intensidade em nenhum outro pré de phono – um grau de neutralidade capaz de dar ao ouvinte exatamente o que foi captado, masterizado, mixado e prensado no LP. Mas sem ser analítico ao ponto de você jogar fora os discos tecnicamente sofríveis, pois a música era ainda assim interessante.

Fiquei com essa sensação por anos e, como o produto estava totalmente fora do meu alcance financeiramente, tirei do meu radar mental. Ouvir então o 2008, nem pensar, ainda que muitos articulistas com ‘bala na agulha’ o tenham como referência em seus sistemas e o coloquem como o melhor pré de phono existente na atualidade. Claro que sempre haverá controvérsias, pois os que possuem o Audio Research dirão que o trono é dele, os que escolheram o CH Precision reivindicarão este direito, transformando rapidamente esta questão na ‘Guerra dos Tronos’ de prés de phono top de linha, sem fim, rs. Então refaço minha frase, colocando o 2008 no top five dos prés de phonos de referência, e não desagrado a nenhum dos felizardos que adquiriram qualquer um desses prés de phono. O 1008 já foi recentemente substituído pelo 1108, e deve vir na sequência um upgrade também no 2008 (creio eu). Mas, quando toda a ‘filosofia’ Boulder parecia apenas favorecer os audiófilos mais abastados, eis que a empresa dá uma guinada e lança um pré de phono batizado de 508, para mais mortais! Quando soube da novidade, há alguns anos, novamente meu radar ligou e comecei a colecionar todo tipo de informação e testes que apareceram internacionalmente.

Segundo o fabricante, ao escrever o primeiro teaser a respeito do 508, o apresentou da seguinte maneira: “Onde o 2008 foi puro excesso, o 508 é pura eficiência. Como o menor Boulder em mais de duas décadas, o 508 possui uma enorme quantidade de desempenho em um único chassi, que pesa apenas 5 kg! Esculpido em um bloco de metal na mesma máquina CNC em que são feitos todos os outros produtos da Boulder.”

Seu design minimalista e seu acabamento é de encher os olhos! Todas as entradas e saídas são XLR (vem com um adaptador, caso na saída para o pré de linha seja necessário a conversão para RCA). No lado direito do painel frontal você tem a chave de liga/desliga e uma chave de acionar o Mute. No painel traseiro, uma pequena chave para a escolha de MM e MC e a entrada e saída XLR, e o terra, e do lado esquerdo entrada IEC e o porta fusível. Internamente o 508 é dotado de um filtro low-cut que remove informações de baixa frequência excessiva de registros distorcidos ou danificados (que possam danificar o woofer das caixas). E vem ajustado de fábrica para MM em 47 kOhms e 44 dB de ganho, e MC com impedância de 1000 Ohms e 70 dB de ganho.

Caso o usuário necessite de uma outra impedância para melhor casamento com sua cápsula, o importador pode fazer o ajuste. No meu caso não será preciso pois todas as cápsulas MC que tenho como referência casam perfeitamente bem com a impedância ajustada de fábrica. Nos meus sete anos de convivência com o Tom Evans, uma única cápsula MC em teste precisei refazer o ajuste de impedância (MySonic Lab), as outras sempre trabalharam perfeitamente com 1000 Ohms. Olhando o coração do aparelho, mesmo a um leigo é possível notar o esmero e o esforço na construção da placa em um gabinete tão reduzido e, ainda que a placa de circuito ocupe mais de 2/3 da área útil, os engenheiros conseguiram um espaço para a fonte de alimentação auto regulável separada do circuito para minimizar qualquer tipo de ruído e interferência na seção analógica. O fabricante sinaliza 100 horas de amaciamento, o que convenhamos é bem pouco para um pré de phono (o ASR pedia quase 500 horas!).

O Boulder – além das cápsulas já citadas, o toca-disco e o braço SME V – teve como companhia os powers Hegel H30, Cambridge Edge e Air Tight 300B. Caixas: DeVore O/96, Dynaudio Evoke 50 e Kharma Exquisite Midi. Prés de linha: Cambridge Edge e Dan D’Agostino. Cabos de interconexão: Sunrise Lab Quintessence e Sax Soul Ágata 2 (XLR). Cabos de força: Reference SE e Transparent PowerLink MM2.

Ainda que o fabricante solicite 100 horas de amaciamento, o 508 já sai tocando divinamente bem! Quando pegamos produtos com essa capacidade de já sair de um patamar elevado, o prazer das primeiras horas é muito especial. Ainda assim, como estávamos em fechamento de dois testes, fiz uma audição de 4 horas, preenchi duas folhas de observações e decidi que a queima do Boulder seria feita nas últimas duas horas de minha jornada diária de quase 10 horas! O que mais tinha curiosidade em saber, era se aquela característica tão evidente no 1008 de neutralidade seu irmão mais novo também herdara! Pois se tivesse, ainda que em menor grau, já seria um consistente candidato a substituir meu Tom Evans! E essa característica ficou evidente no primeiro LP escolhido para as primeiras impressões: The Police, Ghost in the Machine, que tenho em uma prensagem americana e uma nacional. E de tão ruim a nacional, quando a mostro aos amigos, brinco que a nacional é um cover da banda e não o original. E o Boulder mostrou com precisão milimétrica todos os problemas de prensagem, extensão, equalização, etc. Com um detalhe que meu Tom Evans nunca concedeu: de conseguir perceber que a música estava ali, apesar de todos os crimes sonoros feitos na prensagem nacional!

Seria redundante descrever como tocou a prensagem importada, mas resumirei em um único adjetivo: sublime! Animado, busquei versões do mesmo trabalho, do Tutu do Miles Davis (nacional e importado), do piano de Bill Evans, de Dexter Gordon, Duke Ellington, e até da Ella e Frank Sinatra.

O Boulder 508 lhe dá uma ‘radiografia’ exata de todos os danos e diferenças de cada disco, mas consegue manter sua atenção na música, não fazendo o ouvinte descartar o disco, ainda que as imprecisões sejam criminosas, rs. A música se sobrepõe às deficiências técnicas. Falando com um amigo dessa característica, ele me questionou qual era o milagre? Expliquei a ele que o milagre se encontra na folga que este pré tem, no seu silêncio de fundo e principalmente na sua neutralidade.

Muitos audiófilos em sua peregrinação por upgrades, costumam ir descartando aquelas gravações que tanto gostam musicalmente, mas que tecnicamente soam sofríveis. Por muitos anos, vendedores de hi-end, afirmavam que à medida que você ia evoluindo nos sistemas, fatalmente você teria que abrir mão de muitos dos seus discos, pois o sistema mostraria todos os erros e imprecisões. Felizmente, este tempo de ‘inquisição sonora’ terminou. Em sistemas corretos tonalmente e com folga, você pode (desde que nos volumes corretos da gravação) ouvir todos os discos expurgados pela ‘audiofilia ortodoxa’, rs. Ainda que alguns ‘formadores de opinião’ em seus sites proclamem que em seus sistemas atuais só conseguem escutar SACD! Isso é uma balela, e de uma estupidez sem fim.

Você quer saber, amigo leitor, se o seu upgrade foi consistente, ouça as gravações expurgadas e jogadas ao pó nas prateleiras. Se o prazer em escutar voltou, e as deficiências, antes tão audíveis, diminuíram, você realmente está na direção certa. Do contrário, você acabará como centenas de audiófilos, que reduziram sua discoteca à uma dúzia de discos, ou pior: a simples trechos ou faixas! Isso é insano, pois o sistema não pode estar acima do prazer em escutar seus discos, ele não pode definir o que você deve ou não escutar! O 508 é desta nova geração de equipamentos que devolvem a você o prazer de ouvir todos os seus LPs (até os de ‘Best-Of, tão caça-níqueis).

Com 50 horas, os extremos ganharam corpo e maior extensão, o que permitiu começar a ouvir gravações nacionais de música clássica. Foi um deleite colocar a versão do Adágio de Albinoni do maestro Karajan, com a orquestra de cordas ampliada, para fazer frente ao órgão de tubo. Ainda que Karajan não seja o meu preferido para música barroca, esta gravação é primorosa, mesmo a prensagem nacional. O corpo do naipe de cordas e a sustentação das notas graves do órgão de tubo, sobem pelas pernas. Tenho essa versão também em CD, e a diferença é gritante em termos de corpo harmônico. No CD parece um quarteto de cordas e não um naipe completo de cordas. Enfim, essa discussão das diferenças de tamanho dos instrumentos entre LP e CD já foi longe demais – e para quem nunca comparou, deixo minha dica que o faça, e irá entender a razão de tantos melômanos e audiófilos não abrirem mão do analógico. O que mais encanta no 508 é como ele distribui a energia ainda que cada instrumento esteja a tocar em uma dinâmica distinta. Você não perde nenhum detalhe, e o foco no todo permanece sempre no primeiro plano. Mas a maior e mais deslumbrante surpresa veio com a 100 horas pedidas pelo fabricante de queima: a fidelidade na apresentação das texturas!

Tenho duas versões em LP do Tutu, do Miles Davis. A nacional tem um agudo tão brilhante nas passagens do trumpete do Miles com surdina que chega no limite do incômodo. A prensagem importada, também tem um brilho irreal nos agudos com surdina, mas não incomoda. Mas em nenhum tempo, com nenhum setup, havia percebido com tanta naturalidade e precisão detalhes da embocadura ou do ar injetado em cada nota. Achei que essa captação só estava presente na versão importada, e lá estava também no nacional.

A técnica de sustentação das notas do Miles era exuberante (mesmo já nessa fase final de sua carreira), pois ele dava o ataque da nota e a sustentação e o decaimento eram mantidos graças ao ataque inicial – o 508 nos mostra a intencionalidade e o efeito que o Miles utilizava para manter a nota limpa, mesmo no final do decaimento. Técnica ainda mais aprimorada pelo Wynton Marsalis, que leva a perfeição à limpeza e a afinação de cada nota.

O nosso colaborador Juan só veio a ouvir o Boulder 508 em nossa sala, no final do teste, com ele já amaciado (quase 200 horas). E coloquei para ele escutar o LP do Paco de Lucia, John McLaughlin e o Al Di Meola, Friday Night In San Francisco. Ele ouviu e no final, pensativo, descreveu a sensação que ele teve pela primeira vez de ouvir e compreender o grau de entrega que cada um se doou ao solo do outro, este grau de intencionalidade jamais havia notado em nenhum outro setup de nossa Sala de Referência tocando esta faixa.

Conto esse detalhe de bastidor para que o amigo tenha uma descrição do 508 por uma outra pessoa, e não apenas pelas minhas observações.

Sempre exploro que as texturas vão muito além de apresentar características de um instrumento (se ele é áspero, ardido, suave, etc), as texturas em um sistema Estado da Arte nos permite entender como cúmplices uma série de outras observações como: intencionalidade do músico, qualidade do instrumento, grau de virtuosidade e complexidade de execução! Foi-se o tempo em que descrever texturas em equipamentos de áudio se limitava a ser quente ou frio.

E o Boulder 508 consegue, ainda que tenhamos uma prensagem limitada, extrair música daquele sulco. Se isso não é mágica, eu realmente não sei o que é. Se tinha uma qualidade que admirava muito no Tom Evans era a sua resposta de transientes. Seu timing, precisão e ritmo eram simplesmente matadores.

Na mesma faixa do Al Di Meola e Paco de Lucia, cansei de apresentar em nossos cursos como era fácil acompanhar cada nota dos solos alucinantes destes dois virtuoses. Sem esforço, sem atropelos – este muito comuns em cápsulas e prés de phonos que não sejam perfeitos em resposta de transientes. O Boulder não acrescenta nada em relação ao Tom Evans neste quesito, não em termos de velocidade, ou inteligibilidade dos solos, porém vai adiante ao nos mostrar a técnica de digitação de cada um dos dois que é bem distinta, já que ambos são de escolas muito diferentes – Paco de Lucia toca com os dedos, e o Al Di Meola toca com palheta.

Essa apresentação torna a inteligibilidade maior e nos permite ver o que estamos ouvindo, o que nosso cérebro simplesmente agradece. Parece que estamos falando de sutilezas quando vistas de forma pontual, mas junte cada plus em cada um dos quesitos da metodologia, e o resultado final em termos de prazer auditivo cresce, nos levando a um novo patamar de referência (lembre-se que, após subir de patamar, quando ouvir aquela gravação que você tanto aprecia, ao voltar atrás seu cérebro imediatamente irá te cobrar). O mesmo ocorre ao compararmos a macrodinâmica no Tom Evans com o 508 – é um dos quesitos em que são muito semelhantes. É admirável a capacidade do Tom Evans em responder do piano ao fortíssimo sem nunca dobrar as pernas e nem dar saltos inexistentes.

A distribuição de energia entre as caixas também é muito semelhante. O que o 508 tem de diferente é que sua folga permite que o grau de inteligibilidade seja muito mais confortável aos ouvidos. Fazendo com que você não tenha que correr o dedo ao controle remoto para diminuir o volume (desde que haja o respeito à o volume da gravação). Exemplo? Bolero de Ravel. Como é uma obra que começa em pianíssimo, o sujeito para escutar os primeiros compassos senta o volume lá no ‘meio-dia’! Depois, com o crescendo, mas ainda apenas no forte, julga que no fortíssimo o sistema irá suportar e aí tem que correr para baixar o volume na parte final da obra. Em uma boa gravação desta obra, o Boulder até irá suportar (graças à sua folga) se o volume não estiver a exceder 10% do correto, mas milagre mesmo ninguém faz. Mas em gravações em que o volume está correto, esta folga adicional do Boulder permite esses pequenos arroubos sem endurecimento.

CONCLUSÃO

Sinceramente, não tenho a menor ideia de quantos de vocês leitores desejam ter um pré de phono neutro em seus sistemas. Pois o que mais escuto de quem defende sua escolha por manter o analógico é que o faz por ser um som mais quente, musical, etc.

E me parece que o índice de audiófilos que têm ou desejam ter um pré de phono valvulado é enorme. Então a todos esses com este perfil, o 508 ou qualquer outro modelo da Boulder talvez não seja a melhor escolha. Já a todos os que sempre desejaram um pré com todas essas características aqui citadas, acredito que ouvir este 508 será como descobrir um bilhete premiado da loteria. Pois sua performance permite resgatar toda a sua discoteca e ainda lhe dá a possibilidade de esquecer os erros e se concentrar apenas na obra musical. Se o seu desejo há muito tempo é este, sua busca acabou!

Para um sujeito como eu, que necessita de um pré de phono que atenda as minhas necessidades como articulista e atenda aos meus gostos de melômano, estou no paraíso.

E mesmo aqueles que gostam de um som mais quente e eufônico, não descarte o 508, pois com a cápsula certa e sua neutralidade pode surpreender!

Meu primeiro upgrade de 2019 está realizado!

Nota: 102,0
AVMAG #253
Ferrari Technologies
(11) 5102.2902
US$ 10.500

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