Opinião: POR QUE O SETUP CORRETO PARECE SER TÃO RARO DE SE ENCONTRAR?

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Caixas totalmente grudadas na parede comprometem o Equilíbrio Tonal, a qualidade dos graves e a formação da ilusão de palco sonoro.

Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Estou sempre tentando fazer analogias de problemas e percepções sobre áudio, com outras coisas, áreas e disciplinas – como comida, por exemplo – para que as pessoas compreendam algo que não estão conseguindo visualizar (e muitas vezes nem querem).

Um exemplo clássico é quando falo de comida para ilustrar a estultice, o absurdo e o cúmulo da negação que é achar que música acústica ao vivo não é referência para se analisar e perceber a música que saí de sistemas de áudio – seja do fone de ouvido barato que plugamos em um smartphone, seja de uma soundbar, um microsystem ou um sistema hi-end complexo e caríssimo. As regras são as mesmas para todos! A analogia que costumo fazer, neste caso, é do morango: para se saber o quão próximo do morango de verdade (aquele que nasce em uma planta) é o gosto de um biscoito sabor artificial morango, ou uma bala de morango, ou uma geléia que se diz feita com morangos, a única coisa possível e imaginável de ser feita é: coma morangos, conheça os morangos, e analise a questão, compare, tenha espírito crítico, eduque seu paladar.

Existem, no caso dos sistemas de áudio, aqueles que acham que podem ‘pular uma etapa’, que é mais fácil aceitar algum modelo de amplificador, por exemplo, como referência de amplificadores. Mas quem disse que o mesmo foi ouvido em um sistema ajustado, ou seja, com o setup bem feito? Ou que as pessoas tenham tal amplificador disponível para comparações? Ou que, se tiverem, essas comparações estarão sendo corretamente feitas e compreendidas? Não vou nem entrar no mérito da questão do “cada um ouve de um jeito”, porque a palavra Referência obviamente anula a aplicação de tal conceito. Ou seja, na analogia usada mais acima: é a percepção da ‘cada um’ sobre o ‘morango-referência’ que irá permitir ‘cada um’ analisar algo supostamente ‘sabor morango’ frente à tal referência. A percepção é feita por cada pessoa! Não importa se cada pessoa perceba o sabor do morango de uma maneira diferente, porque ‘cada um sente sabor de maneira diferente’! É para isso que existe referência, o conceito de referência!

Mas, até agora, não consegui achar uma analogia efetiva para passar a ideia, para se fazer entender o conceito de setup correto, por exemplo, de um sistema de som.

Trocando em miúdos: o ‘setup’ é o ajuste do seu sistema dentro de uma sala, que é composto, muito basicamente, de casamento entre os componentes e de posicionamento das caixas acústicas. Isso, volto a dizer: “basicamente”, porque inclui também fatores de mais alto nível, como instalação elétrica dedicada e uma acústica minimamente tratada – mas aí estamos falando de salas dedicadas e de sistemas de alto nível, que são duas coisas que a maioria dos audiófilos não tem. Eu mesmo não tenho.

O casamento de componentes é algo como: compre um fone de ouvido mais equilibrado para seu smartphone. Ou mesmo: não compre uma fonte digital de sonoridade fria e hiper-detalhista junto com um amplificador com as mesmas características, pois aí terá problemas de fadiga, falta de musicalidade, falta de naturalidade sonora. E por aí vai… Não ponha uma caixa de som quente e pouco detalhada com um amplificador valvulado e mais um toca-discos de som quente, porque você terá um resultado onde faltará detalhamento e definição, principalmente nos extremos.

Mas o que causa a indignação que me levou a escrever esse artigo, é mesmo o posicionamento de caixas. Um posicionamento incorreto, desleixado, desregrado, ou mesmo nenhum posicionamento, estraga o som de qualquer sistema, seja de qual nível de preço for. E isso se aplica também a sistemas vintage.

O fã de vintage – seja o mesmo composto de equipamentos nacionais ou importados – é um dos que despreza totalmente o posicionamento de caixas, o que é uma tolice sem tamanho. Um deles uma vez ficou fulo da vida comigo porque eu sugeri que se ele aplicasse alguns princípios da audiofilia em seu sistema de som, aproveitaria ele de maneira muito melhor, extrairia muito mais qualidade sonora do mesmo. Nem tentar entender, muito menos tentar fazer uma coisa, chama-se ‘bancar o tolo’.

Mas outro dia o que me deixou bestificado, vendo assuntos de áudio Internet afora, foi com dois sistemas cujas fotos ilustram aqui a matéria (com duas devidas explicações). Nada de novo, mas ambas estavam associadas a audiófilos com alguma estrada ou mesmo auto-proclamados ‘profissionais da área’. Uma das fotos dava conta da mudança da sala para um porão dedicado que, apesar de estar ainda em seu absoluto começo, já incorre em duas coisas inacreditáveis de puro amadorismo: por o sistema e as caixas no lado do porão onde tem cantos próximos e colunas de sustentação, e o sofá do outro lado, em vez de fazer invertido – ou seja, o pior possível com o ambiente que se tem à mão! Caixas não tocam bem em cantos, e colunas da sala não ajudam a dispersão correta e limpa das reflexões. Além disso, quem tem dinheiro para um sistema desse – como na foto – ou tem um tapete sobrando em casa, ou em menos de uma hora pode achar uma loja e comprar um, porque uma sala com paredes todas vivas, com um teto que não parece ser dos mais altos, e ainda com chão de piso frio, sem um tapete no chão não dá nem para pensar em ligar o sistema!

A segunda foto mostra um sistema, do qual seu dono parece se orgulhar bastante, que encosta as caixas na parede. Bom, caixa nenhuma dá um palco com camadas e profundidade, e um palco descongestionado com separação entre os instrumentos, quando grudada à parede ao fundo. Fora que o monte de equipamentos entre as caixas só congestiona e suja o palco. E tudo isso compromete a inteligibilidade das frequências médias e agudas. Além de tudo isso, as caixas grudadas na parede sempre resultam em excesso de graves – comprometendo o Equilíbrio Tonal – e trazem um grave embolado, congestionado e sujo, onde todos os instrumentos dessas frequências baixas soam iguais e ininteligíveis! E nem vou entrar no mérito da área de Home-Theater, de querer saber o que um canal central está fazendo totalmente deslocado à esquerda, e o que uma soundbar está fazendo em um sistema que tem já tem HT…

Caixas totalmente grudadas na parede comprometem o Equilíbrio Tonal, a qualidade dos graves e a formação da ilusão de palco sonoro.

Não fazer essas besteiras, e estar pelo menos no caminho de ajustar seus sistemas, de fazer um setup bem feito, é algo que está ao alcance desde do proprietário de um microsystem até ao feliz audiófilo que montou seu – ainda que modesto – sistema dos sonhos. E o setup correto pouco custa, em seu significado mais básico. E a literatura sobre o tema abunda na Internet.

Com tudo isso, por que alguém quereria ouvir menos qualidade do que o seu sistema pode dar?

1 Comments

  1. Mariano Amorim disse:

    Parabéns pela análise. De fato, o “amontoado” de caixas implica perda de qualidade no áudio, notadamente nas hipóteses em que o espaço permite melhor acomodação.

    Ainda que com pouco recurso financeiro, certo é que a internet abriu as fronteiras antes conhecidas por poucos e permitiu acesso às boas explicações e exemplos de como ser criado um bom set de som.

    Obrigado pela excelente explicação.

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