Espaço Aberto: O TÍMPANO ‘TURBINADO’ DA TELARC

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Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

Desde o advento da Internet, no meio da década de 90, que o acesso à informações é muito maior e mais fácil – e ainda assim as pessoas vêem mais vídeos de gatos e cachorros (eu também!)… rs… O acesso às opiniões de todo mundo também foi se tornando óbvio, o que pode ser uma benção, e pode ser um desastre…

Uma das opiniões – no âmbito de música clássica e suas gravações – que já ouvi algumas vezes na vida, é que “os tímpanos das gravações do selo americano Telarc, são maiores do que deveriam, e muito fortes”. Acontece que a Telarc é uma das minhas gravadoras preferidas, com seu engenheiro de gravação Jack Renner, e uma das duas melhores que eu já ouvi para música clássica, junto com a Reference Recordings, igualmente americana, com seu genial engenheiro Prof. Keith O. Jonhson.

Ambas quebraram vários paradigmas, e ambas se dedicaram à extrema qualidade sonora e realismo na gravação de orquestras sinfônicas. Algumas de suas técnicas de gravação permanecem como sendo o padrão mais alto alcançado até agora, em qualquer gênero musical, amplamente utilizadas pelos melhores engenheiros de som da atualidade.

Acontece que, outro dia, ao ver um vídeo de um ‘especialista’ em música clássica, ouvi de novo a conversa mole de que o tímpano, e a percussão, de algumas gravações, soam irrealmente grandes e fortes (!). Só que, desta vez, quem foi ‘pichada’ não foi a Telarc, e sim a Reference Recordings.

Sabe aquelas bobagens que são ditas de vez em quando, e que batem na entrada do ouvido e causam estranheza? Foi uma dessas… E me deixou um bocado pensativo sobre o assunto – já que eu não me importo de repensar minhas opiniões sobre as coisas, se novos fatos forem apresentados.

Então lá fui eu ruminar sobre o assunto. De novo.

A resposta simples e direta é: Não, eles não são ‘turbinados’, eles são extremamente realistas. O que indica que quem está ouvindo, o está fazendo de maneira errada.

A resposta ‘complicada’, vem a seguir…

No final da década de 70 e começo de 80, eu ainda não era um frequentador ávido de concertos de música clássica, principalmente de orquestra – isso foi acontecer na década de 90. Mas eu já era neto e filho de audiófilo, assim como neto e filho de fãs incondicionais de música clássica. E assim eu fui criado, dentro desse ambiente.

Antes de eu passar a fazer parte plena do maravilhoso mundo da audiofilia moderna, já na década de 2000, eu nunca tinha ouvido um sistema que tocasse melhor música clássica que o do meu pai – orgulho de vida dele, e sua maior paixão. E, para falar a verdade, sistemas plenos para música clássica, na minha opinião, foram se consolidando mais para o fim da década de 2000 – apesar do áudio em geral já ter, 20 anos atrás, uma longa série de aspectos Qualitativos que em muito superavam o que havia de disponível entre a década de 70 e 80. Mas os ‘porquês’ disso deverão ser tema de outro artigo…

Eu fui um privilegiado, portanto, ouvindo música clássica em casa. E ouvindo uma grande quantidade de LPs da Telarc. Sempre achei eles proviam – junto com alguns outros poucos títulos selecionados de outras gravadoras – um som mais completo, mais instigante, que te transportava para dentro da orquestra. Mas eu não tinha como julgar se o tímpano estava ‘maior’ e mais ‘forte’ do que ele realmente é. Esse julgamento veio bem mais de 10 anos depois.

Minha reflexão precisou, então, ser mais profunda. E a resposta me levou a pensar no que é que aceitamos como o ‘normal’, a pensar como foram os equipamentos de áudio das décadas de 70 até agora, como são as gravações no geral, entre outras coisas. E como é realmente uma boa orquestra sinfônica ao vivo e à cores, in loco.

Primeiro é preciso pensar que gravações comerciais – ou seja, de grandes selos – não são feitas para audiófilos. Claro que, vira e mexe, cruzamos com algum engenheiro de gravação consciencioso, ou até genial. E todo mundo já deu uma ‘selecionada’ em suas discotecas de música clássica, separando o que é bem gravado daquilo que tem aspectos sofríveis na gravação – estas últimas costumam ser de grandes nomes artísticos e de grandes gravadoras. É comum muitos discos terem agudos rascantes e irritantes, e terem graves sofríveis que vão desde o embolado até o som magricela. Para não falar dos timbres dos instrumentos, ou mesmo da ilusão de palco…

Então, as gravações de grandes artistas de música clássica de selos internacionais, podem ser sofríveis! Prensagens ruins, então, podem até piorar o resultado. E todos os selos têm sua sonoridade bastante distinta, e suas grandes fases, e suas péssimas fases. Afinal, grava-se música clássica com alta-fidelidade estéreo desde o final da década de 50. Tenho grandes (e péssimas) gravações da Decca, EMI, Deutsche Grammophon, etc, de 1960 até 1990 – a era do vinil.

Sempre o meu lado otimista acha que os aficionados de música clássica e os críticos/colecionadores de discos são: audiófilos e/ou frequentadores de concertos. Muito poucos são audiófilos, e – para a minha tristeza – nem todos vão em concertos… E tem ainda aqueles que parecem não prestar atenção aos aspectos qualitativos do som que estão ouvindo (mesmo ao vivo), e apenas se focam na música. E tem os repetidores de informações e opiniões que estão perenemente ‘gravadas em pedra’, e que não podem ser contestadas. “Fulano compositor é um gênio” (e é um chato, na verdade). “Tal regente é um gênio” (e não faz nada fora do comum ou de especial). “Os tímpanos das gravações da Telarc e da Reference Recordings são ‘turbinados’”… Ou será que os tímpanos da maioria das gravações comerciais é que não soam pequenos e sem impacto?

Um amigo regente, depois dos concertos, sempre vinha me perguntar o que eu tinha achado da apresentação, da performance. Ele dizia que só eu falava a verdade para ele, porque eu tinha espírito crítico, e o pessoal que o cercava em seu trabalho, não tinha. Aí penso: será que as pessoas não têm, mesmo, espírito crítico?

Uma coisa, quando se vai ver uma orquestra ao vivo, é a mais chocante: o impacto pelo tamanho de tudo, pela dinâmica, pela energia! Quem compreende isso, sabe o que deve procurar em seus sistemas de áudio, por exemplo. Afinal, quanto mais próximo do sabor do morango fruta for sua bala artificial de morango, melhor ela será. Isso é óbvio e ululante!

Um dia eu fui prestar atenção nos tímpanos e percussões de verdade, de uma orquestra, ao vivo, em um bom auditório, sentado em uma posição ideal, e… Não, os tímpanos das gravações da Telarc e da Reference Recordings não são maiores, não são irreais. Aliás, são os mais realistas que eu já ouvi. Mas, para isso, é preciso um sistema decente e bem ajustado. E isso é menos difícil do que parece.

Mas, e tirando os que foram lá ver uma orquestra ao vivo, e não ‘ouviram’, e os que nunca foram, quais outros fatores podem explicar o desconhecimento e a opinião errônea?

Um grande fator é que a maneira como a maioria esmagadora das pessoas ouviu música nas décadas de 70, 80 e 90, é um desastre completo. Aparelhos de som ou eram portáteis e intensamente sofríveis, ou eram péssimos fones de ouvido, ou eram conjuntos de receiver, deck e toca-discos com as caixas encostadas de cada lado do rack. Uso intenso e ignorante de controles tonais e equalizadores. Era o diabo! Hehehe…

Aparelhos costumavam trazer graves exagerados, todos embolados e sem definição alguma, acompanhados de agudos brilhantes e irritantes – era a Era do Quantitativo. E quando se ouve discos de música clássica com pouco impacto nos tímpanos, tende-se a aumentar os graves. E aí ouve-se um que tem tímpanos realistas, e tudo fica grande demais, com impacto demais, forte demais, não?

A questão é que no purismo da Telarc e da Reference Recordings não havia espaço para servir ao mínimo denominador comum. Não são, até hoje, gravações para servir o fone Bluetooth intra-auricular que veio com o aparelho de celular, e nem ao sistema de som da maioria dos carros do mercado, nem às caixinhas do computador, ou aos falantes das TVs.

Hoje, vários equipamentos tocam muito bem – como algumas Soundbars bem reguladas. Mas ainda há um abismo entre a maioria do que é ‘consumer’ e do que é ‘audiófilo’.

Mais um tempo se passará, e logo ouvirei de novo alguém que acha que tem embasamento, dizer que essas gravações extraordinárias têm exageros.

Boa Primavera a todos! E que ventos mais fresquinhos tragam melhores experiências musicais a todos!

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