Opinião: O SOM DE PA ESTÁ INVADINDO A AUDIOFILIA

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Christian Pruks
christian@clubedoaudio.com.br

O PA traz péssima qualidade sonora, em volumes muito altos. Combinação péssima. É a antítese do que a audiofilia prega, o oposto de Qualidade Sonora – e isso é indiscutível, infelizmente, principalmente como conceito. E agora parece que os fãs de gêneros musicais que usam esse tipo de volume e ‘baixa qualidade’ frequente, estão começando a achar interessante a Audiofilia – como se pode notar em showrooms e feiras, assim como já é notório em sistemas de som do mercado ‘consumer’ e no mercado de fones de ouvido, há anos, com seus volumes estupidamente altos e suas e luzinhas piscando (a ideia de ‘caixas para festa’). Mobilidade, potência, baixa qualidade, mau gosto, distorção, saturação e surdez… Otimista, né?

Uma analogia: é como matar seu paladar enchendo uma comida de pimenta o tempo todo. Gordura em excesso, 128 temperos em excesso, defumação, pimentas, porções gigantescas etc. E daí, adquire-se um padrão de vida melhor e quer-se que esse cenário de assassinato gastronômico passe a ser válido pelas mãos do que é tradicionalmente gourmet – do que é e sempre foi baseado em qualidade como conceito.

É a Quantidade invadindo o âmbito da Qualidade. É destrutivo. Percebem?

O que é “PA”? Também conhecido como Public Address, é simplesmente o pacote completo de microfonação, amplificação e subsequente tentativa de ‘demolir o bairro’ com uma barragem de caixas de som, pacote usado em shows que necessitem dessa amplificação. Acontece que, claro, uma apresentação da maioria dos gêneros musicais na maioria dos locais grandes necessita de um PA, para que esses músicos possam ser ouvidos por todos os milhares de presentes.

Onde está o erro, então?

Ah, tem tantos, que mal dá para começar. A maioria esmagadora dos PAs têm baixa qualidade sonora, infelizmente. Um exemplo tradicional é o do rock: a maioria dos fãs não consegue apreciar rock sem ser em volumes de som que ameaçam soltar o reboco das paredes. E aí reside uma variedade de problemas. O primeiro, é claro, tem a ver com saturação da audição (e dano do aparelho auditivo), e é uma junção de vários erros, como o uso de excesso de compressão nas gravações para ‘soar mais alto’ em aparelhos de som de menor qualidade (que é a maioria esmagadora dos usados por seres humanos).

Ah, então o leitor aqui se pergunta se eu, o escritor destas mal traçadas linhas, não sou um velho chato que “não entende os jovens e a energia do rock”. Então, para alívio desses leitores, que podem continuar lendo sem se sentirem traindo seus co-roqueiros, eu tenho como um dos meus gêneros preferidos o rock, já curti muito rock pesado inclusive, e já fui em numerosos shows, em locais de vários tamanhos. E a maioria esmagadora dos PAs de shows é, sim, de um volume descomunalmente alto – como se fosse ‘vencer o mundo no grito’ – e com qualidade sonora abaixo da crítica, em grande parte por causa do excessivo volume. Recomendo a todos, que frequentem apresentações de música ao vivo, que sejam amplificadas, que usem protetores auriculares e protejam seus ouvidos. Te garanto que a ‘energia’ do show será a mesma.

Tudo acima se aplica, também, ao pessoal aficionado de música eletrônica – que têm os mesmos vícios de audição.

Mas, vocês perguntam, em um bom sistema audiófilo a qualidade sonora não será melhor quando se ouvindo esses gêneros musicais em volumes de som altos? A resposta é um parcial sim. Haverá menor distorção e saturação, e embolamento. Porém os danos causados pelo excesso de volume continuarão incidindo bastante. E, alguma saturação acontece, também, no ambiente onde a música está sendo ouvida – na sala, quarto, etc. Passar a comer um balde de bacon com maionese onde o bacon é de defumação artesanal e a maionese é feita em casa, não tornam aquilo gourmet. É preciso aprender a ter parcimônia, aprender a se conter e apreciar o que se está ouvindo.

Audiófilos mais tradicionais estão fugindo de salas, em feiras de áudio mundo afora, onde os demonstradores estão querendo agradar um público mais novo, ou simplesmente acham que é válido demonstrarem seus gostos musicais próprios, tocando música em altíssimos volumes – emulando um PA dentro de uma sala – e tocando música que não agrada a todos os envolvidos (leiam o minha seção Espaço Aberto deste mês, no final da revista). Se eu estou passando na frente de uma sala, em um grande evento de áudio de alta qualidade, em qualquer lugar do mundo, e o volume de som está tentando descosturar as minhas calças, eu nem entro na sala – minha audição já foi maltratada o suficiente nesta vida. Agora, não vou desdenhar de um gênero musical, se ele não for dos meus preferidos, se ele for pelo menos capaz minimamente de me informar como aquele aparelho demonstrado está tocando. A maior parte das pessoas não faz o que muitos fazem, de desdenhar de um gênero musical porque ele “não se comunica” com a pessoa. Compreensão e entendimento podem vir com a idade.

Por que ouvir em volumes civilizados?

Sem querer dar a resposta do tipo “porque as outras pessoas agradecem”, vamos ver pelo lado da apreciação musical. E, claro, não se pode esquecer que seus ouvidos não foram feitos para serem abusados, e ninguém deveria querer ficar com a audição danificada ou, mesmo, ter surdez prematura, parcial ou não.

Quanto mais alto for o som, e mais ele saturar a acústica do local, ou saturar diretamente os seus ouvidos, menor será a inteligibilidade. Se você já faz isso com gravações onde há muita informação, e ainda são complementadas por uma compressão exagerada, a inteligibilidade é menor ainda. Claro que eu já ouvi de roqueiros que o que importa é a ‘energia’ que é passada. Certo… Esses querem mais qualidade naquilo que ouvem, ou acham que ter um sistema hi-end é uma questão de fetiche, ou será que só procuram validação em um mundo onde essa procura parece ser um passatempo tão válido que logo virará esporte?

É como aquela tia que cozinha mal te chamar para almoçar na casa dela, e fazer o seu prato preferido, e dizer “pus o peito de peru que você adora, meu querido!”. E você responder: “Mas, tia, eu não sinto o gosto dele – tem tanto cubinho de caldo de carne dentro que só sinto gosto disso!”… Acredite, de um roqueiro para outro: o dia que você descobrir que, como volumes mais baixos, e um bom aparelho, começa a perceber detalhes e nuances do seu baterista preferido, ou mesmo passa a ouvir com clareza o contrabaixo e suas texturas, sem ser saturado pela guitarra, você vai sentir muito mais a ‘energia’ que passa uma grande audição de um eterno rock de qualidade.

Não posso validar ninguém por seus hobbies – não cabe a mim, cabe à própria pessoa, ou não. Entretanto, defendo até o fim dos meus dias o direito de todos de comprarem o aparelho de som que quiserem, e de ouvirem a música que quiserem, mas também defendo o meu direito de questionar motivos e não achar que validações devam ser dadas, assim, sem mais nem menos. Como digo em meu Espaço Aberto deste mês, ambos lados precisam aprender a lidar com ambos lados – e não simplesmente abraçar um ponto de vista, um estilo de vida, que não combina com os motivos pelos quais a Audiofilia existe.

O som de “PA” vai ser aceito na Audiofilia? Sinto dizer: não.

O uso de música de má qualidade sonora (para não entrar na discussão de qualidade musical) adiciona e melhora o hobby? Mais uma vez: não. Não mesmo!

Agradar ‘gregos e troianos’ é possível? Sim, é – mas demanda que todos os envolvidos comecem a ‘entender’ melhor tudo. Desde demonstradores até vendedores, até fabricantes, até audiófilos tradicionais, até audiófilos jovens e novos no hobby. E fazerem isso sem arrogância, sem soberba, sem ego.

Bom julho, e boas audições – mas com qualidade, hein?

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